*áf FACULDADE DE MEDICINA DO RIO DE JANEIRO THESE DO $>x. Caxtttiào )tetto bateriam r XiIJB'K ■■'* Hr SURGEO!M,Ot:NEUL:SC;-.-!CL JUr;-81839 RIO DE JANEIRO Typ. MORAES —Rua de S. José n. 35 1897 FACULDADE DE HED1C1M DO RIO DE JANEIRO DISSERTAÇÃO > CADEIRA DE OBSTETRICA PKOPOSIOÕES TRtS SOBRE CADA UMA DAS CADEIRAS DA FACULDADE THESE APRESENTADA Á Faculdade de Medicina e de Pharmacia d© Ma dl IiMeo Em li de Outubro de 1896 E PERANTE ELLA. SUSTENTADA ME 13 DE JASSIrU DE 1897 Senão Approvada com disíincção POR lf CavUwào }íetto tOalleYxaxvy Doutor em sciencias medico-cirurgicas pela mesma faculdade. bacharel em sciencias e lettras pelo Ciymnasio Nacional, ex-interno de li classe do Hospital da Mise icordia (1892-1890) ex-presjdeute do Grêmio los Internos dos IlospiUes, Sócio honorariodo mesmo Grêmio Natural da Capital Federal Filho legitimo de Sócrates Valeriani e de D. Maria Netto Valeriani a í u tf-; .6. £'2 .Iv-í.l.í - V 3UR3EÜN0líCRÂlüC''F! RIO DE JANEIRJO jUf'í ~^ -^ Typ. Moraes—Rua de í: . José 35 Faculdade de Medicina e de Pharmacia do Rio de Janeiro DÍRECTOR—Dr. Albino Rodrigues de Alvarenga. VICE-DIRECTOR—Dr. Francisco de Castro. SECRETARIO—Dr. Antônio de Mello Muniz Maia. LENTES CATHEDRATICOS Drs. : João Martins Teixeira..................... Physica medica. Augusto Ferreira dos Santos............... Chimica inorgânica medica. João Joaquim Pizarro...................... Botânica e zoologia medica. Ernesto de Freitas Crissiuma................ Anatomia descriptiva. Eduardo Ghapot Prevost.................... Histologia theorica e pratica. Arthu r Fernandes Campos da Paz.......... Chimica orgânica e biológica. João Paulo de Carvalho.................... Physiologia theorica e experimental. Antônio Maria Teixeira.................... Matéria medica, Pharmacologia e arte formular. Pedro Severiano de Magalhães............. Pathologia cirúrgica. Henrique Ladislau de Sousa Lopes......... Chimica analytica e toxicologia. Augusto Brant Paes Leme................. Anatomia medico-cirurgica. Marcos Bezerra Cavalcanti................. Operações e appareihos. Antônio Augusto de Azevedo Sodré......... Pathologia medica. Cypriano de Souza Freitas................. Anatomia e physiologia pathologicas. Albino Rodrigues de Alvarenga........... Therapeutica. Luiz da Cunha Feijó Júnior ._.............. Obstetrícia. Agostinho José de Souza Lima.............. Medicina legal. Benjamin Antônio da Rocha Far.a......... Hygiene e mesologia. Antônio Rodrigues Lima................... Patholog^ genl e historia da meaiema. João da Costa Lima e Castro............... CLnica cirúrgica—2a cadeira. João Pizarro Gabizo........................ Cl.nica dermatológica e syphiligraphica. i' ranc.sco de Castro....................... Ciin.ca propedêutica. Oscar Adolpho de Bulhões R.beiro.......... Clinica cirurg ca—Ia cadeira. Erico Marinho da Gama Coelho---........ Clinica obstetrica e gynecologica. Hilário Soares de Gouvea.................. Clinica ophthalmolog.ca. Jo:é Benicio de Arireu..................... Clinica medica—2a cadeira. João Carlos Teixe;ra Brandão.............. Cl.nica psychiatrica e de moléstias ner- ., vosas. Uandido Barata Ribeiro.................... Clinica pediatrica. uno de Andrade........................ Clinica medica—1 cadeira. LENTES SUBSTITUTOS Drs.: 1* secçâo.................................. Tiburcio Valeriano Pecegueiro do Amaral ** " ................................ Oscar Frederico de Souza. 8 " ................................. Genuíno Marques Mancebo e Luiz An- tônio da Silva Santos. * ................................. Philogonio Lopes Utinguassú e Luiz Ri- beiro de Souza Pontes. B * ................................. Ernesto do Nascimento Silva. .................................. Domingos de Góes e Vasconcellos Francisco de Paula Valladares. ' * ................................. Bernardo Alves Pereira. " ................................. Augusto de Souza Brandão. * .......... ' ................... Francisco SimOes Corrêa. 10* " ............................. Joaquim Xavier Pereira da Cunha. lla * ................................. Luiz da Costa Chaves Faria. l"2" " ................................. Mareio Filaphiano Nery. N. B.-A FacuUade n*o approva nem r.-prova .s op niOes emittidas nas ihese* n„. lhe sí<> appresentades. '««es que Quem quer que tomasse entre mãos discutir a matéria que é objecto de nosso estudo—funcções e principaes modificações do forceps—deveria cercar-se das sólidas garantias de successo conferidas pela muita pratica e por aprofundados conhecimentos de obste- trícia. Apezar de nos falharem por completo essas duas condições, não hesitamos, todavia, em escolher o re- ferido assumpto para a nossa dissertação, tendo em vista, não somente satisfazer á exigência regulamentar da Faculdade, mas também adquirir conhecimentos que prestarão valioso auxilio á aprendizagem da especia- lidade que pretendemos abraçar. Não vá, portanto, a critica, esquecida das con- dições que rodeiam os trabalhos desta natureza, exigir que seja entregue sem notas de culpa a These inau- gural que submettemos á sua apreciação. Outubro de 1896. DISSERTAÇÃO u INTRODUCÇAO Peu d' instruments de chirurgie sont d'unemploi plus fréquent que le forceps peu sont moins connus dans leur mode d'action. (c. HUBERT.) As definições do forceps apresentadas pelos auto- res, se deíferem na forma, são idênticas quanto á signifi- cação ; todos os partciros concordam em consideral-o como uma espécie de pinça destinada especialmente a applicar-se sobre a cabeça do feto, afim de retiral-o dos órgãos maternos. Chassagny, porém, afasta-se desse numero e discorda da difinição dos clássicos por estabelecer im- plicitamente que a fôrma da pinça é inteiramente insi- gnificante ; facto este que, na opinião do illustre par- teiro deu nascimento ao monstruoso paradoxo que tem passado como axioma e é repetido pelos mestres mais autorisados « que todos os forceps são bons, que só ha máos para aquelles que não sabem servir-se delles, e somente os desageitados podem pensar em crear novos». Assim a definição clássica, na opinião deste autor, só poderá ser conservada addicionando-se o seguinte complemento— com a condição de que esta pinça seja construida segundo os dados mathematicos mais pro* 6 prios á attenuar os perigos que podem correr a gestante e o feto. O professor Poullet não admitte também a defi- nição geralmeme acceita e propõe estender a accepção da palavra—forceps—em obstetrícia, a instrumentos destinados ao mesmo fim que este, tendo porém for- ma diversa da pinça. —Se a historia da invenção do forceps não fornece dados positivos sobre os primeiros ensaios deste instru- mento, ella, neste particular, se assemelha a muitas outras invenções do dominio da arte e da sciencia. Conservado em segredo pelos inventores por causa de sua importância, cedido a alguns por meio do dinheiro, e occultado pelo silencio mais discreto, esse instrumento não podia ser a principio conhecido senão pelas vantagens que proporcionava a seus felizes pos- suidores, vantagens que, muito naturalmente, deveriam estimular o espirito inventivo de uns, as pesquizas de outros, afim de chegarem á descoberta do que havia sido occultado a seus olhos. De facto, instrumentos análogos foram inventa- dos, e, do mysterio de uns em calar a descoberta, da franqueza de outros em annuncial-a, subrevieram dis- putas e reivindicações de prioridade que, se trouxeram á luz o objecto em letigio, não permittiram comtudo ao historiador imparcial e tranquillo tirar dellas uma con- clusão única e verdadeira. Ha escriptores que attribuem a data bem antiga a invenção do forceps; de facto, a idéa de ir tomar com um instrumento qualquer uma cabeça que não desce, ou que, sendo necessária a sua descida, não o faça, é tão in- tuitiva que é de suppor que desde a infância da arte e 7 mesmo desde as primeiras civilisações, muito anteriores a Hypocrates, se tivesse apresentado ao espirito de qual- quer que tratasse de soccorrer a uma parturiente n'esta situação difiicil, e particularmente d'aquclles que se oc- cupassem d'estes assumptos. Porém, os práticos da antigüidade que se prcoccu- param em construir instrumentos destinados a extrac- ção da cabeça detida, só obtiveram, como resultado de suas locubrações, armas mortíferas para o feto; nesse numero estão: a pinça longa et versa de Jacques Rueff constrtiida em 1554 e considerada por alguns como o primeiro esboço do forceps, as pinças descriptas por Avicenne e Abulkasis, por A. Pare, por Fabrice de Hil- den e os instrumentos apresentados por Solingen. Nenhum desses instrumentos pode ser comparado ao forceps obstetrico, comquanto seus autores os con- siderassem inofFensivos, podendo ser applicados sobre a cabeça do feto para extrahil-a. Conforme a opinião da maior parte dos autores, é na segunda metade do século XVII, com os Chamber- len, que começa a verdadeira historia do forceps. E' a Pedro Chambcrlen que se attribue a invenção desse instrumento, assim o provam o testemunho de diversos parteiros contemporâneos, os documentos tirados das mesmas obras de Chambcrlen, finalmente documentos incontestáveis, existentes, ha muito tempo ignorados e que foram publicados, não ha muitos annos. A historia dos Chambcrlen é considerada pela maioria d'aquellcs, que se tem oecupado d'ella, como vergonhosa, indigna de seus protogonistas, médicos, guardando em segredo um invento do qual podia redun- dar grande sõmma de benefícios para a humanidade. 8 Aveling e com elle Poullet defendem, porém, os Chamberlen mostrando as differenças que existem entre o século XVII e os subsequentes. Nesse tempo, nada se havia feito para extinguir a escravidão, as per- seguições, as guerras religiosas superexcitavam o inte- resse pessoal, não havia o estimulo das recompensas acadêmicas para as invenções úteis á humanidade; emfim, como diz Aveling: « Os Chamberlen, exploran- do secretamente a sua descoberta, seguiram o uso do tempo e do meio em que viviam. Pedro Chamberlen, conforme a opinião acceita pela maioria dos autores, é oriundo da Inglaterra;alguns porém e entre elles Aveling, demonstraram por docu- mentos tirados dos registros dos templos protestantes de Sonthampton e de Londres, que esse parteiro é fran- cez, nascido em Paris. Seus pães, sectários das doutri- nas de Luthero, viram-se obrigados a refugiarem-se na Inglaterra, para não soffrerem as conseqüências do fa- natismo religioso, mudando por essa odcasião seu nome Chambrelan para Chamberlen com o fim de anglica- nisal-o. Hugo Chamberlen, filho de Pedro, veio a Paris em 1670 com o fim de fazer fortuna, annunciando-se pos- suidor de um segredo. Por essa occasião, Mauriceau ti- nha uma parturiente que se achava em trabalho, havia já oito dias; consultando o parteiro inglez, este propoz-se a terminar o parto em um quarto de hora por maior que fosse a difficuldade a vencer. Mauriceau (1) refere que elle trabalhou três horas e, como visse que o parto não se effectuava e que a mulher falleceria em (1) Mauriceau — Observations sur Ia grossesse—Paris— 1694. 9 suas mãos, desistio da empresa. Essa mumer, de facto, morreu com o filho no ventre, tendo ficado o utero todo despedaçado e perfurado em diversos pontos pelo instrumento. Os resultados fataes desse parto fizeram-no reti- rar-se para Inglaterra; antes, porém, de fazel-o, foi cumprimentar a Mauriceau pelo seu livro de partos, que traduzio em 1672, a^dicionando-lhe um prefacio em que Chamberlen diz possuir um methodo de ex- tracção do feto, sem prejuizo para este nem para a par- turiente, quando, apresentando-se pela cabeça, existissem obstáculos ásua passagem. Não diz qual o methodo por ser segredo que não pertence a elle só; fém todo o caso, avisa aos seus con- cidadãos que elle, ^eu pae e seus irmãos, mais do que qualquer outra pessoa, podem ser-lhes úteis nos casos apontados acima. Em 1818, o Dr. H. Cansardine, encontrou no fundo de um armário existente em uma velha casa de Wood- ham Mortimer-Hall, habitada por Pedro Chamberlen e sua familia, diversas cartas dirigidas aos Chamberlen e vários instrumentos entre os quaes quatro modelos de forceps; todos estes forceps tinham as colheres fenes- tradas, os ramos cruzados e a articulação era semelhante á das thezouras vulgares; um tinha mais ou menos 12 pollegadas de comprimento, outro não estava ainda acabado; havia um outro que mostrava ter sido nelle tentado um meio de juneção, de modo que os ramos pudessem ser introduzidos separadamente. Estes instrumentos foram estudados pelo Dr. Can- sardine e quinze annos mais tarde expostos no Museu tal. a 10 da Sociedade Medico-Cirurgica de Londres onde Rigby teve occasião de novamente estudal-os. João Palfyn, cirurgião de Gand, em 1716, veio a Paris apresentar á Academia das Sciencias seu forceps, que consistia em duas verdadeiras colheres de aço fixas em cabos de madeira; os ramos desse forceps não eram cruzados e as colheres, que apresentavam a curvatura cephalica, não eram fenestradas. Em conseqüência de ter sido conhecido primeira- mente o forceps de Palfyn, pois só se desvelov o se- gredo de Chamberlen pela publicidade que lhe deu Chapman em 1733,a descoberta do forceps é attribuida ao cirurgião de Gand por alguns autores, figurando en- tre elles Chassagny, Iiubert, de Louvain,etc. O que está fora de duvida é que Palfyn não se inspirou na invenção de Chamberlen, não só porque o segredo deste ultimo foi preciosamente guardado por elle, como também pela differença que existe na forma e disposição dos dous instrumentos. O forceps de "Palfyn pode ser considerado como o typo dos forceps de ramos pararellos, do mesmo modo que o de Chamberlen é o typo dos forceps cruzados. Pelo que temos dito se verifica que o forceps só foi realmente conhecido no século passado; ainda nesta epoca, esse maravilhoso instrumento teve de lutar con- tra resistências consideráveis, antes de occupar o logar a que tem direito, na pratica obstetrica. De facto, em 17-21, De Ia Motte condemnava ainda, de modo absoluto, o uso do forceps nos termos seguin- tes : «Je rendray un bon et fidèle compte du secours des tenettes, si par malheur 1'occasion se presente de mettre cet instrument en pratique, ce que je crsdns .* 11 autant que je sonhaite, par Ia raison que je suis loin de me faire un secret de ces instruments, de Ia manière que fit un certain chirurgien de Gand, que vint à Paris pro- poser au chef de 1'Académie des sciences certain instru- ment de fer, an moyen duquel il se ventait d'accoucher toutes les femmes auxquclles Ia tête de leur enfant serait arrêtée, prise ou enclavée au passage, sans leur causer aucun préjudice. L'un de messieurs les maitres chirur- giens qui avoient été chargés d'examiner cet instrument, afin de donner son avis, me.fit rhonneúr de me deman- der ce que j'en pensais, sans me dire autre chose sur 1'instrument, parce que c'étoit à condition qu'il ne don- neroit à personne connoissance de sa structure. Je ne balancay pas à assurer cet ami, que Ia chose proposée à 1'égard d'un instrument, de quelque structure qu'il put être, étoit autant impossible, que celle de faire passer un câble par le trou d'une aiguille». Felizmente, o tempo encarregou-se de demonstrar o erro de De Ia Motte, e hoje o forceps é justamente considerado como a mais bella conquista da obstetrícia, tão grande é a somma de benefícios que elle propor- ciona á mulher e ao feto. Desde o primeiro forceps dos Chamberlen até a época actual, innumeras têm sido as modificações por que tem passado esse instrumento; bem se pode dizer não ter havido parteiro na Europa que não tenha deixado o seu nome como qualificativo de um forceps. Os inventores do forceps apenas tiveram em vista apprehender a cabeça, elles não sonharam em adaptar o instrumento ás vias genitaes; assim até Levret não te- mos senão forceps rectos. 12 E' o primeiro período da historia do forceps. Em 1747, Levret aperfeiçoou esse instrumento dando-lhe a chamada curva pelviana que o tornou mais adaptável ás vias genitaes. Esse segundo período es- tende-se de 1747 a 1781. Em 1781, Thenance modificou o forceps de ma- neira que esse instrumento comprimisse menos a ca- beça e se articulasse mais facilmente; bem que a tentativa de Thenance não fosse coroada de inteiro successo, todavia ella caracterisa a 3a época da historia do forceps. Hubert, em 1860, modificando o forceps, teve em vista adaptar a tracção á linha central do estreito superior. Pouco tempo depois, Chassagny, inserindo a força no centro de figura do craneo, deu a liberdade de mo- vimento ao forceps. Tal é em poucas palavras a historia das modificações do forceps que merecem ser assigna- ladas. Com effeito, todas ellas baseam-se em principios fundamentaes que deverão ser observados na construc- ção desse instrumento, para que elle possa realisar de modo satisfatório os fins altamente nobres a que é des- tinado. — Vejamos agora de quantos modos actúa o forceps. O primeiro effeito de uma applicação de forceps consiste muitas vezes em despertar ou augmentar a energia do trabalho: a manobra operatoria, a intro- ducção dos dedos na vagina e no collo, o contacto do instrumento com o segmento inferior do utero, exci- tam a contractilidade desse órgão, excitação que de- termina contracções mais enérgicas e mais fortes; porém, em geral, não é esta acção reflexa que se procura. 13 O fim do parteiro, quando lança mão do forceps, é supprira ausência ou insufficienciados meios naturaes de expulsão; para isso elle,como instrumento,começa por apprehender a extremidade cephalica do feto, ex- trahindo-a, por meio de tracções, dos órgãos maternos. Desde porém, que o forceps apprehende a cabeça, co- meça a comprimil-a, compressão que se torna mais considerável á medida que as tracções forem mais enérgicas. Por conseguinte o forceps actúa como um instru- mento de apprehensão, de compressão e de tracção. Passamos desde já ao estudo dessas funeções, as- signalando em caminho, a respeito de cada uma dellas, as principaes modificações realisadas nesse instru- mento. / CAPITULO I O forceps (fortiter capio) actúa primeiramente como um instrumento de apprehensão. Para que essa apprehensão seja perfeita e conveniente é necessário que as colheres do instrumento se amoldem á forma da ca- beça fetal e á do canal genital da mulher, sendo ainda indispensável a observância de certas regras referentes aos pontos da extremidade cephalica do feto aos quaes são adaptadas essas colheres. A forma que apresenta o craneo fetal, deu lugar a que os inventores do forceps imprimissem a esse instru- mento uma curvatura no sentido das faces das colheres, destinada a pôr-se em relação com a curva do ovoide cephalico; é, com effeito, nessas condicçõesque a appre- hensão se torna mais correcta e mais solida. A forma e as dimensões dos diversos forceps tèm sido calculadas para o volume médio das cabeças a ter- mo; assim o instrumento adaptar-se-ha tanto melhor quanto menos se afastar dessa media o volume cephalico, quer por excesso, quer apreseníando-se diminuído. § 1° Modificações do forceps tendo principalmente em vista a apprehensão Os inventores do forceps tiveram somente em vis- ta a apprehensão do ovoide cephalico ; os forceps por elles imaginados são perfeitamente rectos, notando-se 16 apenas a concavidade das colheres, denominada curvatura cephalica, a que já nos referimos. Esses instrumentos eram destinados a apprehender a cabeça do feto somente quando ella se achava encai- xada na excavaçào ou detida no estreito perineal; elles cunstituiram por conseguinte um verdadeiro progresso na época em que foram inventados porquanto, para os parteiros, desde Hippocrates até os desse tempo, a cabeça presa na excavação era de per si uma indicação para a craneotomia, cuja gravidade para a parturiente é fácil de comprehender, se attendermos aos instrumentos in- convenientes que, para esse fim, eram empregados. A defiiciencia de meios de apprehensão da cabeça levara os parteiros de então a generalisarem a versão. Comprehende-se, porém, que a pratica da versão depen- de da altura da cabeça, de sua presença no estreito supe- rior, exigindo delia, além disso, certa mobilidade. Se os parteiros perdiam a opportunidade, se a cabe- ça do feto, por exemplo, descia á excavação, e a evacua- ção do sacco amniotico se processava, elles teriam de recorrer á embriotomiase não quizessem cruzar os bra- ços. Assim, pois, os forceps de Chamberlen e de Palfyn, ainda que completamente rectos e curtos, vieram pro- porcionar grandes benefícios á gestante e principalmen- te ao fecto. Apezar disso esses instrumentos não podiam com- petir com a versão. A rectidão e as pequenas dimensões dos cabos não lhes permittiam apprehender a cabeça além da excavação, porquanto a extensão e a forma do canal pelvi-genital a isso se oppunham; suas applicações achavam-se limitadas aos embaraços da excavação e do estreito perineal. 17 Era, porém, preciso apprehender a extremidade ce- phalica no estreito superior e mesmo acima delle ; para isso, necessário se tornava adaptar o instrumento á for- ma do canal genital, augmentando-lhe a extensão dos ramos ; foi o que se conseguio com a modificação ima- ginada, quasi ao mesmo tempo, por Levret, na França Smellie, na Inglaterra—a curva pelviana. Essa modificação, ampliando consideravelmente o campo restricto das applicações de forceps, permittio que o mais nobre dos instrumentos, na expressão de Barnes, competisse efficazmente com a versão. Em melados do século XVIII, dous parteiros cele- bres, Levret em França e Smellie na Inglaterra, tiveram, quasi ao mesmo tempo, a idéa de curvar o forceps; a prioridade, porém, deste aperfeiçoamento coube de di- reito a Levret que o apresentou á Academia real de ci- rurgia de Paris na sessão realisada em 2 de Janeiro de 1747. Levret, porém, pouco utilisou-se da sua descoberta, não ligando-lhe a importância que ella merecia. Seu principal fim, curvando o forceps, foi evitar as rupturas do perineo. «J'ai plusieurs observations, diz Levret, sur le déchirement de Ia fourchette que plu- sieurs personnes ont dispute être Ia suite de 1'usage du forceps... Pour rémédier à cet inconvénient, j'ai fait faire un forceps courbe, qui ne diffère point d'ailleurs des dimensions du forceps ordinaireLJ'eu ai pris 1'idée sur les tenettes courbes qui sont d'usage dans les opérations de Ia lithotomie. L'on sentira facilement, et mieux que je ne pourrais 1'exprimer, combien il doit être avanta- geux pour cette íin ». TAL. s 18 Levret diz em seguida que, com a segunda cur- vatura, o forceps torna-se mais adaptável que o-for- ccps rccto, quando a cabeça se acha com a face para cima (posição occipito-posterior). Esse illustre par- teiro ainda aconselha o emprego do forceps quando o feto estiver com a extremidade cephalica insinuada no orifício externo, protestando contra o uso do seu ins- trumento, caso o feto esteja inteiramente contido no utero, nos seguintes termos: « Des personnes fort ha- biles, ont bien voulu me prêter une opinion que je n'ai point eue à 1'égard du forceps courbe: elles pensent que je le crois capable d'aller prendre Ia tête de 1'enfant dans Ia matrice, lorsqu'clle n'est point engagée dans 1'orífice; je ne conseille néanmoins son usage que dans les cas oti l'on se sert de 1'autre, et il a eu lui des avantages essentiels que 1'expérience fera reconnaitre, en dissipant les prejugés qu'on voudrait peut-être établir à ce sujet». Taes eram os objectivos visados por Levret, modi- ficando o forceps. Foi somente trinta annos mais tarde, em 1776, que elle teve oceasião de presenciar uma ap- plicação do forceps curvo no estreito superior feita por Coutouly. De 1747 a 1776, Levret apregoou a utilidade do seu extractor cephalico de três ramos. Assim, diz-se com razão qne o forceps de curva pelviana foi, nas mãos de seu inventor, um diamante bruto; outros, mais tarde, encarregararn-sedelapidal-o, collocando-o em condições de ser apreciado. Guilherme Smellie em 1752 fez para Inglaterra o que Levret, cinco annos antes, havia feito para França — enriquecer a arte dos partos com a invenção da se- gunda curvatura — sem que tivesse conhecimento da 19 modificação de Levret, como testificam os autores con- temporâneos. Bem que Smellie se guiasse por uma idéia mais scientifica, procurando com a curva pelviana uti- lisar-se do forceps quando a cabeça não estivesse insi- nuada, não comprehendeu comtudo o alcance do seu invento, demonstrando-o do modo seguinte: « Dans les bassins étroits j'ai quelquefois trouvé Ia tête de 1'enfant tcllement déjetée en avant par — dessus les os du púbis, à cause de Ia saillie de Tos sacrum et de Ia dernière ver- tèbre des lombes, qu'il nem'était pas possible de porter les manches des forceps assez en arrière pour saisir entre leurs tiges Ia tête dans sa grosseur. et pour obvier à cet inconvénient j'ai fait faire une paire de forceps plus longs, courbe d'un cote et convexe de 1'autre, mais on ne doit jamais €cn servir excepté lorsque Ia tète est peütey>. Smellie, do mesmo modo que Levret, depois de ter modificado o forceps, empregou mais freqüente- mente o forceps primitivo, considerando o instrumento curvo como de uso excepcional. Póde-se dizer que o dominio do forceps recto estende-se até 1750, ultra- passando a descoberta de Levret. Actualmente,os parteiros inglezes empregam ainda freqüentemente o que elles chamam—forceps curto— que é completamente recto; esse instrumento, porém, só é por elles usado quando a extremidade cephalica já se acha no fundo da excavação ou quando ella já tem dis- tendido o perineo. Barnes assim descreve o modo de applical-o: «Com o forceps de uma só curvatura, cujos ramos são parallelos, pode-se tomar indiferentemente qualquer dos ramos e applical-o entre a cabeça e o sacrum sobre a orelha posterior; a orelha que se acha em relação com 20 o púbis vos indica a situação exacta da orelha posterior; colloca-se em seguida o ramo pubiano. Em 1866, um medico russo, Lazarewitch,professor em Kharkoff, apresentou á Sociedade obstetrica de Londres um forceps recto, preconisando-o, não só quando a cabeça se achasse na excavação, mas também quando ella estivesse detida pelo estreito superior. Esta reivindicação em favor do forceps recto,como único instrumento de cxtracção, não obteve successo. Não ha um só parteiro que tenha defendido a doutrina de Lazarewitch. Este autor leu uma memória sobre esse assumpto no Congresso de Londres de 1881; o único membro que deu opinião sobre ella foi Barnes, exprimindo-se do seguinte modo: «voltar ao forceps ■ recto é dar um passo atraz; com o forceps recto é im- possível ou pelo menos muito difficil apprehender a cabeça quando ella se acha elevada e sobretudo no es- treito superior». Este forceps tem os ramos rectos e pa- rallelos reunindo-se na união de seu terço médio com o terço inferior,de modo a conservar a ellipse clássica; as colheres, cuja largura é de 4 centímetros,são concavas e fenestradas;os cabos apresentam na parte superior duas saliências sobre as quaes os dedos encontram ponto de apoio para a tracção; na extremidade inferior elles são curvos para fora e despidos de guarnição de ma- deira. A 3 centímetros da extremidade inferior do ins- trumento, em um dos ramos, formando angulo recto, acha-se um parafuso que impelle uma haste metallica e sobre o outro uma cavidade, na qual esta haste vae servir de eixo, de maneira que os cabos possam afas- tar-se um do outro até 2 ip centímetros; o instru- 21 mento tem 31 centímetros de comprimento epesa 475 grammas. Este forceps representa o ponto de partida de uma reacção que actualmente tem sido tentada contra a exaggeração da curvatura de Levret. Lazarewitch foi também exaggerado voltando ao forceps recto; sua doutrina não encontrou adeptos, e a não ser este autor e alguns parteiros inglezes, que se servem do forceps curto e recto quando a cabeça se acha baixa, o typo do forceps recto apenas tem na ac- tualidade um valor puramente histórico. A segunda curvatura do forceps, tendo autorisado a applicação deste intrumento até o estreito superior da bacia, é ainda hoje geralmente mantida, qualquer que seja o modelo adoptado. Passamos a apresentar a descripção do forceps que é considerado por todos os autores como o typo d'a- quelles cujo modo de acção é principalmente determi- nado pela curva pelviana, o ultimo modelo de Levret, que mediante ligeiras correcções constitue o denomi- nado forceps francez—ou forceps clássico. Mencionaremos rapidamente as principaes modi- ficações que em nada desvirtuam a sua maneira de funccionar, comprehendendo nellas as questões pura- mente de detalhe, que o differenciam dos chamados forceps inglezes e allemães. Descripção do forceps de Levret e do forceps clássico.— Três vezes aperfeiçoou Levret o seu forceps. O pri- meiro instrumento, por elle construído, é recto, tendo em cada um dos ramos três orifícios, situados em eguaes distancias, de sorte que se pode facilmente obter a articulação, operando-se por um eixo movei e 22 por chapas corrediças, que se podem denominar—eixo ambulante. Elle tinha em vista poder articular o seu forceps, sem todavia dar uma posição completamente symetrica aos ramos. D'ahi se originou o principio da asymetria, promovido mais tarde em França por Fried, de Stras- burgo, e continuado por Mattei, Campbell e outros. O segundo instrumento já apresenta a nova cur- vatura e pouco differe do ultimo aperfeiçoamento que teve logar em 1760 c foi publicado pelo seu discípulo Stein. O forceps de Levret e o forceps clássico francez, cuja descripção faremos englobadamente, compõem-se de dous ramos, podendo cada um destes dividir-se em três partes: ia a colher, 2a a articulação e 3a o cabo. ja. A colher é destinada somente á introducção nos órgãos maternos para apprehender a extremidade ce- phalica. Larga e achatada, a colher apresenta duas faces, uma externa, convexa, que se mantém em relação com as paredes do canal pelviano; outra interna e concava que, reunida á congênere opposta, deve apprehender a cabeça do feto sem comprimil-a e sem deixal-a escapar. A concavidade que apresenta a face interna da co- lher é denominada curvatura antiga ou cephalica. As colheres apresentam na face central uma janella que, além de reduzir o peso do instrumento, concorre para consolidar a apprehensão. Cada colher apresenta em seus bordos uma curvatura, cuja concavidade é voltada para o operador. Esta é a curvatura moderna ou pelviana. O contorno da janella comprehende dois longos lados curvilineos, chamados gêmeos, reunidos na ex- 23 tremidade do instrumento por um arco um pouco oval, denominado bico. Os gêmeos approximando-se formam, perto da articulação,—o collo do forceps. 2*. A articulação é disposta de medo a permittir a separação dos ramos e a sua fácil reunião. No instrumento de Levret, um dos ramos apre- senta uma abertura central, destinada a receber o para- fuso existente no outro ramo, afim de servir de eixo. Entretanto, no forceps francez, o systema de arti- culação já não é o mesmo; é o modificado por Siebold: a abertura, em vez de ser feita no centro de um dos ramos, é praticada ao lado, c a articulação se opera sem ser preciso levantar este ramo para fazer penetrar a haste, que vae servir de eixo (pivot); basta approximar os dous ramos até que este eixo entre na chanfradura latteral, fixando-se depois a articulação por meio de algumas voltas de parafuso. 30. O cabo é de ferro, curvo para fora na sua ex- tremidade" em fôrma de gancho rombo, de modo a deixar uma concavidade que serve de ponto de apoio á mão para exercer as tracções. No forceps francez, um dos cabos tem uma oliva ôca, que se desparafusa e serve para alojar uma ponta que transforma este cabo em gancho agudo. O outro cabo termina em um gancho que é cur- vado em angulo quasi recto e que, desparafusado, deixa ver uma ponta aguda. De maneira que o forceps é acompanhado dos mais detestáveis instrumentos: ganchos rombos, gancho agudo e um perfilrador recto; instrumentos estes condemnados na época actual. O professor Pajot em suas lições, quando descreve estes appendices do forceps, acerescenta: «Ces choses 24 existent pour vous indiquer que vous ne devez jamais vous en servir!» O intrumento de Levret tem 46 centímetros de comprimento; sua curvatura pelviana é de 6 centíme- tros de altura; os cabos têm 20 centímetros e as co- lheres 26 centímetros de extensão. O moderno forceps francez, em cuja fabricação se substitue o aço ao ferro, é menos espesso e mais leve que o forceps de Levret. Suas dimensões variam conforme provem deste ou d'aquelle fabricante. A media do seu comprimento total é de 45 cen- timentros; a do comprimento das colheres até o ponto da articulação é de 22 cent., a dos cabos, tomada d'este ponto até a extremidade, é de 21 cent. A sua curva pelviana tem 8 centímetros de altura; o maior afastamento das colheres mede 5 centímetros; a distancia entre os bicos das colheres é de 1 centíme- tro. A largura da janella é de 3 cent. O peso é de 800 grammas. Todos esses algarismos representam a media tomada pelos autores. Dos dous ramos do forceps, um chama-se ramo macho,ramo do eixo ou ramo esquerdo; o outro,ramo fêmea, ramo de encaixe, ramo direito. Com o professor Pajot devemos chamar—ramo esquerdo—aquelle que se toma com a mão esquerda e se introduz sempre á esquerda da bacia, e—ramo di- reito—aquelle que se toma com a mão direita e sem- pre se introduz á direita da bacia; essas denominações são de todas as mais úteis porquanto recordam um preceito fundamental que não mudará nunca, emquanto que o eixo (pivot) e a chanfradura podem achar-se indirTerentemente em um ou outro ramo, ou mesmo 25 não existirem, como acontece nos forceps de ramos parallelos. Mme. Lachapelle já tinha proposto denominarem-se os ramos do forceps, direito e esquerdo, segundo a posição delles em relação ao operador. O ramo macho diz Mme. Lachapelle, representa a mão direita do par- teiro—logo deve ser o ramo direito; o ramo fêmea representa a mão esquerda—será pois este o ramo es- querdo, denominações completamente contrarias ás de Pajot. A nomenclatura proposta por Mme. Lachapelle felizmente não prevaleceu, e o professor Pajot poude gravar tantos preceitos no espirito d'aquellesque apren- dem, com a conhecida e celebre phrase: «branche gaú- che tênue de Ia main gaúche et introduite à gaúche; tout doit être gaúche, excepté 1'accoucheur». Aperfeiçoamentos dos forceps de typo Levret.—Entre os aperfeiçoamentos por que tem passado o forceps de typo Levret assignalamos em primeiro logar o que se refere ao desarmamento dos ramos. Desde Mathias Saxtorph, em 1791, os parteiros têm procurado reduzir o volume do forceps com o fim de tornal-o mais facilmente portátil. Este autor, cujo instrumento tinha as colheres do de Levret, a Jarticula- ção e os cabos do de Smellie, dispoz estes cabos de maneira que pudessem ser dobrados sobre as colheres, reduzindo assim o seu comprimento á metade. Mathieu e outros fabricantes de instrumentos de cirurgia têm também apresentado forceps desta natu- reza, não tendo, porém, alguns a conveniente solidez. De todos os systemas para desarmar os ramos o 26 melhor é o que apresenta o forceps dePajot,construido por Charrière, conforme as indicações do sábio professor. Pela modificação de Pajot o forceps fica dividido em quatro pedaços, tornando-se assim muito mais commodo para ser collocado em uma carteira. O instrumento, assim dividido, é fácil de ser ar- mado, conservando depois disso todas as suas qualida- des. Não obstante a solidez que lhe garante o meca- nismo de Pajot, desarma-se o forceps com immensa presteza, basta tomar os ramos pelas duas extremidades e bater com a parte media de encontro ao joelho, im- mediatamente se separam as duas porções do ramo. Nós temos visto muitas vezes o Sr. professor Feijó Júnior empregar o forceps de Dépaul com o aperfeiçoamento de Pajot, sem desmentir jamais as vantagens que lhe assignalamos. O desarmamento dos ramos é, pois, um importante progresso de cutelaria. Quanto aos aperfeiçoamentos relativos á articu- lação de Levret, já dissemos que a juneção dos ramos no forceps desse autor era obtida por meio de um eixo (pivot) em um dos ramos e de uma abertura longitu- dinal feita no centro do outro, de modo que, para pro- ceder-se á articulação, seria preciso levantar o ramo da abertura (ramo fêmea). Siebold reconheceu este incon- veniente e collocou uma chanfradura lateral, desappare- cendo desde então a necessidade de levantar o ramo direito. Como vimos, este é o systema adoptado no for- ceps francez; é uma modificação de detalhe assaz im- portante. 27 No período comprehendido de 184 3 a 185 3, os partei- ros procuraram evitar a pequena manobra, denominada descrusamento dos ramos, que tem logar quando o ramo direito é applicado primeiramente. Elles consideravam esta operação difricil e dolorosa, sendo também dessa opinião Nasgele e Grenser. (1) Actualmente, os parteiros em geral não dão a essa manobra importância alguma, sendo ella de uma pra- tica extremamente simples. Temos tido oceasião de verificar a sua fácil execu- ção que, procedida com delicadesa, é inteiramente in- offensiva. Mencionaremos apenas como curiosidade histórica os processos de articulação de Thureau, de Nova Orleans; Rizzoli, de Bolonha; Tarsitani, de Ná- poles; Sauvé, de Ia Rochelle e Bourdeaux de Mont- pellier. Pode-se dizer que, das difficuldades da articulação do forceps de Levret e da necessidade de descrusar este instrumento em certas oceasiões, nasceu o principio de parallelismo dos ramos do forceps. Na verdade Thenance, quando inventou o forceps de ramos parallelos, teve, sobretudo, em vista evitar essas difiiculdades. O fim principal do parallelismo dos ramos foi, porém, mais tarde interpretado differente- mente por Chassagny, seu mais convicto defensor e constitue hoje uma das principaes modificações do forceps. Forceps de Smellieeseas aperfeiçoamentos—Smellie servia. se de dous forceps dos quaes o maior tem 34 centímetros de extensão sendo 13 para os cabos; as colheres são (1) Naegele e Grenser — « Traitó pratique de 1'art dea accou- «hements». 28 fenestradas e cobertas de um couro fino, são curvas no sentido dos bordos, sendo de 47 millimetros o maior gráo de curvatura. A articulação nesse forceps é feita por encaixe, isto é, cada ramo apresenta uma depressão ou espécie de gotteira limitada por um bordo saliente, de maneira a receberem-se mutuamente. O menor instrumento tem 30 cent. de extensão dos quaes 12 para os cabos e é recto. Os principaes aperfeiçoamentos que teve o forceps de Smellie foram feitos por Simpson e por Barnes. O instrumento de Simpson não tem o couro que guarnece as colheres do de Smellie; do ponto de juncção dos ramos á extremidade das colheres tem mais dous centímetros de comprimento, os cabos apre- sentam a mesma extensão e na parte superior de cada um existe uma superfície plana, onde podem ser collocados os dedos indicador e annular durante as tracções; a ar- ticulação é idêntica. O caracter principal deste forceps é o parallelismo que guardam os ramos a partir da articulação, no cha- mado collo da colher, em uma extensão de 7 centí- metros mais ou menos,"existindo entre as duas porções parallelas uma distancia de 2 ip centímetros. Na articulação, quando os ramos se dirigem para fora, afim de seguirem depois parallelamente, fica um espaço onde o dedo médio da mão direita pôde ser col- locado durante a tracção, tornando-se natural e firme a posição desta mão quando o indicador e o annular estiverem collocados nas orelhas fixas dos cabos. Alguns autores dão a esse forcepes qualidades especiaes, em conseqüência da disposição parallela que 29 apresentam os ramos em uma parte do seu trajecto. O professor Joulin (i) diz o seguinte: «Dans le for- ceps de Simpson, qui est croisé, les deux branches di- vergent brusquement au dessus de 1'articulation, ce qui donne plus de parallélisme aux cuillers». Nota-se no livro do Professor Poullet (2) «on voit encore à cette disposition parallèle des cols des cuillers, un bénéfice pour permettre plus facilement Tallongement de Ia tête; ce que nous dirons à propôs du forceps de Chassagny peut faire comprendre que nous ne lui accordons pas une grande importance sous ce rapport». Chassagny diz que o parallelismo no instrumento de Simpson não existe mais que em uma posição, onde será immediatamente destruído desde que se abrir o forceps para apprehender uma cabeça mais volumosa. Além disso, na opinião desse autor a pressão dos dous ramos estará longe de se exercer parallelamente, visto como os arcos de circulo descriptos nas suas extremi- dades serão muito maiores que os descriptos na parte média. O forceps de Barnes tem 33 centímetros de ex- tensão, conseguintemente menor que os de Simpson e p9 Smellie; não tem as orelhas para a tracção e substitue a porção parallela do de Simpson por uma espécie de annel formado pela juxtaposição incompleta dos ramos, pouco acima da articulação, annel que permitte a intro- ducção de um dedo com o fim de assegurar a solidez da apprehensão. A articulação adoptada por Smellie tem sido con- servada por todos os autores inglezes e constitue o (1) Joulin—«Traité d'accouchements». (2) Poullet—«Des divertes especes de forceps». 30 característico predominante dos chamados—forceps inglezes. Quanto ao comprimento do forceps, os inglezes são também systematicos, os seus forceps são mais curtos que os francezes, mesmo os destinados ao es- treito superior. São estes os signaes differenciaes entre o forceps inglez e o forceps francez de typo Levret. Quanto aos chamados forceps allemães, elles apre- sentam as colheres semelhantes ás do forceps de Levret e os cabos aos dos instrumentos de Smellie e Simpson. O que caracterisa esses forceps é exactamente a ar- ticulação que apresenta uma modificação introduzida por Brunninghausen a qual foi ainda inspirada nas idéas de Levret e Smellie. E' assim que o cirurgião de Wur- tzbourg collocou uma espécie de botão fixo com a ca- beça achatada para servir de eixo, cm um dos ramos (o pivot da articulçãao de Levret ), e no outro ramo uma chanfradura circular, de modo a receber o collo do botão e a manter a fixidez pela simples collocação dos ramos (articulação de Smellie). O mecanismo desta ar- ticulação é facilitado por vários planos inclinados, cujos pontos mais declives vão ter ao botão qne serve de eixo. Deste modo Brunninghausen garante a solidez da articulação franceza e a facilidade da articulação ingleza. Deste estudo summario sobre os diversos aperfei- çoamentos por que tem passado o forceps curvo, pode- mos deduzir as seguintes conclusões: 10. Existem três escolas, a franceza, a ingleza e a allemã, de adopção do forceps curvo. 31 20. O que carecterisa principalmente cada uma d'estas escolas é o systema da articulação. 30. Bem que sejam de formas differentes os meios de juncção dos ramos, entretanto o seu modo de funeci- onar é perfeitamente idêntico — servir de ponto de apoio mutuo para alavancas do primeiro gênero. 40. As outras partes componentes do forceps, de ligeiras variantes na fôrma, são de funeções inteiramen- te iguaes. 50. Finalmente, estes forceps podem ser reduzidos a uma fórmula única e geral—forceps cruzados e symetricos, dependendo o seu modo de acção principalmente da curva pelviana que apresentam. § T. Noções tiieoricas sobre a apprehensão Depois de termos descriptoas principaes modifica- ções realisadas na construcção do forceps sob o ponto de vista da apprehensão, vejamos agora quaes os pontos da extremidade cephalica a que devem ser adaptadas as colheres do instrumento para que essa apprehensão possa ser solida e conveniente. Deste assumpto, os autores que, com maior clareza e minudencia, se têm oecupado, são incontestavelmente os professores Farabeufe Varnier cm cujo tratado inti- tulado «Introduction á 1' E'tude et à Ia Pratique des Accouchcments» colhemos as noções que passamos a assignalar. A cabeça do feto representa um ovoide alongado do mentoao occiput. Nesse ovoide podemos considerar dous pólos: 32 um pólo occipital, cujo desprendimento, na apresentação de craneo, deve effectuar-se em primeiro logar, como succede geralmente no parto natural; um pólo mento- niano que, na apresentação de face, deve ser desprendi- do por primeiro, como acontece sempre no parto es- pontâneo. O eixo desses pólos representa o maior dos diâ- metros cephalicos; é preciso portanto que elle seja conduzido ao longo. Para chegarmos com segurança a esse resultado necessário se torna que as colheres ap- prehendam o ovoide cephalico ao longo, isto é, no sentido desse maior diâmetro. A extremidade cepha- lica deve também ser presa por dous pontos diametral- mente oppostos, porquanto, no caso contrario, ella escapar-se-hia, com a menor pressão, para diante ou para traz das colheres. E' egualmente indispensável que a cabeça do feto seja tomada além de seu ventre ou equador, afim de que os bicos das colheres, apoiados sobre o hemispherio superior, não possam escapar por occasião das tracções. Sobre o ovoide cephalico, como sobre o globo geographico, podemos imaginar planos de secção pas- sando pelos dous pólos, isto é, meridianos. Dous desses planos merecem especial consideração: um, que divi- de a cabeça em duas metades lateraes, passando pela suttura sagittal, nariz, mento, e buraco occipital, é o chamado meridiano sagittal; outro,perpendicular ao pri- meiro, que passa, de cada lado, adeante e acima da orelha, cortando a saliência zygomatica e a bossa pa- rietal, é o chamado meridiano jugoparietal ou simples- mente meridiano latteral. O forceps deve ser applicado no sentido desse 33 meridiano jugo-parietal,é o que constituea chamada— pegada ideal. Assim, em uma apresentação de craneo, depois de executada a rotação, se as colheres do instrumento forem adaptadas no sentido do meridiano jugo-parietal, verifíc iremos que a concavidade do forceps acha-se em relação com a nuca e o occiput, que vae desprender-se; o bico da colher, dirigido para o pólo mentoniano e o pediculo cobre o pólo opposto, chamado occipi- tal. A janella da colher abrange, em uma extremidade, a bossa parietal, na outra, a saliência zygomato-malar, seu bordo convexo excede a parede externa da orbita, o bordo concavo comprime a orelha. Na apresentação de face, se o forceps fôr applicado no sentido do meridiano referido, depois de effectuada a rotação, isto é, depois que o mento se acha colloca- do abaixo da arcada do púbis, verifica-se que o bico da colher acha-se dirigido para o pólo occipital, o pedi- culo cobre o pólo mentoniano. A janella comprehende, em"sua extremidade su- perior, a bossa parietal e na inferior a saliência jugo- — zygomatica. O bordo convexo da. janella excede a parede externa da orbita, o bordo concavo passa pela parte superior da orelha. Em nenhum dos casos figurados as orelhas se acham comprehendidas nas janellas, nem devem sel-o porque ellas estão situadas abaixo do me- ridiano jugo-parietal; entretanto, diz-se commumente que o forceps deve ser applicado de uma orelha á outra, unicamente por constituírem ellas excellentes pontos de reparo. TAL. 5 34 Vejamos agora quaes os inconvenientes da appre- hensão no sentido do meridiano sagittal. Figuremos uma apresentação de craneo, completa- mente flexionada; uma das colheres é adaptada ao sub- occiput e a outra applicada sobre a linha sagittal. Nesse caso, a colher sub-occipital será introduzida até attingir a nuca. Procedendo depois á introducção da colher sagittal e attendendo á necessidade de articular o instrumento a levaremos ao mesmo nível que a prcce- cedente. Realisada a articulação verificar-se-ha que a segunda colher apenas toca a aboboda craneana por seu bico que adapta-se ao bregma. O forceps apprehende portanto o ovoide cephalico por dous pontos diame- tralmente oppostos, porém, elle não excede a grande circumferencia, não attinge o hemispherio superior—a apprehensão será inefficaz. Si, por occasião da applicação da colher sagittal, esquecermos a necessidade de articular o instrumento e introduzirmol-o até que seu bico tenha excedido a fronte, seremos forçados, para proceder á articulação, a retirar essa colher uma vez que a colher sub-occipital acha-se detida pelo pescoço do feto; porém, na execu- ção desse movimento, ou.o bico da colher escapar-se-ha para adaptar-se ao bregma, ou então elle deflexionará a cabeça até que a articulação se torne possível. Nesse ultimo caso, as colheres não serão mais applicadas ao longo, e, ao em vez de serem afastadas por um pequeno diâmetro o serão por um muito maior, d'onde se de- prehende a inconveniência da apprehensão. Assim, na apresentação de craneo, não se deve ap- plicar uma colher sobre o occiput e outra sobre o bre- gma, porquanto o forceps se escapará podendo lesar os 35 órgãos maternos. Não se deve igualmente adaptar uma colher ao occiput e outra á fronte porque a cabeça será deflexionada e em vez de insinuarmol-a pelo menor diâmetro o—sub-occipito-bregmatico, tentaríamos insi- nual-a por um diâmetro maior—o occípito-frontal. O mesmo raciocínio pode ser applicado á apresen- tação de face, isto é, á cabeça completamente deflexio- nada. Nesse caso uma colher será adaptada ao sub- mento até attingir o pescoço. A outra, a fronto-sagittal, se attendermos á necessidade de articular o instru- mento, irá somente até ao bregma e o forceps não alcan- çará o hemispherio superior. Se, porém, introduzirmos a colher fronto-sagittal até o occiput, seremos forçados, para proceder á arti- culação, a retiral-a, adaptando-a ao bregma, como no primeiro caso, ou então abaixaremos o occiput, deter- minando a flexão da cabeça e, nesse caso, o ovoide ce- phalico será apprehendido pelo seu maior diâmetro — o occipito-mentoniano. Portanto, na apresentação de face, depois de ex- ecutada a deflexão, não é possível adaptar-se uma das colheres ao sub-mento e outra ao bregma porque o ovoide cephalico não será tomado pelo hemispherio superior. Não se pôde também applicar uma colher ao mento e outra ao occiput porque nesse caso a cabeça seria apprehendida pelo seu maior diâmetro. Em conclusão, para que o ovoide cephalico, comple tamente flexionado ou deflexinado, seja solida e conve- nientemente apprehendido é necessário que as colheres sejam applicadas no sentido do meridiano jugo-parietal. Acontece, porém, que nem sempre esse ovoide se apresenta por um de seus pólos, occiput ou 36 mento. Elle se apresenta algumas vezes, principal- mente nas posições occipito ou mento posteriores ir- reduetiveis expontaneamente, em attitude intermediária á flexão e á deflexão; outras vezes approxima-se mais ou menos de um desses estados, podendo finalmente achar-se em attitude completamente indifferente. Nessas condições a apprehensão, no sentido do meridiano jugo-parietal, é impossível, visto a cabeça não apresentar-se por um des seus pólos. Vejamos se o ovoide cephalico pode nesses casos ser tomado de uma maneira solida e efficaz. Primeiro caso — Attitude indifferente, não ha flexão nem deflexão, A fontanella anterior acha-se situada no centro do canal pelvi-genital. Se uma das colheres do forceps fôr applicada sobre occiput e a outra sobre a região fronto-facial, a apprehensão será solida porque as colheres achar-se-hão diametralmente oppostas, com as extremidades dirigidas para o hemispherio superior; será, porém, inútil porque a cabeça, assim collocada, não pôde caminhar; é necessário que ellla se flexione ou deflexione, manobra essa a que se oppõem as co- lheres do instrumento, assim adaptadas. Se as colheres forem applicadas de uma orelha á outra, em relação ao plano bi-auriculo-bregmatico, a apprehensão será solida porque ellas se acharão em pontos diametralmente oppostos, porém, a sua ineffi- cacia é ainda manifesta porquanto as tracções, sendo exercidas na direcção do pescoço, não tendem a provo- car o movimento de flexão ou deflexão. Entretanto, esta applicação parece oppôr-se menos que á occipito-frontal á flexão ou deflexão espontânea. Comprehende-se em rigor que a cabeça possa 37 evoluir entre as colheres do forceps, umíu.vez que estas sejam moderadamente approximadas ou momentanea- mente afastadas, movimento inteiramente semelhante ao da polia. Segundo caso — A attitude indifferente da cabeça, que acabamos de suppor, pôde ser comparada á do tra- vessão de uma balança em equilíbrio tendo uma das conchas representadas pelo occiput e a outra pela face. Fazer pender esta balança para o lado do occiput, e, se ella já tende a isso, augmentar essa tendência, tal é o ideal que pôde ser realisado pelo forceps. Assim, se tiveremos uma cabeça em attitude in- differente, se as colheres em vez de serem applicadas no plano bi-auriculo-bregmatico, o forem atraz das ore- lhas de modo que os bicos se adaptem ás apophyses mastoides e as janellas comprehendam as bossas pari- etaes, a apprehensão será solida para atracção porque os bicos se acham apoiados sobre o diâmetro bi-mastoidêo, muito menor que o bi-parietal, que se acha em relação com a parte media das colheres. Desde que as tracções sejam iniciadas, ellas darão começo ou augmentarão a flexão, isto é, abaixarão o occiput. A' medida, porém, que a flexão fôr se operando, ver-se-ha que a bossa pa- rietal deixa de ser comprehendida pela janella para col- locar-se adiante delia. Então, os bicos, não se adaptando mais acima do diâmetro bi-parietal, escapar-se-hão, abandonando a ca- beça fetal. Um resultado útil entretanto será obtido — a flexão da cabeça. Terceiro caso — A face prepara-se par descer, ha um começo de deflexão, muito longe porém de ser com- pleta. Se as colheres forem applicadas para diante de 38 modo que os bicos se adaptem ao angulo do maxillar inferior e a janella comprehenda a saliência jugo-zygo- matica e o olho do feto, a apprehensão será solida para a tracção, não só porque os bicos se acham fixados além do bordo do maxillar inferior, sendo o seu afas- tamento nesse ponto menor que ao nivel das duas ar- cadas jugo-zygomatícas, como também porque as saliências jugo-zygomaticas comprehendidas pelas co- lheres impedem que estas se escapem para adiante. O escapamento porém será fatal desde que a face comece a abaixar-se por etteito da tracção. Chegar-se-ha entretanto a um resultado útil — á deflexão completa. Na apresentação de face em que a deflexão é in- completa, o parteiro é naturalmente levado a applicar as colheres do instrumento de cada lado da fronte. A apprehensão será conveniente nesses casos desde que os bicos sejam fixados diante das orelhas, sobre o angulo do maxillar inferior, como figurámos acima. A applicação será rná se fôr feita directamente sobre as orelhas e mais negativo será ainda o resultado se as colheres forem adaptadas sobre as apophyses mastoides, pois que nesse caso terá logar a flexão do ovoide ce- phalico, contrariamente ao que se queria obter. CAPITULO II Na grande maioria dos casos, o forceps é em- pregado, como auxiliar das forças expuisivas, para vencer resistências de pequena monta offerecidas pelo canal musculo-membranoso da mulher á descida do feto. Faltando a vis a tergo suppre-se a sua falta com uma vis a fronte e o instrumento arrasta a cabeça do feto pelo referido canal que se alarga para dar-lhe pas- sagem. O obstáculo ao parto pôde, porém, ser mais grave e provir de uma desproporção entre o volume do craneo e a capacidade da bacia; a cabeça pode achar- se retida acima de um estreitamento ósseo e nesse caso não se trata mais de um canal que se alarga, trata- se de um canal rígido que, para ser franqueado, exige do ovoide cephalico uma reducção cm seu vo- lume. Essa reducção de volume, quer no parto natu- ral, quer no parto a forceps, é determinada pela própria bacia. A bacia reaje sobre a cabeça do feto eas suas reacções, representadas na fig. i pelas perpendi- culares levantadas sobre as tangentes aos pontos de con- 40 tacto, r e r, se decompõem em forças horizontaes, h e h, que comprimem o craneo e tendem a reduzir- lhe o volume; e em forças verticaes v e v que se oppoem á descida da cabeça. Para dar-se a expulsão, Fig i essas forças v e v devem ser vencidas pela força mo- triz que é representada pela contracção utero-abdo- minal,. no parto espontâneo e pelas tracções nos casos de intervenção pelo forceps. O forceps é portanto um agente de reducção indirecto. Não é somente a bacia que exerce compressão sobre o ovoide cephalico; o forceps também o com- prime inevitavelmente desde o momento em que o apprehende; essa compressão torna-se tanto mais con- siderável quanto mais enérgicas forem as tracções. A compressão exercida pelo forceps poderá ser utilisada impunemente, sendo o instrumento assim transformado em um reduetor directo do ovoide ce- phalico? Para o desenvolvimento dessa questão, devemos estudar, não só a cabeça sob o ponto de vista de sua 41 compressibilidadc, mas também o modo pelo qual o forceps exerce a compressão. A compressão tem sido estudada segundo cada um dos diâmetros isoladamente, e exercendo-se simul- taneamente em dous sentidos, segundo dous diâmetros perpendiculares. Baudelocque foi quem primeiro realisou experi- ências sobre a compressibilidade da cabeça fetal, e, comquanto alguns dos resultados de suas investigações fossem mais tarde contestados, cabe-lhe todavia a glo- ria de ter, antes de nenhum outro, apontado o erro dos parteiros antigos que acreditavam ser a compressão a principal funeção do 'forceps, considerando este ins- trumento como muito mais poderoso que a natureza e capaz de exercer sobre a cabeça uma compressão suf- ficiente para triumphar de todas as resistências. Eis os resultados a que chegou Baudelocque: 10. A reducção cephalica entre os ramos do for- ceps differe conforme os ossos do craneo apresentam maior ou menor solidez e conforme as sutturas e fon- tanellas se acham mais ou menos estreitadas. 20. Essa reducção, em caso algum, é tão accen- tuada como os parteiros a têm annunciado; ella dif- ficil e raramente excederá de 4 a 5 linhas, quando o instrumento actuar sobre os lados da cabeça. 30. E' impossivel avaliar o gráo dessa reducção pelo afastamento dos ramos do instrumento, pelo gráo de approximação que a elles se imprime antes da ex- tracção da cabeça e nem mesmo pela força que se em- prega para obter essa approximação. 4â 40. Emfim, os diâmetros, longe de augmentarem na mesma proporção em que diminue o apprehendido pelo instrumento, ao contrario, tornam-se algumas vezes menores. Como vemos, Baudelocque nega o augmento do diâmetro vertical na reducção do craneo, entretanto elle cita uma observação de Solayres, (1) seu mestre, na qual a cabeça do feto alongou-se chegando a offe- recer mais de 21 centímetros em seu diâmetro ver- tical. Petrequin, contrariamente, affirma que o diâmetro opposto ao apprehendido pelo instrumento augmenta quasi sempre, porém, de accordo com Baudelocque, elle conclue que o diâmetro biparietal pouco diminue e é sempre menos reductivel que o occipito—frontal. Delore, estudando a influencia das pressões sobre a cabeça do feto, começa por estabelecer que ellas se distinguem essencialmente em pressões exer- cidas por corpos concavos regulares, e que são repar- tidas por uma larga superfície, e pressões exercidas por corpos convexos e angulosos que elle denomina pres- sões limitadas. Esse autor chegou ás seguintes conclusões: 10. As pressões exercidas sobre superfícies largas são menos susceptíveis de produzir lesões, depressões, fracturas. 20. E' muito difficil prever o limite em que uma pressão produzirá uma fractura. 30. Uma depressão persistente não é sempre acompanhada de fractura. (1) L' art de 1' accouchement, ti, p.35, 4;j 40. As pressões occipito-frontaes são melhor sup- portadas que as biparietaes. 50. A cabeça, comprimida transversalmente, aug- menta sobretudo segundo o diâmetro trachelo-breg- matico. 60. A pressão exercida pelas colheres do forceps é mais ou menos egual á metade da tracção. Budin (1), considerando que as experiências de Baudelocque, Pétrequin e Delore, tendo sido reali- sadas em craneos presos entre os ramos do forceps, sobre uma mesa, não podiam de modo algum de- monstrar o que se passa quando a cabeça, apprehendida pelo instrumento,franqueia o estreito superior de uma bacia estenosada,instituio uma serie de experiências nas quaes, com o auxilio de tracções mecânicas, medidas pelo dynamometro, elle obrigou o ovoide cephalico a franquear em parte o estreito superior de bacias este- nosadas, e, congelando-o nessa situação, conseguio medir com precisão as deformações que nelle se haviam operado. Como aquelles autores, Budin demonstrou que os diâmetros perpendiculares ao diâmetro comprimido augmentam, verificando ainda que o diâmetro sub- occipito-bregmatico é o mais modificado e o que mais augmenta com o trachelo-bregmatico. Labat, depois de ter repetido as experiências dos autores que, antes delle, se occuparam da compressibi- lidade da cabeça: Baudelocque, Gall, Pétrequin, Joulin, Delore e Budin, instituio sob a direcção de Tarnier, (1) Budin—D; Ia tête da fétus au point de vue de 1'obstétria.iiQ —These de Paris -la76. 44 experiências mais precisas, chegando ás seguintes con- clusões: «10. Com pressões continuas de 15 kilogrammas, obtêm-se reducções de 7 a 8 millimetros sobre o diâ- metro bi-parietal e um pouco maiores sobre o diâme- tro occipito-frontal. Ainda que se prolongue a com- pressão por mais tempo, (12 horas) as reducções não são mais consideráveis. «20. O diâmetro bi-temporal é muito mais reduc- tivel que o bi-parietal. Os diâmetros transversos da cabeça se tornam tanto mais reductiveis quanto mais a compressão se afasta, segundo uma linha recta, das bossas parietaes para approximar-se da origem das sut- turas fronto-parietaes. «30. As pressões limitadas são mais efficazes que as pressões sobre superfícies largas para a producção de reducções sobre o diâmetro bi-parietal. Pela pressão limitada, a reducção se faz sobretudo por deformação ou depressões ; pela pressão exercida sobre superfícies largas, ella se faz principalmente por cavalgamento. As reducções são mais consideráveis quando as pressões limitadas não se correspondem sobre a cabeça do feto, isto é, quando ellas não actuam sobre as ex- tremidades do mesmo diâmetro. «40. Quando, por meio do forceps, se exerce so- bre o diâmetro bi-parietal uma compressão de 15 kilo- grammas, a perfuração previa do craneo ao nivel da suttura sagittal não favorece muito a reducção. Essa perfuração favorece, ao contrario, a reducção,si se fizer actuar sobre o diâmetro bi-parietal uma compressão limitada. 45 «5°. O diâmetro bi-parietal perde quasi que com- pletamente a sua reductibilidade quando a cabeça é apprehendida da fronte ao occiput. «6o. Quando se comprime unicamente um diâ- metro da cabeça, o augmento compensador, dissemi- nando-se por todos os outros, é pouco sensível sobre cada um delles; se a compressão, porém, actuar ao mesmo tempo sobre os diâmetros transversos e antero- posteriores, os diâmetros verticaes sendo os únicos passíveis do augmento compensador, alongam-se nota- velmente». Das experiências, cujos resultados acabamos de assignalar, conclue-se que a compressão em um só sentido é menos grave que a exercida segundo dous diâmetros perpendiculares um ao outro. Quando a compressão actúa no sentido de um só diâmetro e se este fôr o bi-parietal, ella pode attingir um gráo mais elevado sem occasionar lesões; se o diâmetro comprimido fôr o occipito-frontal, a cabeça torna-se mais reductivel, porém as lesões são mais prováveis. O cérebro encontra na direcção dos dous diâmetros não comprimidos o espaço de que é privado pela compressão segundo um só diâmetro. Essa compressão única pode, portanto, ser prolon- gada impunemente por mais tempo. Se a cabeça for comprimida fortemente em dous sentidos, como succede nos casos em que ha um es- treitamento antero-posterior da bacia e em que o for- ceps é applicado transversalmente, conseqüências desastrosas resultarão para a massa encephalica porque então o instrumento exerce uma compressão transver- 46 sal ao mesmo tempo que a bacia determina uma com- pressão antero-posterior. Resulta primeiramente uma expressão considerável das circumvoluções cerebraes em virtude da qual são destruidas as cavidades vcntri- culares cujo liquido se derrame no rachis; o mesmo succede a todos os vasos intracerebracs cujo liquido reflue para fora da cavidade craneana. Depois, a subs- tancia cerebral, reduzida a tão alto gráo de expressão, transforma-se em um corpo incompressivel e reage contra as paredes do craneo indo alojar-se em todos os pontos que escapam á dupla compessão da bacia e do forceps. Observa-se então o alargamento das sutturas, a distensão das fontanellas, etc. O cérebro procura esca- par-se da cavidade que tende a tornar-se insufficiente para contel-o. Esse facto tem sido demonstrado pela experimen- tação e pela clinica. Pela experimentação, elle pôde ser verificado em uma cabeça na qual se tenha collo- cado um balão de caoutchouc contendo água e posto em communicação com uma columna mercurial. Cli- nicamente, pelas observaçães de Depaul registradas na these de Bailly, (i) referentes a casos em que a massa cerebral escapou-se do craneo pelo canal rachidiano, pelos buracos de conjugação, chegando até a cavidade pleural. A compressão enérgica e continua, exercida em dous sentidos, é, pois, excessivamente desastrosa. Q.ual, portanto, o gráo de compressão compatível com a vida do feto? (1) Baiily— De 1'emploi de Ia force dans les accoucUements. Xhèie d'agreg. 1886. 47 Joulin, nas experiências que praticou, conseguio, por meio de tracções progressivas e continuas, redu- ções superiores a 4 centímetros sem fracturas dos ossos. Esse eminente parteiro é o primeiro a declarar que esse resultado não é útil sob o ponto de vista pratico, por- quanto elle foi obtido por meio de forças enormes cujo emprego traria graves inconvenientes para a mulher. Se ossos nem sempre são fracturados por esse gráo de compressão, o cérebro é todavia bastante comprimido tornando impossível a persistência da vida. Não é portanto o gráo de reducção absoluto que é preciso procurar, mas sim o que é compatível com a persistência da vida fetal. Esse gráo não pode ser pre- cisamente determinado; é provável que elle varie se- gundo os indivíduos, segundo o gráo de ossificação da cabeça, a quantidade de liquido cephalo-rachidiano, que vae refugiar-se no rachis, com o gráo de lentidão da compressão que dá ao sangue venoso o tempo suf- ficiente para passar nos seios vertebraes; emfim com o espessamento dos ossos, que não está sempre em rela- ção com a largura das fontanellas, etc. O que a clinica tem demonstrado é que não se deve produzir uma reducção do diâmetro, insinua- do no estreito, superior a 15 milímetros; ainda assim o forceps não deve comprimir o diâmetro a re- duzir em uma direcção inteiramente perpendicular, é provável que uma applicação oblíqua torne a compres- são menos desfavorável. Porque razão a reducção pelo forceps não deve exceder de 15 millimetros se partos naturaes de fetos 48 a termo têm sido observados em bacias de 7 centíme- tros. A explicação desse facto é fácil de comprehender. A natureza determina a expulsão do feto deixando-lhe toda a liberdade de insinuar-se nos espaços mais largos e de achar a posição mais favorável para vencer o es- treitamento—a compressão é graduada e lenta e a reduc- ção só é levada ao ponto precisamente necessário; emfim, o craneo só é comprimido entre dous pontos e emquanto um diâmetro reduz-se, todos os outros podem alongar-se. Em outros termos: a caixa craneana muda âe forma sem diminuir notavelmente de capacidade. Com o forceps esse facto não se dá; a cabeça é comprimida em vários pontos, ella diminue de capaci- dade e reduz-se por cavalgamento. Muitas vezes o feto que, para nascer, necessita uma reducção de um centí- metro, é gravemente compromettido em sua existência, quando extrahido por esse instrumento. O forceps é portanto um máo instrumento de re- ducção. Depois de termos resumidamente estudado a ca- beça sob o ponto de vista de sua compressibilidade, vejamos de que modo o forceps exerce a compressão. A compressão exercida pelo forceps é de três es- pécies differentes: ia. A mão do parteiro, aproximando os cabos do instrumento, determina uma compressão que varia com a força empregada. E' a compressão activa de Poullet. 2*. Durante a tracção, o forceps exerce sobre a cabeça fetal uma pressão que resulta do facto único dessa tracção. E' a compressão da tracção de Poullet. 49 Com effeito, diz Poullet, o forceps só torna solida a sua apprehensão depois de um deslocamento mais ou menos extenso durante o qual, um mesmo diâme- tro da cabeça é preso por dous pontos das colheres que de mais a mais se approximam; d'ahi resulta que a compressão é mais considerável no fim da tracção que no começo, mesmo quando a pressão sobre os cabos não tenha variado. 3a. E' a chamada compressão passiva de Pajot. Para darmos uma idéa exacta dessa terceira espécie de compressão, citamos o seguinte trecho da these de concurso de Pajot: «Esta compressão, que de ha muito, tenho referido em meus cursos, faz-se de dous modos mui differen- tes, e que convém não confundir: ou ella é activa, isto é, a pressão exercida sobre os cabos do instru- mento pelo parteiro se transmitte com os mesmos li- mittes sobre o craneo do feto, preso entre as colheres, ou então ella é passiva e constituída por um pheno- meno bastante complicado que passo a explicar. «Os ramos do forceps, sendo applicados um após outro em um annel resistente e estreito, porém suffi- ciente, para deixar passar o instrumento, articulados depois de terem apprehendido uma cabeça de feto mais volumoso que as dimensões do annel, si se exerce tracções directas com o fim de obrigar a cabe- ça a vencer o circulo que se acha fixo, á medida que o forceps insinuar-se, a compressão que elle determi- na sobre a cabeça augmentará porque o annel estrei- to fará, sobre o instrumento, o mesmo effeito que o VAI, 7 * 50 annel corrediço dos instrumentos de cobre de que se servem os desenhistas (porta-lapis). «Façamos a applicação á bacia. O parteiro será estranho a qualquer compressão activa, c entretanto, a acção compressiva do forceps po- derá, por esse mecanismo, chegar a ponto de de1erm:- nar fracturas do craneo.» Essa compressão passiva pelo mecanismo do porta- lapis se observa principalmente nas baciaes geral ou transversalmente estenosadas no estreito superior. Ella é ainda verificada nas bacias cyphoticas, sendo nesses casos produzida, não pelo estreito superior, mas sim pelos ischions, ou pelos ramos descendentes do púbis, emfim, pelo estreito inferior. Além das espécies de compressão do forceps que acabamos de assignalar, existe a compressão directa- mente exercida pela bacia; esta é produzida pelo diâ- metro estreitado, isto é, mais de nove vezes sobre dez, entre o promontorio e o púbis. Essa compressão se exerce mesmo nos partos espontâneos, facto de ha muito observado, como demonstram algumas observa- ções de Mme. Lachapelle; entre outras a observação II que se resume no seguinte: Estreitamento rachiti- co, parto espontâneo, depressão profunda do parietal direito produzida pelo angulo sacro-vertebral e acom- panhada de fractura, morte do feto no 40. dia. Semelhantes lesões podem ser produzidas unica- mente pela bacia, quando a expulsão se effectua por conta exclusiva das contracções uterinas; esta acção da bacia, com maior razão, será mais pronunciada quan- 51 do a cabeça for arrastada fortemente contra o promon- torio por um instrumento qualquer de extracção. Ha mesmo na construcção do forceps certas con- dições que muito influem sobre a compressão que se faz por intermédio delle. Dellas nos occuparemos no paragrapho subsequente. Modificações realisadas no forceps com o fim de diminuir a compressão. § T Parallelismos dos ramos Thenance, membro do Collegio de cirurgia de Lyon, em 1871, publicou uma memória sobre o for- ceps não cruzado. Fazendo reviver o forceps de ramos parallelos, elle teve em vista principalmente evitar os inconveni- entes que, durante algum tempo, impressionaram os parteiros, o descruzamento dos ramos e as outras diffi- culdades da articulação do forceps de Levret; porém, elle menciona também, como uma das vantagens do seu forceps, poder graduar a compressão por meio de uma atadura, passada na parte media dos cabos. O parallelismo dos ramos certamente não é a Thenance que deve a sua origem, visto como era esta a disposição dos ramos dos primeiros forceps de Chamberlen e das mãos de Palfyn. Na época actual, em que o descruzamento e as dif- ficuldades da articulação de Levret, que Thenance pre- tendia vencer com o parallelismo dos ramos, são con- 1 52 sideradas de pequena monta, é sobretudo a segunda vantagem que os parteiros aproveitaram. Chassagny mais tarde, com o parallelismo dos ramos, foi além de Thenance; elle, não só pretendia regularisar e diminuir a compressão, como também aproveitar-se delia, assim minorada, para lentamente actuar sobre a cabeça e reduzil-a. Os parteiros, porém, na maior parte, consideram a compressão pelo forceps um facto nocivo, ao qual infelizmente não podem fugir, e por isso mesmo jul- gam o forceps de ramos parallelos uma modificação útil, porque comprime menos que o forceps cruzado. Assim, o parallelismo dos ramos pôde ser consi- derado como o representante instrumental da tendên- cia ao principio da não-compressão pelo forceps. A compressão que esse instrumento exerce sobre a cabeça do feto, podendo ser, como dissemos, de três espécies, vejamos se o forceps de ramos parallelos em todas ellas garante mais a extremidade cephalica que o forceps cruzado. A primeira espécie de compressão é a que o par- teiro produz, ou com as próprias mãos sobre os cabos, ou por meio de artifícios collocados, quer na parte me- dia, como acontece com os forceps de Thenance e de Chassagny, quer nas extremidades como se dá com o o forceps de Petit. O forceps de ramos parallelos, representando uma dupla alavanca interpotente, isto é, cada um dos ramos uma alavanca do terceiro gênero, qualquer que seja o comprimento desta alavanca, a compressão applicada equidistarte do ponto de apoio e da resistência étransmit- 53 tida á extremidade das colheres com metade de sua intensidade. O forceps cruzado, dupla alavanca do primeiro gênero, transmitte a força de compressão com egual intensidade, se esta força fôr applicada na extremidade do braço da potência, representada pelos cabos; sendo estes cabos eguaes em comprimento ao braço da resis- tência ou ás colheres. Observadas todas essas condições de precisão ma- thematica, podemos estabelecer em principio que o forceps de ramos parallelos exerce uma compressão sobre o ovoide cephalico, equivalente á metade da exer- cida pelo forceps cruzado. Porém, como muito bem diz o professor Poullet, (i) o forceps commum de typo Levret, não é tão desfavorável, os cabos apenas têm 20 centimetros de extensão e as colheres 25 centimetros; além disso a força desenvolvida pela mão do operador actúa em um ponto dos cabos, distante approximadamente 10 centimetros da articulação, e não na extremidade dos cabos; supponhamos que nesse ponto actúa uma força de 8 kilogrammas, ella já não é transmittida com egual intensidade, porquanto soffre uma reducção que se pôde calcular da maneira seguinte: 8kii. Xo,raio Hl /A. -----<>_j---- — 3 k,l200 (A) 0,m2 5 v J Logo, a força produzida pela mão do parteiro com o forceps commum de typo Levret e nas con- dições apontadas, actúa sobre a cabeça com uma in- (1) Poullet—Archives de Tocologie—Agosto—1884. 54 tensidade (3,ki1, 200) menor que a metade da força ini- cial (8 kil.), conseguintemente menor que a pressão pelos forceps de Thenance e de Chassagny, quando a applicação da força nestes se effectuar na parte media (laços do forceps de Thenance, annel corrediço do forceps de Chassagny). Com effeito, se fizermos o cal- culo dessa mesma força (8 kilogrammas) para o forceps de Thenance que é de ramos parallelos e tem 47 a 48 centimetros do ponto da articulação á extremidade das colheres teremos : 8_k^- X 0^24 __ kii. ru\ ' o,,r,48 — 4 w Supponhamos, diz Poullet, que a 6 centimetros do ponto de articulação desse forceps de Thenance, se approximam os ramos com uma força de 8 kilo- grammas, se exercerá na extremidade das colheres uma compressão de 8k»-Xo,mo6 kll. ,r. o,m48 - ^; Se compararmos portanto as condições do cal- culo A e C poderemos tirar a seguinte conclusão ver- dadeira : exercendo-se uma compressão sobre os ramos do forceps não cruzado nas melhores condições, isto é, o mais próximo possivel da extremidade manual do instru- mento, ella actuará sobre a cabeça com intensidade muito menor do que se fosse produzida pelo forcepscommum quando a força se tiver applicado nas mesmas condições vantajosas, isto é, o mais perto possivel da articulação. 55 Pelas formulas acima referidas, Poullet conclue ainda que a compressão sobre a cabeça é tanto mais enérgica quanto mais longos forem os cabos; ella é ainda tanto menos considerável quanto mais afastadas da articulação dos ramos forem as colheres que actuam sobre a cabeça. Um bom forceps deve pois ter cabos curtos e ramos longos acima do ponto de articulação. Relativamente á seguida espécie de compressão- a compressão de tracção, o forceps de ramos parallelos, em egualdade de condições, é ainda menos nocivo que o forceps cruzado. Finalmente, quanto á compressão passiva de Pajot; segundo Chassagny, seu forceps, nestas mesmas cir- cunstancias, exerceria pressão rnais suave que o forceps commum. E' evidente que, qualquer que seja o forceps, não se pode evitar a compressão passiva das bacias geral e transversalmente estenosadas no estreito superior, nem a das bacias cyphoticas angustiadas segundo o diâme- tro bi-schiatico do estreito inferior.'Essa espécie de com- pressão é grave, porém felizmente rara. Forceps de Thenance—Thenance, dando ramos paral- lelos ao seu instrumento, procurou o mais possivel não afastar-se do forceps de Levret, assim conservou a el- lipse clássica que abraça a cabeça; no ponto cm que se achava a articulação de Levret, ellecollocou uma aber- tura em cada ramo, destinada a receber o angulo de uma toalha por meio da qual se aperta á vontade as colheres, e o restante da toalha serve para envolver os cabos ou então são entregues a um ajudante para au- xiliar as tracções, quando fôr necessário. 56 A juncção dos ramos faz-se na extremidade ma- nual do instrumento por meio de uma chave. Conhecido com o nome de forceps de Lyon, este instrumento foi muito empregado no sul da França; actualmente, attendendo-se ás suas grandes dimensões, ao seu peso excessivo de 1.215 grammas e á falta ab- soluta de flexibilidade de seus ramos, elle está justa- mente abandonado da pratica e destinado somente a fi- gurar nas collecções históricas dos especialistas. Forceps de Chassagny—Em 26 de Fevereiro de 1861, Chassagny apresentou á Academia de Medicina de Paris o seu forceps de tracção sustentada e pressão progressiva e annexo á este um apparelho de tracções mecânicas, o qual completava o Methodo das tracções sustentadas. Estudaremos somente aqui o forceps independen- temente dos outros elementos componentes do seu me- thodo. O forceps de Chassagny tem os ramos parallelos e cada um delles mede 40 centimetros, acompanhando a curvatura das colheres; em linha recta tem 37 centi- metros. Estes ramos são completamente rectos até o ponto em que começam as curvaturas, cephalica e pel- viana, as quaes são pouco pronunciadas, sobretudo a cephalica que, reunida á congênere opposta, não fôrma a ellipse clássica. O ramo direito termina-se do mesmo modo que o do forceps clássico e da mesma fôrma o esquerdo, notando-se somente neste que a curva do gancho achatado é voltada para dentro. A articulação se faz na extremidade manual do instrumento por meio de uma haste metallica transver- 57 sa, presa ao ramo direito por uma charneira que lhe facilita os movimentos de elevação e abaixamento. A 6 centimetros da charneira, a haste termina por um parafuso, em cuja extremidade é adaptada uma porca, de modo que desparafusada a porca até certo ponto, fique uma porção estreita que possa penetrar numa chanfradura que vae ter a um orifício feito no ramo esquerdo, depois do que aperta-se novamente a porca e os ramos ficam mantidos fixamente. Os ramos, desse forceps são flexiveis e a apprehensão da cabeça é garantida por meio de uma trava, articulada na sua parte media e que vae de um ramo á outro; em cada uma das extremidades desta trave ha uma abertura por onde passam os ramos, de sorte que ella age como um annel corrediço, approximando-os á vontade. Eis rapidamente descriptas as partes que diffe- renciam o forceps de Chassagny do forceps clássico; parece-nos ter dado uma idéa do instrumento cuja des- cripção com todos os detalhes se encontra no livro do seu* autor, (i) Chassagny expõe as vantagens do seu instrumento da maneira seguinte: «Com um forceps de ramos parallelos, aS.pressões se exercem quasi perpendicularmente ao diâmetro com- prehendido, ellas lhe são tangenciaes; são quasi nullas sobre a base, na extremidade das colheres, pontos em que ellas são inúteis e prejudiciaes. As pressões são pelo contrario poderosas sobre a aboboda reductivel, nos pontos em que ellas são effica- zes e inoffensivas, e finalmente ellas deixam á cabeça Chaiaagny— Méthode des t^actions soutenues—1871—pag.79 a 107 val 8 58 toda a liberdade de alongar-se para compensar as re- ducções que lhe faz soffrer o forceps em um sentido e a bacia em outro. Quando uma cabeça é apprehendida e tirada por um forceps cruzado, a pellc, as sutturas e as fontanel- las são violentamente distendidas; a substancia cere- bral, comprimida em dous sentidos pelo forceps e pela bacia, reage contra todos os pontos subtrahidos á pres- são e produz ahi uma enorme distensão. Com o for- ceps parallelo, pelo contrario, a cabeça encontra entre as duas colheres todo o espaço necessário para alon- gar-se á vontade e compensar assim as diminuições que lhe fazem soffrer as pressões do forceps e da bacia; então, em logar dessa massa obtusa, tensa que se per- cebe com o forceps cruzado, tem-se, como no parto na- tural, uma cabeça conica e precedida das "pregas do couro cabelludo; sente-se que a polpa cerebral soffre a compressão necessária para fazel-a mudar de forma, porém que essa compressão não a faz refluir pelas aber- turas do craneo nem repellil-a á cavidade pleural pelos buracos de conjugação, como Bailly cita exemplos em sua these de concurso. Para demonstrar esta verdade, já penetrante em theoria, eu fiz construir uma cabeça de borracha, mas- siça nas partes correspondentes á base, ôca e encer- rando água, isto é, um liquido incompressivel, na parte correspondente á abobada, e verifiquei que, fazendo passar esta cabeça em bacias artificialmente estreitadas, era preciso um esforço muito mais considerável, quando ella era apprehendida com o forceps cruzado do que quando era tomada com o forceps recto. Este effeito se produz sempre, qualquer que seja o 59 diâmetro da bacia estreitada, corresponda elle ao diâ- metro da cabeça comprehendido pelo forceps, ou ao diâmetro opposto. Eu verifiquei, pela mesma experi- ência, que as pressões soffridas pelas paredes da bacia estão na razão directa da força da tracção necessária para fazer transpor a bacia. Estes dados theoricos e expcrimentacs são plena- mente justificados pela experimentação clinica». O professor Poullet, interpretando a opinião de todos os autores, considera a compressão pelo forceps como uma necessidade nociva que não pôde ser evitada, salvo o caso em que ella puder ser exercida no sentido do diâmetro antero-posterior da bacia, onde seria de utilidade. Chassagny é o único a sustentar a opinião opposta, acreditando poder fazer melhor a compressão com o seu instrumento. O seu erro, diz o professor Poullet, foi e é ainda sustentar a compressão transversa pelo forceps. Chassagny, baseado nas experiências de Baude- delocque, as quaes elle repetio, servindo-se de três for- ceps differentes: o seu, o de Hatin e o de Pajot, con- cluio que, com o seu instrumento, reduzindo um dos diâmetros da cabeça, o opposto muito pouco augmen- tou, havendo a compensação por parte dos diâmetros verticaes, o que não conseguio com os outros forceps. Para mostrar que essas vantagens são illusorias bastará citar a própria experiência de Chassagny, que reproduzimos textualmente: «O diametro-bi-parietal da cabeça artificial mede dez centimetros; tomando-o com o forceps do autor, uma ligeira pressão exercida na parte media dos ramos é sufficiente para reduzil-o á 60 nove centimetros, comprchendida a espessura das co- lheres. Esta reducção se obtém sem augmento do diâmetro occipito-frontal; verifica-se, porém, um augmento no- tável da cabeça, cujo diâmetro trachelo-bregmatico augmenta seis millimetros». Comparando os algaris- mos que representam a reducção e augmento dos diâ- metros apontados nesta experiência com ]os das expe- riências de Pétrequin, Delore, Budin e Labat, registrados nas primeiras paginas deste capitulo, nós vemos que na experiência de Chassagny a compensação foi de seis millimetros para um centímetro de reducção, emquanto que, nas dos autores acima referidos, a reducção de um diâmetro corresponde á expansão por parte de quasi to- dos os outros para dar-se assim verdadeira compensação. Póde-se pois concluir que a experiência de Chas- sagny é imperfeita e que em uma cabeça natural neces- sariamente preduzir-se-hiam lesões cerebraes; além disso, com semelhante resultado, Chassagny é o pró- prio a invalidar a sua theoria á respeito dos alonga- mentos por parte dos diâmetros. Pela descripção que fizemos do forceps de Chas- sagny vê-se que este autor abandonou a ellipse clássica, porque, no seu modo de pensar, ella impedia o alonga- mento vertical da cabeça; assim elle deixou um espaço sufíiciente «para que a sciencia pudesse reproduzir arti- ficialmente o alongamento da cabeça, -este grande facto physiologico do parto natural, esta condição sitie qua non da terminação racional da dystocia». (i) Já vimos qual o alongamento obtido com esse for- ceps pelo seu autor. (r) Chas»agny— loco ei tato; 61 Poullet refere que Wasseige, tendo empregado o forceps de Chassagny, depois de tracções sustentadas e prolongadas, só obteve um augmento de seis milli- metros no sentido vertical. Este facto está de accôrdo com a experimentação. As experiências de Labat, feitas em melhores condições que as anteriores, têm demonstrado que o máximo desse augmento é de seis millimetros. Relativamente ao gráo de alongamento que Chas- sagny suppõe dar-se no parto natural, o professor Poullet contesta-o, acreditando ser a bossa sero-san- guinea que sobretudo concorre para tornar apparente este augmento no sentido do diâmetro maximum. Demais, a observação de Budin, em 51 partos na- turaes, em posição occipito-anterior, demonstrou que somente em um caso se deu, como quantidade máxima, um centímetro de alongamento, e como gráo minimo, em 16 casos, um augmento pouco apreciável. Esses re sultados não devem surprehender, desde que nos lem- brarmos que a cabeça, atravessando expontaneamente uma bacia normal, dispõe-se de maneira que a reducção se effectue em um sentido, e portanto a compensação divide-se em todos os outros, devendo ser pouco apreciá- vel. E', pois, como diz Poullet, uma illusão de Chas- sagny aceusar o angulo inferior do forceps cruzado, como podendo impedir o alongamento da cabeça. Chassagny, supprimindo a ellipse clássica, deu graves inconvenientes ao seu forceps ; a cabeça era ape- nas retida no sentido longitudinal e nada se oppunha á que ella escapasse pela tangente; o instrumento não garantia, portanto, uma apprehensão solida. Nas appli- cações obliquas, no estreito superior, a falta da ellipse 62 faz com que os ramos do seu forceps sejam muito afas- tados ao nivel dos ischions e da vulva, impedindo a applicação em uma bacia um pouco estreitada. Wasseige, citado por Poullet, reconheceu esse facto em três casos em que applicou este forceps; aprecia-o, porém, diversamente attribuindo-o á falta da curvatura pelviana. Poullet não adopta a causa apresentada por Was- seige e explica o facto pelo afastamento considerável dos ramos deste instrumento na parte que fica abaixo da cabeça, sendo necessária uma amplitude notável da bacia para se tornar possivel uma applicação oblíqua Chassagny, julgando que a cabeça não pôde expe- rimentar uma reducção conveniente sem soffrer pres- sões transversas, tem banido completamente as appli- cações oblíquas. Assim, os inconvenientes que temos apontado não são compensados por vantagens; apenas se pôde citar em o numero destas—evitar as difficuldades da articulação e, como alavanca interpotente e flexível, comprimir menos a cabeça que o forceps cruzado. NOYO forceps de Chassagny—Em uma importante me- mória, publicada em Junho de 1884 nos Archives de Tocologie, Chassagny apresenta um forceps em cuja construcção observou algumas das razoáveis conside- rações que Poullet e Wasseige fizeram sobre o antigo instrumento ás quaes resumidamente nos referimos; assim, deu-lhe a ellipse clássica, cuja ausência no antigo instrumento constituía um dos elementos mais im- portantes. Com a restituição da ellipse, Chassagny tornou mais firme a apprehensão, e a parte terminal do instru- 63 mento permitte as applicações oblíquas qne o afasta- mento no modelo anterior impossibilitava. Os ramos deste novo forceps se approximam na parte media, onde existe em cada um delles um botão; para fixar-se p. apprehensão faz-se, por meio de cordões de seda, uma serie de 8, indo de um botão ao outro. Deste ponto os ramos afastam-se de novo e vão divergindo até fora da vulva, indo prender-se ás extremidades de uma haste transversa por meio de charneiras. Esta haste é metallica e tem 15 centimetros de extensão, ella divide-se em sua parte media, onde se faz a verda- deira articulação dos ramos. O comprimento dessa trave excede de alguns centimetros os maiores diâmetros transversos do instrumento, perdendo assim o paral- lelismo ; segundo o autor é um defeito intencional e constitue uma das vantagens esscnciaes do seu instru- mento. O comprimento do forceps é de 36 centime- tros; acompanhando, porém, as curvaturas cada um dos ramos tem 41 centimetros. Este comprimento au- gmenta a flexibilidade dos ramos, já preparada, se- gundo o autor, pelas curvaturas preexistentes. Chassagny precede a descripção do novo instru- mento de um paragrapho onde enuncia as seguintes condições que deve preencher um bom forceps : «1.0 um forceps deve apprehender igualmente as ca- beças de todas as dimensões; 2.0 o melhor forceps é aquelle que realisa a apprehensão mais solida e mais inoffensiva, exigindo menor força para operar a appro- ximação das colheres; 3.0 a pressão qúe soffre, por parte do operador, o diâmetro apprehendido pelas co- lheres, deve sempre ser insufficicnte para produzir uma reducção e diminutissima para não ser completamente 64 inoffensiva; 4.0 não somente o operador não pôde e nem deve poduzir senão uma pressão mui diminuta, como também é preciso que o diâmetro apprehendido pelas colheres do instrumento possa augmentar-se para compensar a reducção do diâmetro opposto, sub- mettido á pressão da bacia; 5.0 se o diâmetro appre- hendido pelas colheres fôr mais considerável que o diâmetro correspondente da bacia, é a própria bacia que deverá operar-lhe a reducção; 6.0 um bom forceps deve reduzir cm todos os limites do possivel a somma dos esforços necessários para fazer a cabeça transpor a bacia; 7.0 o forceps, devendo apprehender um corpo asymetrico, collocado em uma cavidade, igualmente ir- regular, deve articular-se fácil e solidamente nas con- dições de uma certa asymetria». Chassagny estuda estes preceitos no decurso do seu trabalho, estabelecendo um parallelo entre o novo forceps e o forceps cruzado por meio de apparelhos de madeira, semelhantes a estes instrumentos e com ca- beças artificiaes. Deste estudo resulta a realisacão de to- das estas condições por parte de seu instrumento e a impossibilidade de serem preenchidas pelo forceps cruzado. Não é pretenção nossa criticar o trabalho do il- lustre parteiro, falta-nos competência para isso; toda- via, na sua memória encontrámos um tópico que im- pressiona immediatamente quem o lê , e é o ponto básico sobre o qual funda-se todo o seu trabalho, não nos animaríamos a dizer que encerra um erro se não estivéssemos escudados na opinião do professor Poullet a quem sobeja competência neste assumpto. Eis o trecho da memória de Chassagny: «Dês le 65 debut, le forceps ne glisse pas parallèlement à Ia tête; il est repoussé, et Ia partie inferieure (par rapport au bassin) de Ia tête que le repoussé, ne quitte pas Ia par- tie inferieure de Tellipse; bientôt les extfemités se rap- prochent et viennent à leur tour se mettre en contact avec Ia partie superieure de 1'ovo'i'de, que se trouve aussi comprime par les deux extremités, et seulement par les deux extremités de 1'ellipse, il pourrait rester un vide entre elle et le point culminant de 1'ovoíde; dans cecas les préssions exercées par les cuillers auraient pour resultat, non réduire le diamètre embrassé, mais au contraire, de 1'exagerer». (i) Para Chassagny é este um dos inconvenientes mais sérios do forceps cruzado, demonstra-os com os seus apparefhos, cuja configuração é completamente imaginaria e cujas curvas não são nem a do forceps, nem a da cabeça fetal. Para provar a apreciação falsa de Chassagny bas- tará lembrar que, para que as extremidades da cabeça sejam apprehendidas pelas duas extremidades da ellipse e para que a parte media dessa ellipse não fique em contacto com esse ovoide, é necessário que a curva ce- phalica do instrumento seja de um raio menor que o da curva da cabeça fetal. Ora, diz Poullet (2), nos for- ceps de Stoltz e de Pajot, a curva cephalica é de 12 cen- timetros de raio, logo as duas extremidades da ellipse só tocarão a cabeça ao mesmo, tempo, se apprehender- mos uma cabeça de 25 centimetros de diâmetro, no minimo. (1) Archives de Tocologie—Juillet—1831 pag. 483 e 484. (2) Archives de Tocologie—Aout—1884. YAfc, 9 66 E\ pois, inexacto o ponto de partida do trabalho de Chassagny. Os casos clínicos que este autor apresenta são em numero de cinco, em três dos quaes se tratava apenas de primeiras posições com resistência das partes molles. No quarto caso, a cabeça se achava na excavação em occipito-posterior, era uma cabeça volumosa; despren- deu-se em occipito-sacra, o perineo ficou intacto e o feto respirou immediatamente; não nos parece tratar-se de uma difficuldade insuperável para qualquer forceps. No quinto caso, os dados são muito incompletos para se fazer uma apreciação justa. Tratava-se de uma cabeça muito volumosa e em adiantado estado de ossificação, com desapparecimento quasi completo das sutturas e fontanellas; essa cabeça, cujos diâmetros e posição Chassagny não refere, estava insinuada na bacia (não diz em que ponto) que apresentava um ligeiro estreita- mento transverso. Fizeram-se tracções de 40 kilogram- mas, approximadamente durante um quarto de hora. O feto nasceu vivo, e tendo soffrido uma compressão intensa,o frontal esquerdo collocou-se debaixo do parie- tal, cavalgamento que só desappareceu dous annos depois. Por essa ligeira analyse que nos suscitou a leitura do paragrapho em que Chassagny expõe alguns factos clínicos do seu novo instrumento, vê-se que elles nada concluem em favor do novo forceps, ou por terem sido incompletamente descriptos, ou por não mostrarem grandes difficuldades obstetricas. 67 § 2* Aspetria dos ramos do forceps. Pelo primeiro modelo do forceps que Levret pu- blicou(i),vê-se que elle julgava necessária a posssibilida- de de articulal-o em diversas alturas, sem dar aos ramos uma posição symetrica. Essa primeira idéa, como diz Poullet, passou despercebida, e é Fried, de Strasburgo que deve ser considerado como o promotor da asyme- tria do forceps em França. Rist apresenta em sua these as três modificações realisadas no forceps por Fried, entre as quaes se encontra a seguinte:«elle dispõe o seu forceps de modo que um dos cabos possa voltar sobre o eixo do instrumento por meio de um parafuso, de sor- te que a colher possa tomar uma tríplice direcção ». Em Levret encontra-se um modo de asymetria, em Fried um outro e finalmente em Uytherhoven e Bau- mers encontra-se um terceiro, porem differente em re- lação ao seo fim. Primeiro modo de asymetria.—A articulação faz-se em diversos pontos da mesma direcção,de modo que as co- lheres fiquem no mesmo plano, porém uma acima da outra, formando uma ellipse asymetrica. No forceps francez, como em quasi todos os ou- tros, os ramos se articulam em ponto certo ede antemão determinado. D'isso provêm muitas vezes inconve- nientes. Nas bacias rachiticas, quasi sempre a cabeça apre- senta-se no estreito superior desdobrada e em posição (1) Levret — Observations sur los causes et les accidente de plusieurs accouchements laborieux — 1770. 68 transversa; o forceps clássico e os outros forceps sy- metricos a apprehendem, mais ou menos, segundo os diâmetros longiíudinaes. A cabeça, nessas condições, é trazida á excavação, offerecendo-lhe os seus maiores diâmetros, o que comprime os tecidos do canal pelvia- no e a immobilisa, havendo muitas vezes necessidade de recorrer-se á craneotomia para terminar o parto. Na pratica, vê-se commumente, depois da intro- ducção dos ramos, um delles ter penetrado mais pro- fundamente; é provável que esta penetração se tivesse dado em conseqüência de ter-se este ramo adaptado mais fácil e correctamentesobreoovoidecraneano e nes- se caso o parteiro procura introduzir mais o outro; se não conseguir elle ver-se-ha forçado a retirar o ramo opposto, afim de articulal-o convenientemente, perden- do o beneficio que poderia resultar dessa bôa appre- hensão ; muitas vezes esta ascenção de um dos ramos é devida á posição que figurámos acima; o occiput achan^lo-se nestas condições acima da fronte, a colher que lhe corresponder penetrará mais profundamente. Comprehende-se que, com um forceps asymetrico, estes inconvenientes seriam removidos; no primeiro caso, a cabeça seria tomada segundo diâmetros favoráveis á insinuação, completando-se o movimento de flexão; no segundo, o parteiro não teria necessidade de retirar o ramo mais profundamente situado, porquanto elle poderia nestas mesmas condições articular o instru- mento, aproveitando as vantagens que d'ahi pudessem resultar. Estabelecidos estes princípios, ficam demonstrados os defeitos do forceps clássico, como instrumento sy- metrico. Vejamos agora se o forceps asymetrico, que 69 em theoria, remove esses defeitos, procede egualmente e sem inconvenientes nas applicações praticas. Seria de admirar que os parteiros modernos tivessem rejeitado uma idéa que vinha resolver questões insoluveis para o forceps symetrico, se fortes razões praticas a isso não se oppuzessem. O professor Wasseige (i) aponta todas essas ra- zões em uma apreciação que faz sobre o forceps asy- metrico de Mattei, perfeitamente applicavel á nossa questão:«Ha certamente nesse instrumento uma bella idéa theorica; entretanto, não ésemalgum inconveniente que se utilisa a resistência das partes molles e da bacia pa- ra manter a cabeça em contacto com os dous ramos, o que acontece quando não são applicados nas extremi- dades de um mesmo diâmetro. As partes molles devem então soffrer um attrito nocivo, e se os ramos não forem applicados, mais ou menos, nas duas extremidades de urn mesmo diâme- tro, a cabeça poderá escapar-se e o instrumento irá des- pedaçar ou contundir as partes molles ». Segundo modo de asymetria— A ellipse asymétrica, neste caso, é formada pela rotação de um dos ramos sobre a linha central dos cabos, de maneira que cada colher possa occupar plano differentee o ovoide cepha- lico seja apprehendido por extremidades de diâmetros diversos. O raciocínio de Wasseige nestas condições ainda nos parece mais producente. O grande forceps asymetrico de Mattei, descrípto pOJ i (1) Wasseige — Des opérations obstét icales — 1881. W este autor em 1855, na sua obra intitulada — Ensaio so- bre o parto physiologico , possue estas duas espécies de asymetria que lhe são fornecidas por uma peça que ser- ve de articulação e por meio da qual os ramos (que são perfeitamente symetricos e só differem do forceps de Levret pelos cabos que são curtos e revestidos de ma- deira) podem escorregar para cima e para baixo e rodar, afim de collocarem-se em planos diversos. Pode-se filiar ao segundo modo de asymetria o Retroceps de Hamon, cuja descripção foi publicada em 1873. Este instrumento é, em resumo, um pequeno forceps de ramos parallelos, articulados em uma haste transversa; um dos ramos, o esquerdo, tem movimen- tos de balanço no sentido latteral; o direito roda em torno da linha central do instrumento; é,pondo em jogo este mecanismo, que o seo autor applica-o, como o no- me indica (retro capere), na parta posterior da cabeça, isto é, na parte da cabeça que se acha voltada para o sacrum. Quando consegue extrahir o ovoide cephalico, o retroceps de Hamon actúa como uma larga alavanca, tendo o inconveniente de tomar ponto de apoio no ca- nal pclviano. Quando a cabeça não estiver insinuada, este instrumento, actuando nas extremidades de diâme- tros oppostos, não garante a apprehensão e a cabeça foge para diante. Quando os seus ramos se collocam em symetria, é o peior de todos os forceps. Nestes forceps, o movi- mento de rotação de um dos ramos, p?ra realizar a asy- metria, tem como eixo a linha central dos cabos; en- tretanto esse movimento deveria ser feito segundo o 71 eixo das colheres, attendendo-se á curva pelviana do instrumento. Terceiro modo de asymetria.—Os autores costumam descrever, como instrumento asymetrico, o forceps de Uythcrhoven; effectivamente,a fôrma desse instrumento é asymctrica, as suas colheres são differentes e concor- rem para formar uma ellipse cujosjados não são seme- lhantes, isto é, uma ellipse asymetrica. Convém, po- rém, notar que o fim a que é destinado este instrumen- to é mui differente d'aquelle a que se propõe a asyme- tria do forceps — apprehender a cabeça em uma posi- ção cujos pontos não se correspondam e collocar-se na bacia também em planos diversos. Uytherhoven, cirurgião deBruxellas,construio em 1805 o seu forceps antero-posterior, com o fim de applical-o ás bossas parictaes, quando a cabeça estivesse transver- salmente collocada na bacia; deste modo garantia uma bôa apprehensão e evitava os inconvenientes da collo- cação da colher sobre a face do feto; foi também esta a origem da reinvenção deste instrumento,em 1849, por Baumers, de Lyon. Os forceps de Uytherhoven e Baumers têm um ramo anterior, destinado a ser applicado em relação com a symphyse pubiana, e um posterior, muito mais longo, para ser applicado em relação com o sacrum. Em rigor, não se pode dizer que estes ramos pos- suam as duas curvaturas, é a mesma curvatura cepha- lica que, muito exaggerada e com uma certa inflexão na parte antero-inferior do ramo anterior, accommoda-o ao canal pelviano. Entretanto, os autores mencionam nes- te forceps as duas curvaturas: a cephalica e a pelviana, sendo, porém, esta desenhada no sentido das faces e não 72 segundo os bordos, como no forceps de Levret, o qu9 quer dizer que a curvatura pelviana, no instrumento de Uytherhoven e Baumers, é feita em um plano perpen- dicular ao da curvatura pelviana ordinária. Esta differença de forma das colheres constitue o característico do terceiro modo de asymetria. Essa modificação representa uma idéa útil porém de realisação instrumental puramentetheorica — a com- pressão da cabeça pelo forceps unicamente no sentido antero-posterior, coincidindo com a compressão ope- rada pela bacia. Ninguém conseguio applicar no vivo o forceps de Uytherhoven e Baumers, razão porque foi logo aban- donado. CAPITULO III A tracção é a principal funcção do forceps; é por intermédio delia que esse instrumento consegue sup- prir os meios naturaes de expulsão, realisando assim os fins altamente nobres a que é destinado. Achando-se, na época actual, geralmente adoptada a curva pelviana, nós estudaremos essa funcção to- mando por norma o forceps curvo. O forceps pôde ser applicado na cabeça, quando completamente flexionada (craneo), quando completa- mente em extensão (face) e nos pontos intermediários a essas duas situações extremas; ainda pode-se estender a sua applicação á cabeça retida por ultimo, separada ou presa ao tronco e ainda excepcionalmente á extre- midade pelviana, variedade de nádegas. A cabeça fetal pôde achar-se em niveis diversos, re- lativamente aos differentes planos da bacia: acima do estreito superior, já insinuada neste estreito, na exca- vação e no esreito inferior. A direcção, segundo a qual devem ser exercidas as tracções, varia conforme cada uma dessas situações" E' principalmente nas applicações acima do estreito superior e ao nivel delle, que se tem estabelecido uma serie de experiências, afim de ver qual a direcção satis- fatória a dar ás tracções para se poder tirar segundo o eixo da bacia. YU,. 10 74 DireCÇãO das tracções.—A' primeira vista esta questão parece de fácil resolução, sendo muito simples procede1" segundo o preceito sobre o qual todos os parteiros são unanimes—tirar na direcção dos eixos da bacia. Entre- tanto esse preceito enfrenta duas grandes difficuldades a vencer: i.a qual a direcção dos eixos da bacia? 2.a como se deverá proceder com o forceps curvo para poder tirar segundo estes eixos? A primeira destas difficuldades é quasi que insup- peravel; na maior parte das vezes nunca se poderá obter senão uma approximação variável, e só o tino, a habilidade e a pratica do operador conseguirão, até certo ponto, dar-lhe uma noção dos planos e dos eixos da bacia da mulher entregue a seus cuidados. Em uma bacia normal, quando despida de partes molles e em que é possivel o emprego de instrumentos para deter- minar seus planos e eixos, ainda assim os parteiros não estão accordes nesta determinação e o provam os in- numeros trabalhos confeccionados neste sentido por J. Müller, Smellie, Rcederer, Levret, Camper, Baude- locque, Ncegele e tantos outros. Comprehende-se, pois, que estas difficuldades se tornarão mais consideráveis em uma mulher viva, não se dispondo de meios de investigações e principalmente na mulher grávida em que as leis que presidem á configuração normal da . bacia tiverem aberrado. Apontando estes factos, acreditamos ter demons- trado que é notável a difficuldade de elucidar o eixo theorico da bacia; não pretendemos apresentar a dis- cussão dos autores sobre este assumpto por não cons- tituir objecto de nosso trabalho, todavia devemos lembrar, como mais importantes, as seguintes theorias. 75 As idéas de Cazeaux parecem estar mais em har- monia com o modo de pensar de todos os práticos em relação ao esqueleto da bacia. Cazeaux considera o eixo da excavação pelviana uma linha em parte recta e em parte curva; recta em sua porção superior, correspon- dente ás duas primeiras vertcbras sacras, curva no resto de sua extensão. O eixo do estreito superior será uma linha dirigida de cima para baixo e de diante para traz, partindo pouco mais ou menos da cicatriz umbilical e terminando na reunião dos dous terços superiores com o terço inferior do coccyx. O eixo do estreito inferior será representado por uma linha perpendicularmente dirigida da primeira vertebra do sacrum, ao meio do espaço bis-ischiatico; esta linha se encontra na exca- vação com o eixo do estreito superior, formando um angulo obtuso aberto para diante. Hermann, Morales e muitos outros parteiros con- sideram que, em uma bacia normal, collocada a mulher em posição obstetrica, o plano do estreito superior é sensivelmente parallelo ao horizonte, e que o eixo deste estreito, ou da excavação é representado pela linha per- pendicular a esse plano horizontal. Pinard e Tarnier fizeram pesquizas neste sentido, resultando de suas experiências que a cabeça desce do estreito superior até o estreito inferior em linha recta e não seguindo uma linha curva de concavidade ante- rior. A doutrina de Fabri, de Bolonha, sobre a descida da cabeça em linha recta, ou approximadamente, até a parte inferior da excavação pelviana, éacceita por alguns 76 parteiros; esta theoria é sustentada brilhantemente por Sabaticr (i). Segundo Fabri, a cabeça desce mais ou menos em linha recta até a parte inferior do sacrum, d'ondesegue um trajecto curvo, formado por esta parte do sacrum, do coccyx e do perineo; ella toma então ponto de apo- io no bordo inferior da symphyse pubiana ao redor do qual gira. Por conseguinte, na opinião deste autor a cabeça desce, mais ou menos, segundo a direcção do eixo do estreito superior até a parte inferior da excavação ;d'ahi em diante a direcção é curva. A linha que representa este trajecto percorrido pela cabeça é também parte re- cta e parte curva. São estas as opiniões mais acceitas presentemente; d'cllas deduzem-se conhecimentos uteis que devem gu- iar o pratico para poder, junto ao leito da parturiente, adquirir com mais ou menos probabilidades a noção do eixo da bacia. Passemos á segunda questão: como se deve pro- ceder com o forceps curvo para poder tirar segundo os eixos da bacia? Durante muito tempo a curva pelviana do forceps embaraçou os práticos na execução das tracções e po- de-se dizer que os ulteriores aperfeiçoamentos, accen- tuando mais esta curva, têm ao mesmo tempo tornado mais graves os inconvenientes que redundam de uma direcção má das tracções. Os práticos aconselhavam exercer as tracções so- bre os cabos, dirigindo-os para baixo e fortemente pa- (1) Sabatier — Do Ia descento dana les bassins normaux — Thô- ee de Lyoa — ISSO. 77 ra traz, quando a cabeça estivesse insinuada no estreito superior ou retida acima d'este estreito. Esseconselho? que era reproduzido por todos os clássicos figura entre as regras geraesda manobrado forceps dadas pelo professor Cazeaux, assim diz elle (i): «Si Ia tête est au détroit superieur, on tirera d'abord autant en bas et en arrière possible» e mais adiante, na mesma pagina: « Pour pra- tiquer les tractions, Ia main droite est placé á 1'extre- mité des cuillers et en dessus de 1'instrument, Ia main gaúche en avant de 1'articuiation et en dessous ». E' evidente que esta maneira de operar é o resul- tado de uma illusão desses parteiros, os quaes esquece- ram, não só que o novo instrumento possuia uma cur- vatura, como também que era curvo o campo em que iam operar, elles não se lembraram qual deveria ser o ponto da applicação da força, em relação ao plano do estreito superior e nem viram que, para exercer as tracções desse modo no eixo do referido estreito, se tor- naria necessário um instrumento recto que atravessasse o perineo na mesma direcção da linha central do isthmo da bacia. Ora, as tracções sendo feitas nos cabos do forceps e estes pontos achando-se collocados inteira- mente fora dos eixos da bacia, é absolutamente impos- sivel exercer uma tracção directa segundo estes eixos. Isso decorre naturalmente do seguinte dado de mecâni- ca elementar: para tirar um corpo no eixo de um canal, é preciso antes de tudo que a mesma força que operar a trac- ção seja collocada na direcção deste eixo. Os inconvenientes que derivam desta excentricidade de tracção têm por causa, como veremos, a decompo- (1) Cazeaux — L'art des accoucuements — 1883 pag. 1007. 78 sição do esforço empregado pelo parteiro em força compressiva, isto é, nociva, actuando perpendicular- mente sobre as paredes da bacia e em força extractiva ou útil, directamente opposta a resistência a vencer, forças estas que se desenvolvem com quasi egual in- tensidade. Este facto, já de ha muito presentido por alguns parteiros, foi demonstrado brilhantemente pelo calculo por L. J. Hubert, professor de Louvam. Pela importância que encerra o raciocínio deste illustre parteiro, passamos a aprcsental-o in extenso (i). « Quando um corpo atravessa um canal encontra ahi resistências, mais ou menos vivas, conforme as dimensões do continente e do conteúdo estão em re- lações mais ou menos exactas. I:ig. 2 Estas resistências se combinam de maneira a po- derem ser representadas por uma resultante ou por uma resistência única cuja direcção se confunde com o eixo do canal. As resistências das paredes da bacia (fig. 2) são representadas por suas perpendiculares eo, io. que se de- compõem em forças horizontaes ef, if tendentes a re- (1) — Note Sur 1'équilibre du forceps et du levier) — Móm, do 1'Acad, roy, de Belgique, 1860. E. Hub3rt — Couis d'accouchemjnt8 — 1885. 79 duzir o craneo, e em verticacs im, en, que se oppõem á sua descida e que se pôde representar por uma resistên- cia única f R=z im + en. Para que o corpo seja expul- so ou extrahido, é preciso que elle seja submettido a uma força, pressão ou tracção, superior á / R, exercen- do-se sobre elle em sentido contrario ao da resistência. Supponhamos primeiramente um foreeps recto, bem applicado sobre a cabeça, fazendo systema com ella e tendo exactamente a direeção do eixo da bacia. i.o As tracções exercidas segundo o eixo do canal são completamente úteis. Com effeito, a força po(üg. 3) dire- ctamente opposta á resistência / R, será completamente empregada em»vencel-a; passando pelo centro de figu- ra do craneo /, ella não imprimir-lhe-ha movimento ar c (L í '?! \ \ f 11 Fig. 3 Fig. 4 algum de rotação, e, parallela ás paredes do canal, ella não terá a vencer senão as resistências que nascerem do attricto. Para desrolhar um frasco não se pôde puxar me- lhor do que no eixo da gargalo. 80 2.0 As tracções exercidas perpendicularmente ao eixo do canal se perdem inteiramente cm pressões nocivas. Com effeito: seja a força ps perpendicular ao for- ceps (fig. 4), o movei será logo detido pela parede cd do canal; o ponto r tornar-se-ha ponto de apoio e ps actuará sobre/)/, como sobre uma alavanca, d'onde re- sultará uma tendência á rotação com pressão em r e em u. Estas pressões em mecânica são representadas por ps y pf; cilas serão, pois, tanto mais consideráveis quanto mais longo fôr o forceps ou quanto mais lon- ge da vulva fôr tomado. 3.0 As tracções dirigidas oblíqua mente se decompõem em esforços extractivos ou úteis, e em esforço^ compressivos ou nocivos. R* Fig. s Sejam tracções oblíquas, de egual intensidade pm, pm, pm" (fig. 5). Cada uma dellas pôde decompôr-se em uma força vertical ou útil e em uma força horizontal ou nociva. 81 Ora, é fácil de comprehender que, quanto mais se afasta da direcção po, mais decresce o esforço útil pó, pó\ pó", e mais augmenta o esforço nocivo pk, pk',pk". Não ha, portanto, na realidade senão que uma úni- ca bôa direcção a dar aos esforços, é a do eixo do canal, confundida em nossa hypothese com a mesma direcção do forceps e passando pelo centro de figura do movei a extrahir. Ora, é somente no estreito inferior e na excava- ção que é possivel tirar exactamente no eixo do canal e ainda para isso é preciso ter o cuidado de não actuar sobre os ganchos e tomar o instrumento o mais perto possivel da vulva. Como vamos ver, tirar sobre os ganchos seria ti- rar obliquamente, e como demonstramos, a tracção oblíqua perde-se, em parte, em compressões. Fig. 6 Quando a cabeça está ainda no estreito superior, a presença do perineo e do coccyx oppôe-se absoluta- mente a que o eixo do forceps se confunda com o ei- xo do estreito a transpor e o instrumento é sempre diri- gido obliquamente de cima para baixo e de traz para diante. Ora, nestas condições: 10 a força, dirigida de mo- 82 do a passar pelo centro de figura do craneo, produzirá effeitos tanto menos desvantajosos quanto menos ella se afastar do estreito superior. Logo é preciso tomar o forceps o mais próximo possivel da vulva. A. figura 6 demonstra claramente este axioma. Se- jam duas forças eguaes pm, pJm, cuja direcção passa. pelo centro de figura/, e applicadas, a i* aos ganchos e a 2^ á articulação. Refiramos pm a fo e p'ni afo' ; obtemos: /o= fs-\- ft efo'=fs'+ft'. Ora, fs <.fs e pelo contrario ft >//'. Em outros termos, a força gasta conservando-se a mesma, o effeito nocivo é mais considerável, si ella fôr applicada aos cabos do que si ella o fôr á articulação. 20 O instrumento sendo tomado contra a vulva é impossível dar á força uma direcção melhor que a de fazcl-a passar pelo centro do craneo. ^> Fig. 7 Nós acabámos de ver que a força melhor collocada pm, produz ainda um effeito compressivo/f, visto como pm— for=fs+ft. Vejamos o effeito produzido por uma força de egual intensidade pm', que se afasta um pouco da única direcção* bôa (fig. 7); decompondo pm, nós encontramos: pm'=pm+pz. Ora, o que vem a ser esta força pz que vem juntar-se ao effeito àepm que se tra- «* 83 duz agora e não existia ainda ha pouco ? E', evidente- mente, uma força nociva e o instrumento será solicitado á balançar por // e pz, que são contrários, porém não directamente oppostos. O mesmo raciocínio é applicavel á todas as forças que pm, se afastem ellas para traz, para diante ou so- bre os lados. Nos encontramos, pois, nas condições da fig. 5 e nos achamos autorisados a affirmar: i.o que o effeito nocivo será tanto mais considerável quanto mais oblíqua fôr a direcção do esforço; 2.0 que o conselho clássico de puxar o mais paia traz possivel é absurdo. Em resumo, por causa dos erros, ainda geral- mente em credito, nós pretendemos demonstrar ri- gorosamente: 1.0 que não se pode nunca tirar sobre os cabos; que é preciso tirar sobre a arti- culação; 2.0 que é preciso que a direcção da força passe pelo centro de figura do craneo, e, finalmente, 3.0 que no estreito superior, o forceps ordinário mesmo o melhor dirigido, produz ainda compressões». Tarnier, inspirado nestes princípios do professor Hubert (de Louvain) e no de Chassagny, também pro- vou, de modo claro e evidente, a compressão que soffria a parte posterior do púbis, esforço perdido e prejudicial produzido pela decomposição da força que o parteiro empregava nas tracções directas sobre o forceps clássico. Esta demonstração vem mais uma vez tornar palpável a inconveniência de tirar segundo o eixo desse instrumento. Talvez abundemos em considerações tendentes a demonstrar o prejuízo das tracções directas no forceps curvo de typo Levret, porém é tal a firmeza da convicção de certos práticos e tal a importância do assumpto que 84 entendemos dever insistir nelle; é o que vamos fazer, transcrevendo a demonstração do professor Tarnier: «Todos os parteiros, diz Tarnier, sabem que, em uma applicação do forceps, para que as tracções sejam bem feitas, devem ser, o mais possivel, dirigidas segundo o eixo da bacia; porém todos confessam que, no estreito superior e acima desse estreito, é impossível tirar bas- tante para traz porque o instrumento está necessaria- mente collocado, pela resistência do perineo, em uma direcção má. Eu irei mais longe, assegurando que ao nivel do estreito inferior e do orifício vulvar as tracções são sempre mal dirigidas quando nos servimos do forceps ordinário pela mesma razão da forma do instrumento, seja elle de ramos cruzados ou parallelos. Facilmente demonstrarei o que acabo de enunciar. A figura 8 representa um corte da bacia e do peri- neo desenhados conforme a estampa i8,a do Atlas de Anatomia cirúrgica homolographica de Legendre; unica- mente, todas as partes molles comprehendidas entre o bordo posterior do sphincter anal e o púbis foram sup- primidas e os ramos do forceps passam um pouco atraz do ponto que, na estampa de Legendre, é occupado pelo ânus. Não se poderia pois em uma applicação de forceps praticada no estreito superior e na mulher viva, ainda quando se deprimisse fortemente o perineo, levar os ramos do forceps mais atraz do que eu indiquei na figura, (fig. 8) A linha SP descripta do promontorio ao púbis, que ella toca a alguns millimetros abaixo do bordo su- perior da symphyse pubiana, representa o diâmetro autero-posterior, minimum, do estreito superior. 85 E' este diâmetro, bem descripto por Pinard, que ordinariamente detém a cabeça do feto quando a bacia é viciada; e eu suppuz (fig. 8) o forceps applicado sobre ella, acima do estreito superior; porém, afim de não complicar a prova graphica, não figurei esta cabeça, cujo centro corresponderia, mais ou menos, ao ponto A. A li- nha AB representa o eixo do estreito superior ou da a- Fig. 8 bertura que a cabeça deve atravessar, e por conseguinte a direcção que seria necessário dar ás tracções para que ellas fossem correctas: Pelo contrario, as tracções exer- cidas pelo operador, quando elle tira pelos cabos do forceps ordinário, se convertem em uma força que é re- presentada pela linha AF e a tracções não podem ser levadas mais para traz por causa da resistência do pe- rineo R. Suppondo que as tracções sejam de 20 kilo- grammas, o trabalho eífectuado para abaixar a cabeça será de 17 kilogrammas somente, emquanto que o púbis supportará uma pressão de 10 kilogrammas. Na verdade, representando a tracção de 20 kilo- 86 grammas pela distancia AM, se eu construir sobre esta linha AM o parallelogrammo das forças ADMN, veri- fico que a tracçãoAM se decompõe em duas forças: uma AD que abaixa a cabeça na direcção do eixo do estreito superior; a outra AN, representando uma pres- são nociva que veiu perder-se contra o púbis. Ora, as linhas AM, AD, AN apresentam entre si differenças respectivas de comprimento que são expressas, mais ou menos, pelos números 20, 17 c 10. Pode-se veri- ficar isso, medindo estas linhas especialmente sobre uma figura de tamanho natural como eu o fiz. Logo, tirando pelos cabos do forceps com uma força de 20 kilogrammas, representada pela linha AM obtêm-se o seguinte resultado: extrahe-se a cabeça na direcção AD com uma força de 17 kilogrammas, sof- frendo o púbis uma pressão de 10 kilogrammas. Esta pressão é duplamente nociva; por um lado ella comprime o púbis, por outro augmenta a resis- tência que a cabeça oppunha aos esforços de expulsão». Do exposto resulta que esta má direcção das trac- ções representa um papel etioíogico importante nas lesões graves que muitas vezes se observam na bacia, depois de uma applicação laboriosa. Chassagny, em uma memória publicada em 1864 (i),chegou a consideral-a como podendo determinar a ruptura das symphyses. Este exaggero do illustre par- teiro de Lyon soffreu enérgico protesto de Berne, Delore, Bailly, Putegnat e Villeneuve. Delore chegou mesmo a realizar experiências que demonstraram ser possivel exercer-se tracções com uma força de 200 kilogrammas sem temer a ruptura. 11) Chassagny—D« Ia rupture des symphyses—Lyon—1864. 87 Chassagny respondeu que sabia perfeitamente que as rupturas das symphyses em uma applicação de for- ceps seriam um acontecimento em obstetrícia, porém que o interesse de um assumpto não depende somente delle, mas sim dos phenomenos que o precedem e de que elle não é, por assim dizer, senão a expressão mais adiantada. Entre uma simples distensão das symphy- ses e a ruptura dellas, ha uma serie de gradações a co- meçar pelas contusões mais ou menos profundas das partes molles, do utero, da bexiga, da urethra; as gan- grenas mais ou menos extensas que podem ser a con- quencia remota; os despedaçamentos que freqüente- mente são a conseqüência immediata. Conclue Chas- sagny: «e quando se negar a etiologia da ruptura das symphyses será negar ao mesmo tempo a de todas as lesões que eu acabo de enumerar, será mostrar a neces- sidade de estudar a fundo as conseqüências de uma direcção viciosa da força empregada pelo parteiro». Convinha remediar todos estes inconvenientes produzidos pela pratica viciosa que longamente temos referido, e, como vimos, dependendo exclusivamente da tracção não ser feita na direcção do eixo da bacia. A causa era portanto conhecida; corrigindo-a, seus effeitos necessariamente cessariam. De duas espécies foram os meios de correcção apon- tados pelos parteiros: modificações na manobra'operatoria e modificações do instrumento; dessas ultimas nos occuparemos mais adiante. O professor Hubert amarrava uma toalha na ar- ticulação do instrumento e entregava-a a um ajudante encarregado de puxar sobre este laço emquanto elle sustentava os cabos. 88 Chailly collocava-se de modo a poder fixar os cabos sobre a espadua, exercendo a força com as duas mãos na articulação. Cousot, de Dinant, encon- trando resistência séria, applicava o joelho sobre a articulação do forceps, fazendo pressão com a força do corpo sobre esse ponto e sustentava os cabos de mo- . do a evitar o deslocamento delles. Em todos esses processos o instrumento é trans- formado em uma dupla alavanca inter-potente, achan- do-se o ponto de apoio nos cabos, a potência no lo- gar da articulação e as resistências nas colheres. Todos esses meios são máos, não precisamos demonstral-o, apenas os citamos como. curiosidades históricas. Stein foi o primeiro que, reconhecendo os incon- venientes do forceps de Levret, passava um cadarço pelas janellas do instrumento, com o qual elle exercia as tracções. Com esse modo de operar, elle approxi- mava mais a força do centro de figura do craneo do que com os meios propostos mais tarde por Hubert, Chailly, etc, sobre os quaes já fizemos referencia. Com o systema de Stein, a força é applicada mais ou menos no mesmo ponto em que o prof. Tarnier applica as hastes de tracção do seu forceps. Demais, quando fôr necessário, o forceps com o cadarço, pode ser utilisado como alavanca, tomando ponto de apoio no mesmo cadarço ou na mão do parteiro; neste ulti- mo caso os cadarços não embaraçam de modo algum- O professor Pajot, o mais ardente defensor do forceps clássico, assim se exprime em favor da sua causa: « O forceps permitte tirar em todos os casos, de uma maneira sufficiente para a pratica (cem mil 89 partos o attestam), nos eixos da bacia e das partes mol- les e nos casos os mais numerosos, na vulva e na exca- vação, o instrumento permittiria tirar absolutamente na direcção do eixo, se este eixo mathematico fosse conhe- cido do parteiro ». Este modo de pensar está de accôrdo com o se- guinte: «Tirar para baixo, diz Pajot (i), não quer dizer, como quasi todos os médicos o acreditam, tirar sobre todo o forceps para baixo, pendurando-se nos ganchos. Isso quer dizer — tirar de maneira que a extremidade superior das colheres desça para baixo e para traz, é a cabeça que é preciso tiraram baixo epara traz, mano- bra impossível de executar, tirando directamente os ganchos nesta direcção porquanto, assim se proceden- do, as extremidades das colheres se inclinam para bai- xo e para diante. Porém, se a mão esquerda tomar vi- gorosamente o instrumento perto da vulva e se os ganchos forem levados pela outra mão, primeiramen- te para baixo e um pouco para diante, depois, á por- porção da descida, cada vez mais para cima, a mão esquer- da só tendendo a abaixar as colheres até o momento em que as duas mãos possam ser levadas juneto aos cabos e tirar então levantando o instrumento pouco a pouco para fora, sem chegar nunca a deital-o sobre o ventre da mulher, se essa manobra fôr executada deste modo, nosapproximaremos de tal modo d.o eixo verda- deiro, que a sua realisação exacta seria de mui pouca vantagem ». O methodo operatorio do professor Pajot trans- forma o forceps em uma dupla alavanca inter-potente, (1) Pajot — Annales de gynecologie - 1877. VALft 11 90 elle é todo de intuição e dependerá necessariamente da habilidade e pratica do operador; satisfaz, sem ma- iores inconvenientes, as necessidades da clinica. Se essa manobra não consegue exercer as tracções exactamente segundo os eixos da bacia, os quaes por sua vez não são conhecidos com precisão, todavia, por meio delia, as tracções são feitas o mais approximada- mente possivel do eixo ideal. E' o que até hoje os autores têm conseguido ob- ter com as melhores modificações. O processo de Pajot pode portanto entrar em parallelo em essas modificações, sahindo vencedor de difficuldades que, como tractor directo, o forceps nem sempre poderá conseguir, como os factos assim o de- monstram. Se o instrumento, por essa manobra, não actúa como agente de tracção, actuará ao menos como agente de extracção, visto como elle faz descer a cabe- ça que se achava detida. A acção do forceps como alavanca é, pois, um excellente recurso de que dispõe o parteiro; para utili- sar-se delle não deve esquecer três factos dependentes deste mecanismo: 10 multiplicação da força, 20 dimi- nuição da extensão no caminho percorrido 30 escolha do ponto de apoio, sendo de muito maior vantagem tomal-o nas próprias mãos. Alguns parteiros têm aconselhado os movimen- tos de latteralidade; são evidentemente movimentos de alavanca. Actuando-se nestes casos na extremidade dos ca- bos, tem-se uma alavanca do primeiro gênero, porém cujo inconveniente está em ser o ponto de apoio na va. gina, d'onde a possibilidade de se produzirem lesões 91 graves, se o parteiro não tiver o cuidado de limitar a extensão desses movimentos. Em defesa do mecanismo da alavanca applicado ao forceps, juntaremos mais um documento que cresce de valor por ser fornecido por um adversário acerrimo do forceps clássico; nos referimos á opinião de Chas- sagny, que assim se exprime: « Pour le but final de 1'opération, pour 1'extraction de Ia tête ces mouvements (movimentos de alavanca) sont beaucoup plus utiles que li traction directe et que três souvent ils doivent réussir dans les cas oú 1'accoucheur, reduit au seule ressource de Ia force manuelle, aurait inévitablement échoué, même en s'adjoignant un ou plusieurs aides, tirant á peu prés dans Ia direction de 1'axe du bassin, par 1'intermédiaire de lacs attachés au forceps (i) ». Rotação artificial. — Acontece muitas vezes que a cabeça fetal deixa de executar o terceiro tempo do me- canismo de parto, ito é, a rotação, em virtude da qual o occiput vem collocar-se debaixo da symphyse pu- biana; nestes casos o parto retarda-se e mesmo ás ve- zes não se pode dar espontaneamente. A ausência desse movimento constitue para alguns parteiros indicação para a intervenção pelo forceps. O parto podendo ser feito com desprendimento do occiput para traz, simplesmente com os auxilio da natureza, a intervenção só deverá effectuar-se quando condições de saúde da mulher e do feto a reclamarem é esta a opinião quasi geralmente admittida. Uma vez indicado o forceps, alguns autores aconselham produ- zir a rotação da cabeça com esse instrumento; outros (1) Chassagny -- Méthode des tractions soutenues — 1872. 92 condemnam esta pratica e desprendem a cabeça com o occiput para traz. Esta questão tem sido uma das mais discutidas e ainda hoje constitue assumpto de importância que jus- tifica certos detalhes em que vamos entrar. A rotação pelo forceps se tornou regra nas mãos de Dépaul, Joulin, Bailly, Blot, Tarnier e seus discí- pulos, sendo também preconisada nos livros de Char- pentier e de Poullet. Ella é absolutamente rejeitada por Velpeau, Ncegele, Caseau** Chailly,. Stoltz, Chas- sagny, Grenser e muitos outros. O professor Pajot tenta pratical-a, não conse- guindo immediatamente, abandona-a. Os parteiros que proscrevem a rotação artificial, justificam o seu modo de pensar dizendo que o feto não poderia supportar sem perigo uma torsão do pescoço, achando-se o tronco immobilisado pela contracção ute- rina; torsão que ás vezes é de meia circumferencia e apontam como conseqüências a luxação atloido-axoidéa, a compressão da medulla, além de que nos casos difficeis a rotação não se executaria sem o emprego da violência, o que seria desastroso; nos casos fáceis consideram-na completamente inútil, visto como a cabeça opera essa rotação mesmo entre as colheres. Os que defendem a rotação instrumental apoiam- se nas experiências de Tarnier, Ribemont e de alguns outros parteiros. O professor Tarnier, pelas experiên- cias que realisou, chegou aos seguintes resuhados: «Resulta, com effeito, das numerosas experiências que fiz em cadáveres de recém-nascidos que, quando se faz a cabeça executar uma rotação de meio circulo e que se traz o mento ao nivel do dorso e por con.se- 93 guinte o occiput ao nivel do sternum, mantendo as es- paduas immoveis, este movimento não se passa so- mente na articulação atloido-axoidéa, porém, em toda a extensão da região cervical e de uma parte da região dorsal, cujas vertebras se torcem em espiral. Esta ex- periência não pode ser realisada sem o desprendimento de uma força considerável afim de que a cabeça execute uma rotação tão extensa, e, comtudo, uma dissecção minuciosa não revelou-me lesão alguma apreciável' no rachis ou na medulla. Dir-se-ha, porém, se as vertebras se torcem, o ca- nal rachidiano deve achatar-se e comprimir a medulla. Para refutar esta objecção emprehendi outras ex- periências nas quaes substitui a medulla por uma co- lumna liquida que podia refluir para um tubo de vidro collocado no exterior. Toda a compressão do canal rachidiano fazia o liquido subir no tubo, emquanto que, executando uma semi-rotação da cabeça, o liquido permanecia im- movel. Como contra prova, flexionava fortemente a ca- beça e o liquido refluía immediatamente no tubo. Confesso que não esperava esse resultado, entre- tanto, elle convenceu-me de que a rotação exagerada expõe menos a compressão da medulla do que uma flexão tão considerável como a que se é obrigado a produzir para desprender o occiput para traz, nas posi- ções posteriores. Está bem claro que, nesta comparação, só tive em vista a compressão propriamente dita do canal rachi- diano». Ribemont, praticando novas experiências neste 94 mesmo sentido, veríficou e tornou mais completos os resultados obtidos por Tarnier. Depois de ter feito congelar fetos dispostos de maneira que o mento correspondesse ao dorso e o oc- ciput ao sternum, elle praticou cortes horizontaes em differentes pontos da columna vertebral e cortes ver- ticacs na linha mediana. Ribemont, por este meio, chegou a verificar as seguintes particularidades: «i.o Assim como tinha visto Tarnier, a torsão do pes- coço se reparte por toda a extensão da columna cer- vical e pelas 6 ou 7 primeiras vertebras dorsaes. 2.0 Longe de passar-se exclusiva ou principalmente ao nivel da articulação atloido-axoidéa, a torsão não é mais pronunciada para as primeiras vertebras cervicaes do que para as ultimas; 3.0 Em nenhum ponto ha de- formação nem achatamento do canal rachidiano; 4'Q A medulla oecupa o centro desse canal. Ella não está, portanto, exposta á compressão alguma, porém soffre uma torsão sobre o seu eixo, parallela á que soffrem as vertebras». Se é verdade que essas experiências demonstram que o feto nada soffre, todavia ellas não nos dizem se os interesses da mulher serão resguardados na pratica dessa operação. A ausência do movimento de rotação interna na maior parte das vezes é devida á falta de flexão da ca- beça ; acontece não raramente que depois da adaptação das colheres o parteiro, actuando sobre o occiput, esta flexão se completa, dá-se a rotação e, não só a cabeça, mas também o forceps são expellidos pelas contracções uterinas. Outras vezes a rotação pelo forceps se faz com 95 tanta facilidade que a simples collocação das colheres inicia o movimento que se termina entre essas colhe" res ou mesmo antes da collocação da segunda colher, pelo simples despertar das contracções uterinas. Ha, porém, casos em que o parteiro esforça-se para converter a posição e nada consegue, tendo de resolver-se a proceder a extracção na posição pri- mitiva. E' este um facto confirmado pela obser- vação dos autores, entre os quaes Charpentier. Com- prehende-se que nestes casos difficeis o canal pelvi- genital deverá resentir-se dessas tentativas. Sendo, porém, praticada com a devida prudência, obdecendo-se ao methodo operatorio, a rotação arti- ficial nos parece uma operação acceitavel. Não poderíamos mesmo pronunciar-nos de outro modo,visto como já temos presenciado grande numero de vezes a pratica dessa operação na Maternidade cli- nica da nossa Faculdade, sem que delia resultassem nunca lesões dignas de nota para a mulher nem para o feto. A rotação instrumental necessita em. primeiro logar a insinuação completa da cabeça; se ella estiver collocada no estreito superior ou acima da excavação devemos trazel-a primeiramente á parte inferior da excavação. Depois de insinuada a cabeça, o par- teiro deve ter sempre em mente a curva do instru- mento com que opera. Muitos parteiros sabem executar perfeitamente esse movimento, porém, as condições mecânicas da rotação do forceps e o modo de exe- cutal-a facilmente foram sobretudo descriptos por Tarnier em uma communicaçâo feita ao Congresso de Londres. 96 Se o parteiro tentar imprimir um movimento ro- tatório ao forceps, segundo o eixo dos cabos, ou não o consegue, ou, empregando força, lesa gravemente os tecidos maternos. A razão de ser deste facto torna-se bem evidente pelo seguinte raciocinio: O movimento ao redor do Fig. 9 eixo dos cabos do forceps faz com que as~ colheres cujo eixo fôrma com o dos cabos um angulo obtuso,' se desloquem, descrevendo um arco (fig. 9) com raio 97 igual á linha AB, que representa a perpendicular tirada do bico das colheres á linha central dos cabos CD pro- longada. Ora, nós sabemos que esta linha AB mede a distancia do ponto B mais elevado das colheres, quando o instrumento repousar em um plano horisontal. Esta distancia é avaliada em o,mo88 para o forceps de Pajot e em o,mo67 para o de Levret. Logo, a circumferencia descripta pela extremidade das colheres terá para o for- ceps de Pajot um raio AB igual á o,mo88, ou um diâ- metro BG de o,mi76 e para oforeeps de Levret um raio AB igual á o,mo67 ou um diâmetro BG de o,mi 34; evi- dentemente são diâmetros maiores que os da excavação, a qual, despida de partes molles, não terá approxima- damente mais de o,mi20 de largura em todos os sen- tidos. Se, pelo contrario, este movimento de rotação tiver como centro o eixo EF das colheres, estas não se deslocam e a cabeça voltará facilmente em torno de seu eixo longitudinal; nestes casos, porém, o grande arco é descripto pela extremidade do cabo. Esse deslocamento dos cabos por translação, ne- cessário com todos os forceps curvos, é mais fácil de executar com o instrumento de Tarnier do que com qualquer outro, porque nelle tem-se um centro fixo, a parte media do punho, que coincide com a linha cen- tral das colheres, e um raio também determinado, a linha que vae do centro da trave de tracção á extremi- dade dos cabos ; tem-se pois os dados necessários para descrever um circulo invariável, ao passo que, no for- ceps clássico, tem-se de proceder por tentativas, quer exagerando o arco dos cabos, quer diminuindo-o. A noção desse arco exterior a percorrer pelo cabo VALO 13 98 do forceps é importante sobretudo quando a rotação deve ser extensa; cm uma posição O. I. D. P., por exemplo, as otrenidades dos cabos do forceps, já incli- nadas para a coxa (squerda da mulher, antes da rotação, devem ser levadas ainda, mais para a esquerda e para traz. Na posição mais commum, isto é, a cabeça achan- do-se em O. I. E A., a extremidade dos cabos parte da coxa esquerda, descreve uma curva de convexidade an- tero-superior e termina no plano mediano da mulher. Verifica-se nas posições posteriores que, depois de effectuada a rotação instrumental, depois que o occiput acha-se apoiado no arco anterior da bacia, que a con- cavidade da curva do forceps fica dirigida para a parte posterior; isto é, em sentido inverso á curva do canal pelviano, disposição evidentemente anormal. Os autores aconselham nestes casos extrahir-se a cabeça com o forceps assim mesmo invertido ou retirar-se o instrumento e fazer uma segunda applicação, sobretudo quando se trata de primiparas e quando a curvatura pelviana do instrumento é muito accentuada. Alguns parteiros, nas posições posteriores applicam o forceps de modo que, depois da articulação, elle fica invertido; executam a rotação, o instrumento toma então a disposição normal e deste modo extrahema cabeça com uma só applicação. Quando não conseguem desprender por esse meio o ovoide cephalico, praticam então as duas applicações a que nos referimos acima. Pelo que temos dito, facilmente se conclue que as difficuldades e inconvenientes da rotação artificial são principalmente dependentes da curva pelviana do in- strumento. Sob este ponto de vista os forceps rectos 99 são superiores aos curvos, maxime nas M. I. P., em que a rotação pelo forceps é de necessidade indiscutivel. § 1.° Liberdade de deslocação do forceps Quando, em 1861, Chassagny apresentou o seu forceps á Academia de Medicina de Paris, acompanhava este instrumento um apparelho destinado a substituir a tracção manual, produzindo uma força lenta e susten- tada. Para exercer as tracções por estes meios mecâ- nicos, Chassagny foi levado a investigar o ponto do forceps em que deveria actuar a força, e, por meio de experiências repetidas, verificou que os pontos situados nas extremidades dos cabos soffriam maiores desloca- ções na evolução do forceps do que os que se achavam mais juntos á cabeça; repetindo estas tentativas chegou a concluir que todo o systema gyra ao redor do centro de figura do craneo, isto é, de um ponto fictício que divide em duas partes eguaes todas as rectas que termi- nam na superfície; este ponto é o centro de gravidade do craneo, e então elle certificou-se de que: a força de extracção, para não embaraçar os deslocamentos úteis do forceps em todos os sentidos, deve ser inserida sobre o instru- mento, ao nivel do centro de figura da cabeça. Este principio é considerado pelos autores como um dos mais fecundos da obstetrícia moderna e con- stitue o padrão de gloria de Chassagny. Joulin, mais ou menos, na mesma época de Chas- sagny, fez também experiências para exercer as tracções independentes com um apparelho annexo ao forceps; elle não attingiu, porém, o mesmo gráo de perfeição 100 • mathematica, limitou-se a passar os laços pelas janellas das colheres. Chassagny, depois de ter comprehendido toda a importância de fixar a inserção da força ao nivel do centro de figura da cabeça, construio o seu forceps no qual a collocação dos cordões se faz em pequeno gan- cho, situado na parte media de uma haste transversa collocada nas colheres e presa aos dous gêmeos. Deste modo as forças, que estes laços representam, são inseri- das nas duas extremidades de uma linha que passa pelo centro de gravidade do craneo; sua resultante será, pois, applicada neste mesmo centro. A tracção sobre o centro de figura não tardou a ser adaptada aos forceps ordinários, não possuindo esta barra transversal. Para esse fim, Hamon, antes de ne- nhum outro, aconselhou a perfuração dos gêmeos an- terior e posterior de cada colher do forceps commum, ao nivel do centro de figura do craneo, afim de passa- rem por estas aberturas os laços para a tracção. Essa idéa foi realizada em 1875 por Laroyenne, cirurgião em chefe da Caridade de Lyon, e a descripção delia foi publicada no Lyon medicai desse mesmo anno. Laroyenne fez perfurar os bordos anterior e pos- terior de cada colher do forceps commum, no ponto correspondente ao centro da cabeça, amarrando nestas cavidades os cordões; desse modo obtinha o mesmo resultado que com a construcção de Chassagny; a re- sultante dessas forças passava pelo centro de figura Úo craneo. Os laços deviam ser confiados a um ajudante que representaria o papel de machina, cuja escolha seria, por conseguinte, indifferente. Este ajudante, sentado 101 em um logar inferior ao bordo da cama da parturiente, exerceria as tracções sob as ordens do parteiro, que sus- tentaria os cabos do forceps. As vantagens assignaladas por seu autor podem ser resumidas nas seguintes: evitar os inconvenientes da excentricidade de tracção; faculdade de tirar um dos laços quando for necessário operar um movimento de flexão ou de extensão da cabeça; poder sustentar os cabos e reprimir o impulso uterino, quando fôr neces- sária uma descida lenta e gradual; facilidade de obtenção de um forceps nas condições desejadas sem haver ne- cessidade de recorrer-se a um instrumento novo. Com os laços de Laroyenne e de Chassagny, quando a cabeça está no estreito superior e que se torna neces- sário exercer as tracções muito para traz, essa pratica é inexequivel, e si se tentar approximar o mais possivel do eixo deste estreito com os cordões, poder-se-ha lesar o perineo. O professor Poullet, reconhecendo estes incon- venientes, procurou removei-os pela adaptação dos cordões de Laroyenne a uma haste metallica, que vae reccbel-os na parte inferior da vagina. Esta haste, que tem a curvatura perineal, protege este órgão e corrige o desvio das tracções, terminando cm um cabo movei, que se colloca na mesma linha do eixo do estreito superior. Esta modificação que o professor Poullet fez ao forceps de Laroyenne, realiza todas as vantagens dos cordões do instrumento desse autor, sem os seus in- convenientes e também as vantagens da haste metallica de Hermann e de Tarnier. Já nos referimos ao valor clinico dos laços de 102 Laroyenne e de Chassagny; quando tratarmos do for- ceps de Tarnier nos occuparemos das vantagens e in- convenientes da haste metallica de tracção. O professor Poullet conseguiu ainda simplificar o processo de Laroyenne, quanto á applicação da força no centro de figura. Fez somente perfurar o gêmeo anterior de uma das colheres e o posterior da outra; assim applica as forças também na extremidade de uma linha que passa pelo centro de gravidade da cabeça, passando também a resultante por esse centro. § 2.° Modificações instrumentaes com o fim de obter unia boa direcção das tracções. Quando tratámos das questões relativas á direc- ção das tracções, nos servimos das demonstracções dos professores Hubert e Tarnier para provar que as tracções, feitas sobre os cabos do forceps de Levret, segundo a regra clássica, eram viciosas e que repre- sentavam um esforço que se decompunha em forças úteis e nocivas. Por essa oceasião, fizemos ver que as modifi- cações propostas pelos autores para corrigir essa má pratica variavam, conforme a maneira por que cada um delles encarava a questão; assim, uns pensavam que os resultados máos eram unicamente dependentes do methodo operatorio, neste numero achava-se o professor Pajot; outros julgavam que esses defeitos eram inherentes ao próprio instrumento, sobresahindo entre estes o professor Tarnier. Como conseqüência racional, duas tinham sido 103 as espécies de modificações—do methodo operatorio e do instrumento. Das primeiras já nos occupámos, restam-nos as segundas. Quem primeiro agitou esta questão com bases scientificas foi o professor Hubert, de Louvain, em 1860; desde então os trabalhos dos parteiros visaram alcançar a realisação instrumental do principio de uma boa direcção das tracções; porém, quem verdadeira- mente deu impulso a esta questão, e tornou-a um as- sumpto palpitante em todas as escolas obstetricas do mundo, foi o professor Tarnier, publicando aua me- mória em 1877. Este reavivamento de um objectivo que, se não havia sido esquecido, pelo menos lutava com a indif- ferença para manter-se na tona de uma certa actuali- dade, foi motivado pela reunião, em um só instru- mento, de idéas esparsas que até certo ponto mostra- vam-se em flagrante opposição. Tarnier reunio na mão do parteiro, como diz Poullet, os dous grandes princípios obstetricos, o de Hubert e o de Chassagny, quasi sem tirarão forceps commum as qualidades que nelle se encontravam. Antes de chegarmos ao instrumento de Tar- nier, passaremos revista rápida em alguns dos mais im- portantes forceps que o precederam. ForcepS de Hubert — O principio de Hubert—a di- recção das tracções deve coincidir com a linha que coustitue o eixo das colheres do forceps—era posto em pratica pela fixação de uma haste metallica na extremidade dos ra- mos do forceps, os quaes, a partir do ponto em que emergia a curva pelviana e em direcção á extremidade manual, eram curvos em sentido opposto, formando 104 a chamada— curva perineal, de modo a ficar o meio - desta haste na mesma direcção do eixo do estreito su- perior. Este professor servio-se ainda de um processo mais simples: prendeu uma haste também metallica á parte media de um forceps commum,verificando-se que a linha central do isthmo da bacia coincidia também com o meio deste cabo. Esses processos empregados-pelo professor Hubert satisfaziam rigorosamente, porém, somente no tocante á direcção das tracções; elles ti- ravam absolutamente a liberdade de evolução da cabe- ça, iam, pois, de encontro ao principio de Chassagny— a liberdade de deslocação do forceps, Forceps de Morâles—Alguns annos depois de Hu- bert, em 1868, José Morales apresentava á Acade- mia de Medicina da Bélgica o seu forceps de três cur- vaturas; elle baseava-se no mesmo principio de Hu- bert, seu mestre, para a construção deste instrumento. O forceps de Morales não é mais do que um forceps de typo Levret com a curvatura perineal, isto é, do collo da colher começava uma incurvação em sentido opposto á curva pelviana, de modo que o eixo das co- lheres ficasse na mesma linha recta que o eixo dos cabos. Este instrumento possue o mesmo defeito assi- gnalado ao forceps de Hubert, impede os movimentos livres da cabeça; além disso,Tarnier demonstrou que o eixo real das colheres se afasta do eixo dos cabos, o que é fácil verificar em um desenho deste forceps. Dar-se-hia, por conseqüência, com este instrumento a decomposição do esforço de tracção em força útil e nociva. Forceps de Tamler. — Em 23 de Janeiro de 1877 o professor Tarnier, cirurgião em chefe da Maternidade 105 de Paris, apresentava á Academia de Medicina a sua memória (i), cuja publicação, mczes depois, produzio notável sensação no mundo scicntifico. Já tivemos occasião de mostrar qual a theoria sobre que Tarnier baseava a construcção do seu for- ceps. Daremos uma ligeira descripção deste instru- mento que é o seu primeiro modelo e que foi depois abandonado por seu autor. Este forceps compõe-se de dous ramos cruzados, como o forceps de Levret, guardando entre si certo parallelismo e tendo uma curvatura perineal muito pronunciada, são os ramos de apprehensão. Na extremidade inferior das colheres articulam-se duas hastes metallicas que terminam-se em um punho transverso, são as hastes de tracção. Um parafuso, indo de um ramo de apprehensão ao outro, mantém as colheres cm contacto com a cabeça. Este instrumento, que é uma parte integrante do que se pode chamar o methodo de Tarnier, deu logar a uma interessante polemica entre o seu autor e o pro- fessor Pajot (2) e pode-se dizer mesmo que não houve jornal medico em França que não tivesse feito uma apreciação critica deste forceps. O professor Tarnier expõe em sua memória as vantagens do seu instrumento, que podemos resumir d 3 seguinte modo: 1.0 as tracções não terão necessi- dade de serem tão enérgicas, como com o forceps com- mum; 2.0 com o novo forceps, toda a força empregada arrasta a cabeça no eixo da bacia sem produzir com- (1) Deseription de deux nouveaux forcepi—par S. Tarni«r-1877. (2) Anuales de gynecologie—1877. t VALCt 13 106 pressão alguma sobre os tecidos maternos; 3.0 o novo forceps, tirando no eixo da bacia, a cabeça fetal nenhuma tendência tem a escapar-se das colheres; 4.0 o punho do novo forceps, sendo transversalmente dirigido, dá ás mãos do operador uma presa solida; 5.0 uma vez as colheres em contacto com a cabeça fetal, o parafuso de pressão as fixa, sem augmentar essa pressão pelos es- forços de tracção; 6.0 as colheres deste instrumento, sendo muito curtas e levantando-se por uma curva rá- pida, apprehendem a cabeça do feto sem excedel-a para baixo; 7.0 o novo forceps deixa á cabeça a liberdade de seguir sempre as curvaturas das vias genitaes; 8.0 final- mente, este instrumento é provido de uma agulha indicadora. A critica foi em parte attendida pelo professor Tarnier, e, se elle não abandonou a idéa de realisar estas vantagens por esse systema de construcção do forceps, pelo m mo?, no novo modelo, modificou a fôrma dos eleiru ntos constituintes desse instrumento. Pela descrirção que vamos apresentar do moderno forceps de Tarnier, vê-se perfeitamente que a fôrma das colheres, a fóirra cVs hastes de tracção, o punho trans- verso e os cabos de rpprehensão foram modificados; a curva perineal des rimos deappr.hen: ão foi abandonada e até mesmo o modo de operar em certas condições foi aperfeiçoado; assim, Tarnier em sua memória aconse- lhava proceder-se á ratarão artificial do seguinte modo: «Quando se quer produzir artificialmente esta rotação, é preciso ter o cuidado de executar esta manobra com os ramos de apprehensão e de tracção, reunidos na mão, porquanto si se tentassse fazer voltar a cabeça com o" auxilio único das hastes, porder-se-hia entortal-as». 107 NOYO forceps de Tarnier.—Este novo modelo foi apre- sentado pelo professor Tarnier ao Congresso de Lon- dres em 1881. Em rerumo, é um forceps commum com hastes de tracção,terminando em um punho transverso; as co- lheres são mais estreitas, as janellas menos longas. Nos ramos de apprehensão existe um parafuso que serve para fixar a applicação na cabeça; as hastes de tracção prendem-se nas extremidades das colheres por uma articulação movei e no punho, que também é movei, por meio de um ferrolho nelle existente. Cada uma destas hastes faz corpo com o ramo de apprehensão correspondente, do qual podem ser se- paradas, á vontade do parteiro. O comprimento deste forceps é de 42 centimetros, dos quaes 27 da articu- lação á extremidade das colheres; a distanciada da ex- tremidade das colheres á extremidade das hastes de tracção é de 25 centímetros. O afastamento dos bi- cos das colheres mede 2 centimetros, quando o instru- mento está articulado. A distancia entre as colheres, no ponto mais afastado, é de 7 centimetros como no forceps clássico. Uma das vantagens assignaladas 'pelo professo1" Tarnier neste forceps, é. poder fazer as applicações oblíquas na bacia. Elle pretendeu remover os inconve- nientes, que resultavam para a tracção, da collocação lateral dos cabos do forceps clássico, com o punho movei, que tem uma curvatura em virtude da qual as tracções são feitas precisamente no plano mediano do corpo. Esta vantagem, como diz mesmo Tarnier, não é ainda completamente satisfatória, porque, se a tracção I 108 é feita no plano médio do corpo, não é do mesmo modo exercida na direcção do eixo da bacia, por não poder este punho ser dirigido para traz até o ponto de- sejado. Tarnier propoz ajuntaruma articulação ao angu- lo do punho, de modo a corrigir este defeito. Com este novo instrumento, o professor Tarnier aconselha proceder diíferentemente, em relação á rota- ção artificial, do que o fazia com o primeiro modelo. Assim diz elle:«Si se fizer rodar os cabos do forceps ao redor de um eixo que os atravesse em todo seu cumprimento, assim como se faz infelizmente al- gumas vezes, a operação torna-se impossível, difficil e perigosa, porque as colheres tendem a descrever um cone, cuja base corresponde á extremidade dellas. Para produzir acertadamente a rotação artificial da cabeça, é necessário que o cabo do forceps descreva, para fora, um arco de circulo, afim de que as colheres possam gyrar na bacia em torno do eixo fictício que as atra- vesse.» Quando tratámos deste assumpto (Rotação artifi. f/tf/Jdemonstrámos que era este o uniromodo de proce- der com um forceps curvo e que, entre estes,o forceps de Tarnier ofíerecia melhor vantagem. . Neste novo forceps ainda é representado o prin- cipio de Hubert; bem que Tarnier tivesse supprimido a curva perineal dos cabos de apprehensão, elle toda- via, conservou-a nas hastes de tracção, de sorte que o meio do punho destas hastes corresponde á linha cen- tral das colheres. O principio de Chassagny, neste modelo de Tar- nier, assim como nos antigos, não é satisfeito por completo. A inserção da força de tracção não se faz 109 no centro de figura; as hastes metallicas, que repre- sentam esta força, articulam-se a 5 centimetros, mais ou menos, abaixo deste ponto. Além disso, os movi- mentos do forceps ao redor do eixo antero-poste- rior da cabeça são tolhidos pela desloção egual que as hastes de tracção imprimem ás colheres correspon- dentes. Se é verdade que no primeiro destes casos, segundo alguns autores, este pequeno afastamento da applicação da força tem pequena importância pratica, não é menos verdade que, sendo possivel obter-se a inserção da força rigorosamente ao nivel do centro de figura, este facto implica uma imperfeição para o in- strumento. O segundo caso, a privação dos movi- mentos em torno do eixo antero-posterior da cabeça, colloca o forceps de Tarnier, ainda sob este ponto de vista, em plano inferior aos forceps cuja força é inse- rida por meio de cordões. A utilidade destes movimentos é demonstrada quando se empregam as tracções mecânicas onde a liberdade do forceps é completa. Nessas condições vê-se, na maior parte das vezes, este instrumento incli- nar os cabos para uma das coxas da mulher, o que indica a descida mais rápida de uma das colheres. A mobilidade, nos dous sentidos, do punho das hastes de tracção permitte as rotações da cabeça. Este novo modelo conserva a agulha indicadora, denominação dada por Tarnier á extremidade dos cabos de apprehensão, a qual serve para guiar o parteiro. De ha muito, desde Chassagny, com a applicação dos cordões ao forceps, insensivelmente o operador acompanhava a posição do instrumento pelos cabos que, livres, descreviam a curva de descida; foi, porém, 110 o professor Tarnier quem primeiro, consignou o facto e por isso denominou esta parte do instrumento—agu- lha indicadora. Essa agulha indicadora foi uma das partes do antigo forceps vivamente atacadas pelo professor Pajot. Esse eminente mestre a julgava inútil, porquanto ella era impotente para guiar o parteiro, quando se tornava necessário, isto é, nos casos em que era preciso des- envolver força sem conseguir insinuar a cabeça; nos casos mais fáceis a agulha actuava quando o operador já se tinha guiado sem o auxilio delia. Pajot a consi- derava ainda inútil, attendendo-se aos conhecimentos suppostos em todo o pratico. As colheres deste forceps são muito estreitas o que não só deixa de garantir ao ovoide cephalico uma apprehensão firme, como também a pressão, que esse ovoide possa vir a soffrer, é nociva por ser transmittida por uma superfície limitada; facto este demonstrado pelas experiências de Delore e mais tarde confirmado pelas de Labat sob a direcção de Tarnier. (Vide Cap. II). O parafuso de pressão do forceps de Tarnier, tem necessidade de exercer uma compressão continua. E' este um facto nocivo contra o qual a maior parte dos parteiros protesta, allegando ser contrario ás leis da natureza, que actúa por intervallos, deixando um tempo de repouso, que tem por fim, segundo se acredita, permittir que o cérebro se accommode á com- pressão e que a circulação se restabeleça. D'ahi, dizem elles, vem a obrigação de imitar esta acção intermit- tente nas operações e reservar somente os esforços para a oceasião em que elles possam vir em auxilio das forças expulsivas naturaes. Este argumento, que deve 111 ser tomado em consideração, sob o ponto de visto phy- siologico, não é d'aquelles que podem invalidar o labimetro do forceps de Tarnier, desde que nos lem- brarmos que, a todo o momento desejado, pode-se suspender a pressão que elle exerce. E' sufficiente desapertar o parafuso no intervallo das tracções, para que o cérebro descance e a circu- lação se restabeleça; é o que os allemães denominam — deixar respirar a cabeça, manobra que elles praticam desarticulando o forceps. Outros autores, e entre elles o professor Poullet não vêm no parafuso de pressão grandes inconveni- entes; dizem elles, que este labimetro não exerce com- pressão, desde que o parteiro tenha o cuidado de não servir-se delle para apertar, mas unicamente para a ada- ptação, devendo para isso exercer a pressão primeira- mente com as mãos, pressão que é por elle perfeita- mente apreciada. Assim, dizem estes mesmos autores que este parafuso deve denominar-se—parafuso de fi- xação, porque elle não comprime, impede somente que as colheres escapem, i Esta fixação das colheres do forceps de Tarnier necessita de uma certa pressão, e ella se torna tanto mais necessária quanto mais difficeis de vencer forem os obstáculos, não certamente com o fim de reduzir o diâmetro comprehendido, mas para oppôr-se ao es- corregamento, que poder-se-ha produzir pelo grande esforço que actuará sobre as hastes de tracção. Ora, na maioria dos casos, estes obstáculos são creados pelos vicios de conformação da bacia, e entre estes os mais communs são os que dependem do rachitismo, que, como se sabe, deforma principalmente o angulo sacro- vetebral projetando-o para adiante, e diminuindo a 112 extensão do diâmetro antero-posterior do estreito su- perior. Nestas condições o diâmetro da cabeça opposto ao apprehendido pelas colheres, é que soffre reducção por parte do promontorio, e, como estas colheres estão fixas para não se escaparem, ellas não podem se afastar para compensar a diminuição do diâmetro reduzido e a cabeça, comprehendida neste circulo de ferro, só con- seguirá transpor o obstáculo á custa de lesões mais ou menos graves da caixa craneana e dos órgãos nella contidos. Os defeitos do parafuso de pressão, com- prehende-se, diminuem de gravidade, á proporção que menores se tornarem as difficuldades no sentido que figurámos. A apprehensão neste instrumento, como em todos os forceps cruzados, é variável conforme o volume da cabeça. Do estudo rápido que temos feito das vantagens e inconvenientes clínicos do novo forceps de Tarnier, conclue-se que elle ainda não satisfaz o desideratum da sciencia moderna, bem que o conjuncto instrumental possa prestar reaes serviços na pratica, como disso dão conta os factos referidos pelos professores Tarnier, Wasseige e outros. Entre nós, são poucos os parteiros que delle fazem uso; durante o tempo (dous annos) em que fomos interno da Maternidade da Santa Casa da Misericórdia, á cargo do Snr. Professor Feijó Júnior e em que freqüentámos, como alumno, a Maternidade clinica da nossa Facul- dade, não tivemos occasião de presenciar a applicação deste instrumento. / PBOPOSIÇÜES PROPOSIÇÕES CADEIRA DE PHYSICA MEDICA THEORIA DAS FORÇAS I Quando um corpo qualquer, sendo solicitado por duas ou mais forças, entra em movimento, demons- tra-se que elle se move sempre segundo a direcção da resultante dessas mesmas forças. II Se as forças actuarem em direcções contrarias, a resultante será egual em intensidade á differença exis- tente entre essas forças. III Por isso, na occasião do parto a porção do feto, que se apresenta, sendo impellida pela contracção ute- ro-abdominal e pela reação elástica e contractil do pe- rineo, segue a direcção do canal vaginal e com uma velocidade proporcional á intensidade relativa das duas forças contrarias. CADEIRA DE CHIMICA INORGÂNICA MEDICA DO MERCÚRIO E SEUS COMPOSTOS I O mercúrio é o único metal liquido nas condições ordinárias. 116 II Elle forma duas ordens de compostos bem dis- tinctos: os mercurícos ou no máximo, e os mercurosos ou no minimo. III Desses compostos destacam-se o proto-chlorureto de mercurio(calomelanos) e o bichlorureto de mercú- rio (sublimado corrosivo) que são diariamente empre- gados em medicina. CADEIRA DE BOTÂNICA E ZOOLOGIA MÉDICAS DA INFLUENCIA DOS VEGETAES I Os vegetaes, pelas suas raizes, haurem do solo grande parte de suahumidade e apoderam-se ao mesmo tempo dos productos últimos das decomposições or- gânicas que nelle se realisam. II Por outro lado as suas folhas, soffrendo a acção do sói, espalham na athmosphera sensível quota de oxygenio, melhorando ipso facto as condições de vita- lidade desse mesmo ar. III Elles são portanto, sem contestação, um factor be- néfico e purificador do meio no qual se acham collo- cados. CADEIRA DE ANATOMIA DESCRIPTIVA DOS ÓRGÃOS GENITAES DA MULHER I Os órgãos genitaes da mulher se compõem da vulva, vagi na, utero, trompas de Fallopio e ovarios. Ii7 II O corpo do utero, em sua superfície exterior, ap- presenta ao estudo uma face posterior, dous bordos lateraes, um bordo superior ou fundo do utero e três ângulos, dous correspondentes ás inserções das trom pas e um inferior continuando-se com a porção cer. vical. III As faces, bordos e ângulos do corpo do' utero li- limitam uma cavidade—a cavidade uterina, onde nor- malmente se desenvolve o óvulo fecundado. CADEIRA DE HISTOLOGIA DA ESTRUCTURA DO UTERO I O utero compõe-se de três túnicas: uma externa— serosa ou peritonial, uma media ou muscular e uma interna ou mucosa. II A túnica media é constituída por três camadas de fibras: uma interna comprehendendo fibras longitudi- naes e transversaes, uma camada media na qual as fi- bras apresentam uma disposição plexiforme e uma ca- mada interna composta, como o plano externo, de fibras transversaes e longitudinaes. III A túnica interna ou mucosa apresenta caracteres diversos, conforme pertence ao corpo ou ao collo de utero. 118 CADEIRA DE CHIMICA ORGÂNICA E BIOLÓGICA DA MORPHÍNA I A morphina é um dos principaes alcalóides do ópio, II E' uma substancia solida, branca, inodora, inalte- rável ao ar e de sabor amargo. • ni Dos seus saes, os mais empregados em medicina são o chlorhydrato e o sulfato. CADEIRA DE PHYSIOLOGIA DA MYOTILIDADE I Dá-se o nome de myotifidade á propriedade que têm os músculos de se contrahirem: é a contractilidade muscular. II Esta propriedade se manifesta não só nos mús- culos de fibras estriadas como nos de fibras lisas. III E' a contracção do utero e a das paredes abdomi- naes que, por ocasião do parto, expellem para o exte- rior o producto da concepção. CADEIRA DE PATHOLOGIA GERAL DA RECEPTIVIDADE MORBJDA I Para em um organismo qualquer se desenvolver 119 uma moléstia infecciosa é preciso que nelle penetre o agente especifico delia. II Este germen necessita, porém, para sua evolução que o organismo lhe offereça um meio favorável e sympathico de vitalidade. III E' á realisação desta condição essencial que se dá o nome de receptividade mórbida. CADEIRA DE ANATOMIA E PHYSIOLOGIA PATHOLOGICAS DA HYPERTROPHIA I Um órgão se hypertrophia quando apresenta em todas as suas partes um crescimento anormal, sem que seus elementos sejam degenerados ou invadidos por substancias estranhas á sua composição. II A hypertrophia é sempre a conseqüência de um exaggero na actividade do movimento nutritivo, com predominância da assimilação sobre a desassimilação. III Sua causa mais habitual é a superactividade func- cional. CADEIRA DE CHIMICA ANALYTICA E TOXICO- LOGICA MANCHAS E ANNEIS ARSENICAES E ANTIMONIAES I Para a pesquiza do arsênico e do antimonio é em- 120 pregado o apparelho de Marsh que revela qualquer porção, por minima que seja, destes metalloides. II O chlorureto de cálcio faz desapparecer facilmen- te as manchas arsenicaes ao passo que deixa intactas as antimoniaes. III Aquecendo-se o arsênico em um tubo, o annel ar- senical se desloca por causa da volatilidade desse me- talloide, emquanto que o annel antimonial conserva-se fixo. CADEIRA DE CLINICA DERMATOLÓGICA E SYPHILIGRAPHICA DO TRATAMENTO HYDRARGIRICO I A cura dos accidentes secundários da syphilis pelo mercúrio é um facto de observação diária. II Ainda que estes accidentes desappareçam indepen- dente de qualquer medicação, é comtudo conveniente o emprego da medicação hydrargirica, para prevenir ou pelo menos attenuar os accidentes terciarios. III E' de rigor só empregar o mercúrio emquanto durarem as lesões, para não se produzirem phenome- nos de açcumulação medicamentosa. 181 CADEIRA DE PATHOLOGIA MEDICA DA ANKYLOSTOMIASE I A ankylostomiase é uma moléstia parisitaria, pró- pria aos climas quentes, devida á presença, no tubo intestinal, do dochmius ankylostoma. II Os anthelminticos constituem a base do seu tra- tamento. III Os tônicos e reconstituintes só têm utilidade de- pois da expulsão do parasita. CADEIRA DE PATHOLOGIA CIRÚRGICA DA INFLAMMAÇAO I A historia natural da inflammação só começou a ser verdadeiramente conhecida depois da descoberta e applicação do microscópio ás sciencias. II • O estudo microscópico dos phenomenos determi- nados pela irritação em um ponto, veio esclarecer bas- tante os phenomenos da inflammação. III Mas, a verdadeira interpretação desses phenome- nos só foi dada depois da analyse dos exsudatos inflam- matorios, o que foi para Cohnheim uma de suas maio- res glorias. TÍ.L. 18 199 CADEIRA DE MATÉRIA MEDICA, PHARMACO- LOGIA E ARTE DE FORMULAR DOS PÓS I Os pós são fôrmas medicamentosas resultantes da divisão de corpos sólidos em partículas tênues. II Elles podem ser simples ou compostos. III As substancias que não absorvem humidade são as que mais convém a essa forma pharmaceutica. CADEIRA DE CLINICA PROPEDÊUTICA DA AUSCULTAÇÃO CARDÍACA I Ha pontos determinados da caixa thoraxica em que se ouvem com mais clareza os ruidos produzidos pelos batimentos cardíacos. II Esses pontos de escolha, chamados focos de aus- cultação, são em numero de quatro e correspondem aos quatro orifícios existentes normalmente no órgão cardíaco. III Quando se quer chegar a um diagnostico preciso sobre uma lesão assestada em qualquer destes orifícios, é mais conveniente empregar o stethoscopio que deter- mina melhor a sede e o limite do ruido que tal lesão ocçasiona, 123 SEGUNDA CADEIRA DE CLINICA CIRÚRGICA DO TRATAMENTO DAS FRACTURAS I O tratamento das fracturas expostas differe do das fracturas sub-cutaneas. II Nas fracturas sub-cutaneas basta immobilisar os os fragmentos ósseos. III Nas fracturas expostas, além da immobilisação, é neccessario que se faça a asepcia do foco e se proceda a curativos antisepticos da ferida. CADEIRA DE CLINICA OPHTHALMOLOGICA DA OPHTHALMIA PURULENTA DOS RECÉM-NASCIDOS I A ophthalmia purulenta dos recém-nascidos tem sua origem numa infecção produzida pela secreção das partes genitaes, sede de catarrho virulento. II E' quasi sempre, durante a passagem da cabeça do feto na vagina, que a infecção tem lugar. III Os casos de infecção tardia ou podem ser attribui- dos a mesma secreção vaginal ( quando a creança dor- me no leito materno ), ou podem provir de outra cre- ança affectida do mesmo mal. CADEIRA DE OPERAÇÕES E APPARELHOS DA OSTEOCLASIA E DA OSTEOTOMIA I Estas duas operações são praticadas para corrigi- 124 rem os desvios dos membros inferiores conhecidos pelos nomes de genu-valgum e genu-varum. II Ellas são, por assim dizer, rivaes e tanto uma como outra tem adeptos convencidos que procuram cada dia tomal-as mais seguras nos seus resultados. III Com o emprego do methodo antiseptico a osteo- tomia é preferível e deve sempre ser aconselhada. CADEIRA DE ANATOMIA MEDICO-CIRURGICA DA ANATOMIA DO UTERO I O utero é o órgão da gestação. II Está situado na excavação da bacia acima da vagi- na, abaixo das alças do intestino delgado, para atraz da bexiga e para diante do recto. III Na união do terço inferior com os dous terços superiores desse órgão, encontra-se um estreitamento que o divide em duas partes, o corpo e o collo. CADEIRA DE THERAPEUTICA DA MEDICAÇÃO REVULSIVA I São medicamentos revulsivos aquelles que, deter- minando uma irritação local, deslocam uma irritação mórbida. II Os revulsivos são rubefacientes ou vesicantes. 125 III Entre os primeiros acha-se a mostarda; a cantha- rida pertence ao segundo grupo. PRIMEIRA CADEIRA DE CLINICA CIRÚRGICA DAS LUXAÇÕES SCAPULO-HUMERAES I As luxações scapulo-humeraes são de todas as mais freqüentes. II Essa freqüência se explica pela pouca profundi- dade da cavidade glenoide, pela situação do braço e da espadua expostos a todas as violências externas e pelo comprimento da alavanca representada pelo humero. III As principaes variedades são : a luxação sub-cora- coidéa, a sub-glenoidéa, a intra-coracoidéa e a sub-espi- nhosa. SEGUNDA CADEIRA DE CLINICA MEDICA DA TUBERCULOSE PULMONAR I A hereditariedade e o contagio são dous grandes factores da tuberculose pulmonar. II A hereditariedade ora se traduz por manifestações precoces, ora por manifestações tardias. III Quanto á contagiosidade, é necessário que o indi- víduo contaminado esteja em estado de receptividade. 226 CADEIRA DE CLINICA PEDIATRICA DA MALÁRIA NA INFÂNCIA I Entre nós o paludismo se observa desde a primeira edade e pode-se mesmo dizer que é mais freqüente na creança que no adulto. II A intoxicação palustre na infância reveste-se dos mais variados aspectos e apresenta-se ás vezes tão mas- carada nas suas múltiplas formas que o diagnostico torna-se muito difficil. III Nas creanças menores de 2 annos a infecção palu- dica merece um prompto tratamento, porquanto o pe- ríodo cachetico n'ellas apparece com grande rapidez. CADEIRA DE HYGIENE DO ACCLIMAMENTO I Acclimamento é a faculdade pela qual o homem se adapta espontânea e permanentemente a clima di- verso d'aquelle em que nasceu. II Grande acclimamento se entende por aquelle que importa em mudanças rápidas e instantâneas feitas para climas muito differentes. III Pequeno acclimamento é aquelle que compre- hende as mutações pouco pronunciadas, feitas pela passagem de um clima paia outro quasi egual. 157 CADEIRA DE MEDICINA LEGAL DA DOCIMASIA PULMONAR NO INFANTICIDIO I A docimasia pulmonar é o meio mais seguro que tem o medico legista para verificar se o feto teve ou não vida extra-uterina. n De todas as espécies de docimasia a mais empre- gada é a hydrostatica que, na maioria dos casos, serve de prova decisiva em taes pesquizas. III Ha, porém, circumstancias que prejudicam e annul- lam o resultado de semelhante prova, devendo por isso o perito conhecel-as, afim de evital-as ou dar ao seu exame o competente valor. CADEIRA DE OBSTETRÍCIA MOVIMENTOS DE LATERALIDADE DO FORCEPS I Os movimentos de lateralidade do forceps foram estudados de uma maneira toda especial por Fehling, que procurou demonstrar que o instrumento actúa nesses casos como uma alavanca de dous braços cujo ponto de apoio, hypomochlion, muda a cada instante, permittindo assim á parte resistente, que se acha acima desse ponto de apoio, descer pouco a pouco e progres- sivamente. 128 II Esses movimentos prestam incontestavelmente assignalados serviços em um grande numero de casos. III Elles devem, porém, ser sempre limitados, execu- tados sem a menor violência e não execeder de um certo tempo. PRIMEIRA CADEIRA DE CLINICA MEDICA DA ARTERIO-SCLEROSE I A arterio-sclerose é moléstia muito commum e que constitue quasi exclusivamente a pathologia do velho. II Ella depende de causas as mais diversas, occupando o primeiro logar, na sua etiologia, a intoxicação alcoólica e os differentes estados diathesicos. III O prognostico desta affecção, quando ella chega ao período intro-arterial, é extremamente desfavorável. CADEIRA DE CLINICA OBSTETRICA E GYNECOLOGICA DA BACIA VICIADA I A bacia que apresenta anormalidade nos diâmetros recebe o nome de bacia viciada. II A anormalidade pôde correr por conta de au- 129 gmento ou de diminuição em alguns ou em todos os diâmetros. III O diagnostico da bacia viciada é obtido por meio», da pelvimetria. CADEIRA DE CLINICA PSYCHIATRICA E DE MOLÉSTIAS NERVOSAS DA NEVROSE DE BEARD I Na nevrose de Beard distinguem-se três fôrmas clinicas: cerebral, medullar e mixta. II Destas fôrmas, a mais commumente observada é a fôrma mixta. III O tratamento desta nevrose pode se resumir na seguinte triade: suggestão, tonificação e hydro-elecro- therapia. HYPPOCRATIS APHORISMI I Natura corporis est in medicina principium studii. (Sect. II, Aph. VII) II Si fluxui mulieri convulsio aut animi deliquium superveniant, malum. (Sect. V, Aph. LVI) III Mensibus copiosioribus prodeuntibus morbi con- tingunt, non prodeuntibus ab utero fiunt morbi. (Sect. V, Aph. LVII) IV Mulieri menstruis deficientibus, ex naribus san- guinem fluere, bonum. (Sect. V, Aph. XXXIII) V Mulieri in utero gerenti, tenesmum superveniens, abortire facit. (Sect. VII, Aph. XXVII) VI Mulieri in utero gerenti vena secta abortionem facit idque potissimum, si fcetus grandior fuerit. (Sect. V, Aph. XXXI) Visto.—Secretaria da Faculdade de Medicina e de Pharmacia do Rio de Janeiro, 14 de Outubro de 1896. O Secretario Dr. Antônio de Mello Muniz Maia. r í