¥- pq Eira- THESE DE i^ 2lga6tinl)ír|SItas Cima tftlljo EJ15- THESE APRESENTADA A FACULDADE DE MEDICINA DA RAHIA PARA SER SUSTENTADA E1ÜT07EMBR3 DE 1S72 POR éfflpaoàúnAo !£/)taà J&tw&z & PARA OBTER 0 GRÁO Süoutor cm íBeiririna* BAHIA Vypograpliiit de J. (; Tourinlto. 1872 FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA. DIRECTOR V0@lã-l9D!R[ãGir@R O Ex.rao Snr. Conselheiro Dr. Vicente Ferreira de Magalhães. ossns. DOUTOnns I.'ANNO. matérias que lbccionam Cons. Vicente Ferreira de Magalhães . \ Pnysic.a em geral e particularmente em suai l apnlicaçoi s a Medicina. Francisco Rodrigues da Silva.....Cbiinica e Mimralogia. Barão da Itapoun.........Anatomia descripliva- 2.* ANNO. Antônio de Cerqueira Pinto . , . . • Chimica orgânica. Jeronymo Sodré Pereira . ... . Physiologia. Antônio «ariano do homlim.....Itoianiru e Zoologia. Barão da Itapoan.........Repetição de Anatomia descripliva. 5.* ANNO. Cons. Elias José Pedroza......Anatomia geral epathologica. José de Góes Sequeira ....... Palhologia geral. Jeronymo Sodré Pereira......Physiologia. 4.* ANNO; Cons. Manoel Ladislíio Aranlia Dantas . Palhologia externa. Demetrio Cyriaco Tourinho.....Palhologia interna. Conselheiro Mathias Moreira Sampaio j P rcS.üaScTdu"8 de mulheres PeJadai c úe menlnni 8.» ANNO. Demetrio Cyriaco Tourinho ..... Continuação de Palhologia Interna. José Antônio de Freitas.......j A"*}(XKno"Pographica« Medicina operalorJa, Luiz Alvares dos Santos......Matéria medica, e therapeutica. 6.* ANNO, Rozendo Apriglo Pereira Guimarães . . Pharmacia. Salustiano Ferreira Soulo......Medicina legal. Domingos Rodrigues Seixas.....Ilygiene, e llisloriada Medicina. JoséAITonsode Moura........Clinica externa do 3.» e *.• anno< Antônio Januário de Faria......Clinica interna do 5.* e 6.* anuo. lgnacio José da Cunha.......I Pedro Ribeiro de Araújo......> Secção Accessoria, José lgnacio de Uarros Pimenlel. . .\ Virgílio Clymaco Damazio...../ Augusto Gonçalves Martins.....f Domingos Carlos da Silva......> Secção Cirúrgica. Antônio Pacifico Pereira .....1 Alexandre A(Tonso de Carvalho . . ./ Ramiro AfTonso Monteiro......> Secção Medica. Egas Carlos Muniz Sodré de Aragão . ,\ Claudemiro Augusto de Moraes t.aldas .- §3 A. & '< / \ / \ / \ / \ A \ / \ < / \ / \ / \ < / \ / \ / \ / \ / \ / \ / \ / \ / \ / \ / \ / \ / \ / \ / \ / \ / \ / \ / \ / \ K/K/$Z£^Í&^m$^/X/: AOS MEUS VENERANDOS E CARINHOSOS PAES ás maüiü© rcauutiro um rn^m wum&oxDs Á TODOS OS MEUS PARENTES Testemunho dos mais vivos e puros aflectos de meu coração. Prova de affeetuosa estima e amisade sincera. AOS MEUS SÁBIOS MESTRES Homenagem do respeitosa consideração e agradeciiuMM. Que juizo se deve fazer das injecções no curativo dos bydroceles? DISSERTAÇÃO NTES de entrarmos na apreciação do que hoje se deva pensar da efficacia das injecções na cura radical do hy- drocele, temos por conveniente fazer uma descripção succinta da moléstia, como também uma resenha dos diversos meios de que a arte se tem valido para a combater. gECÇâO I Do hydrocele em geral e seu tratamento Definição—Dá-se geralmente o nome de hydrocele a uma collecção de serosidade nas visinhanças do testículo, ou do cordão espermatico. Contam-se varias espécies de hydrocele: quando a serosidade occupa o tecido cellular subscrotal, dá-se ao tumor o nome de hydrocele por in- filtração, ou edema do escrôto; quando contida na cavidade da serosa tes- ticular, chama-se hydrocele da túnica vaginal; este pode ser também congênito, e, n'este caso, como se observa freqüentemente nas crianças, existe uma communicação entre a cavidade peritoneal e a d'aquella mem- brana, circumstancia que levou Chassaignac a dar-lhe também o nome de hydrocele peritoneo-vaginal; outras vezes pode existir também o der- — 4 — ramamento no sacco de uma hérnia, e é chamado, por isso, hydrocele herniario. Quando é o cordão espermatico a sede do derramamento, pode o hydrocele, ser ou por infiltração, ou enkystado. Ao tumor, porém, formado pela serosidade contida na túnica vaginal, é que mais geralmente se dá o nome de hydrocele. Etiolo.fjia—O hydrocele é uma affecção muito commum em qual- quer período da vida, e em qualquer clima; com tudo é mais freqüente na idade adulta, e nos climas quentes. Entre nós é esta uma das aífecções que continuadamente se observam na pratica: esta freqüência é devida, segundo o Sr.professor Saboia (1), a que, havendo quasi sempre uma transpiração cutânea muito abundante, se- guida de resfriamentos, em conseqüência das variações bruscas da tem- peratura, haja, por isso, uma irritação da túnica vaginal; e sendo exhalada para o seu interior maior quantidade de fluido do que o natural, e não sendo este absorvido na mesma proporção, resulte uma accumulação de serosidade, constituindo o hydrocele. Enlre as causas que podem perturbar o equilíbrio entre as funcções de secreção e de absorpção contam-se as lesões do escrôto, do testículo, do cordão espermatico e dos seus invólucros. Entre as causas immediatas podem ser enumeradas: as pancadas rece- bidas sobre o escrôto pelo exercício a cavallo; a pressão por muito tempo continuada, ou por um tumor na pelve, ou por uma hérnia inguinal; ou a pressão repentina produzida por um violento esforço muscular. As causas que com mais freqüência actuam atravez dos invólucros são: as contusões, a syphilis e a inflammação; observam-se, com tudo, nume- rosos casos, nos quaes nenhuma causa apparente, para o desenvolvimento d'esta affecção, pode ser reconhecida. Anatomia pathologica—O liquido do hydrocele é ordinaria- mente límpido, transparente, de uma cor citrina ou amarellada, contendo alguns flocos alburoinosos; é de um peso especifico de 1020; coagula pelo calor, e pela addição do ácido nitrico. Algumas vezes este liquido é totalmente turvo; outras branco da cor de leite. Vidal, de Cassis (2), cita um caso de hydrocele leitoso, ao qual deu o nome de galactocele. (1) Lições de clinica cirúrgica em Í867 e 1868. Rio de Janeiro, pag. 164. (2; Trai té de pathologie externe, o vol. 1861, pag. 181. — 5 — Em conseqüência de contusões, o fluido é, muitas vezes, de uma còr vermelha, ou mesmo escura, similb inte á do chocolate, segundo a quan- tidade de sangue que contém; porem n'este caso a moléstia não é propria- mente um hydrocele, e sim um hematocele. Uma grande quantidade de cholesterina é, algumas vezes, encontrada no fluido, quando os indivíduos não são muito moços: esta substancia apresenta a apparencia de palhetas douradas, brilhantes, sobre a superfície da serosidade. A quantidade do liquido é variável; geralmente de 180 a 240 grammas; a maior quantidade que achou Curling (I) foi de 1,440 grammas, o Dr. Saboia (2) de 60 a 720 grammas. Dujat (3) em mil casos observados em Calcuttá, achou em um terço d'elles 6U0 a 1400 grammas, e em 18 de 1800 a 3000 grammas. O Dr. Silva Lima extrahiu de um an- tigo hydrocele 5,525 grammas de serosidade. O Dr. Meachem relata no New-York Medicai Journal um hydrocele, causado ha vinte cinco annos por pancadas recebidas sobre o escrôto, do qual extrahiu em seis pun- cturas, feitas no espaço de três annos, cerca de 5 1/2 littros em cada uma d'ellas (4). Astley Cooper (5) refere que Cline extrahiu de um hydrocele do celebre historiador Gibbon 7 littros de liquido. Boubson (6) de Montpel- lier, em Fevereiro de 1866, tirou de um hydrocele de um homem de 52 annos 16 littros; e feita uma nova punctura em Dezemhro do mesmo anno extrahiu 26 littros; chamou-lhe, por isso, hydrocele de Gibbon. A túnica vaginal encontra-se, em geral, em perfeito estado; outras vezes mais ou menos espessa, e até ossitieada. Os testículos estão quasi sempre entumescidos; comtudo algumas vezes acham-se um pouco diminuídos de volume pela compressão que exerce o liquido sobre elles. A pelle é tensa e sem alteração, offeiecendo apenas, em hydroceles an- tigos, algumas veias varicosas. Symptoinatolofiia—Os symptomas typicos são: tumor do eserôto, a maior parte das vezes limitado a um só lado. O tumor, geralmente, (1) Trailé pratique des maladies du testicule, du cordon spennalique, et du scrolum. Traduzido por Gosselin 1857, pag. 98. (2) Obra cit. pag. 166. (3) Nélaton. Elémenls de pathologiecirurgicale, 1859. 5 vol. pag. 607. (4) Med Times and Gazet. 187-2, pag. 589. (5, Observations on the structureand disease ofthetestis, pag. 251. (6J Med Times and Gazet. 1867, pag. 514. — 6 — apresenta a forma pyramidal, cuja base fica para baixo e o vértice para o annel inguinal: a pelle que cobre o tumor conserva sua côr natural, po- rém, em conseqüência de estar muito tensa, todas as rugas característi- cas desapparecem. Manipulando este tumor acha-se que elle é elástico, liso e indolente, não diminuindo debaixo da pressão, nem mesmo na po- sição horisonlal: ao mesmo tempo, pela percussão, sente-se um movimento ondulatorio característico das collecções serosas. Examinando este tumor em um quarto escuro, por meio da luz artificial, vê-se que, em geral, elle é transparente, excepto no ponto occupado pelo testículo. O tamanho e o peso são correspondentes á quantidade de liquido que elle contem. Idiaifiiostico—Os signaes característicos que distinguem o hydro- cele das affeccões que ofíerecem com elle algumas similhanças são: l.a sua transparência, que em numerosos casos é um dos meios seguros de diagnostico; 2.a sua flucluação distincla e extensa; 3.a o ponto de partida da moléstia, que começa na parte inferior da túnica vaginal, fazendo-se a accumulação gradualmente de baixo para cima. O hydrocele distingue-se das alterações do testiculo por seu pouco peso especifico, e pela ausência de symptomas graves, O hydrocele distingue-se da hérnia inguinal pela ausência de sympto- mas próprios a esta ultima affecção, como sejam a entrada do intestino para o abdômen, o som tympânico, a existência do testiculo no fundo do tumor; o hydrocele desenvolve-se debaixo para cima, e a hérnia inguinal de cima para baixo; e, alem disso, existem na hérnia symptomas geraes. Marcha—A marcha do hydrocele é geralmente lenta, entretanto hydroceles ha que adquirem excepcionalmente, em algumas semanas, um volume enorme. Terminação—Abandonado aos únicos recursos da natureza, o hy- drocele dura por muito tempo, até que o doente, pelo incommodo que lhe causa a moléstia impedindo-lhe o andar, as funcções genesicas, e a livre excreção da urina, em razão do penis estar envolvido pelo tumor, vè-se obrigado a submetter-se á evacuação do liquido por meio de um dos methodos de tratamento que a arte lhe pode proporcionar. Raras vezes o hydrocele tem desapparecido espontaneamente. Tratamento—Dividiremos o tratamento em medico e cirúrgico. tratamento medico—Consiste na applicação de loções estimulantes, fric- ções com iodo, ou com tartaro stibiado, ou com pomada mercurial, appli- cação de compressas embebidas em solução de chlorhydrato d'ammoniaco, — 7 — vesicatorios, compressão pelo collodio, uso dos purgativos, diureticos, e suduriíicos. Curling (1) reco.nmenda, com alguma vantagem, nos hydro- celes das crianças, a applicação da seguinte solução: Chlorhydrato d'ammoniaco.......30 grammas Vinagre distillado..........120 » Agoa..............180 » tratamento cirúrgico—Comprehende aincisão; a excisão; as escarifica- ções subcutaneas; a acupunctura; a cauterisação; electropunctura; as ten- tas; o sedenho; a punctura simples; a punctura, evacuação do liquido, e compressão; e as injecções diversas. D'elle nos occuparemos na seguinte secção, reservando as injecções para um capitulo especial, á vista da importância e extensão do as- sumplo. Do tratamento cirúrgico do hydrocele Inçisão—Este methodo é considerado um dos mais antigos. Consiste em dissecar com um bisturi convexo os tegumentos e mais túnicas do testiculo, camada por camada, até á vaginal; chegando a esta faz-se uma abertura na sua parte superior, por onde se introduz um dedo, ou antes uma tenta canula, que serve de conduetor a um bisturi abotoado, com o qual se fende o sacco em toda a sua extensão. Depois de se ter evacua- do o liquido procede-se ao curativo, que outrora consistia em cobrir os testículos com seus próprios tegumentos; porem Huntcr, tendo notado que assim se produziam apenas adherencias parciaes, e que o liquido se reproduzia, imaginou introduzir fios na cavidade para provocar assim uma inflammação geral, suppuração, e o desenvolvimento de botões carnosos. Astley Cooper (2) regeitava os fios por demasiado irritantes, e preferia insuf- flar no sacco a farinha de trigo; entretanto hoje os cirurgiões que ainda (1) Obra cit. pag. 116. (2) Obra cit. pag. 274. — 8 — preferem a applicação d'este methodo, costumam introduzir fios seccos, ou embebidos em vinho. Vários cirurgiões, como Wiseman, Cheselden, Heinster e Sharp expe- rimentaram este methodo, e sempre o tiveram por muito arriscado e doloroso. Excisâo—É um methodo considerado também muito antigo. Con- siste em abrir largamente o tumor, dissecar a túnica vaginal, puchal-a para fora com uma pinça, excisal-a com uma tesoura, poupando so- mente a parte posterior, que cobre o testiculo e o cordão espermatico. Em conseqüência dos resultados sempre graves que acarretava esta operação, foi ella por muito tempo deixada no esquecimento, até que em 1755 Douglas e Bertrandi a reviveram e preconisaram como um me- thodo útil no curativo do hydrocele. Boyer e Dupuytren modificaram este methodo, não abrindo o sacco senão depois de dissecado: alem d'isso, Dupuytren costumava, para abril-o, enucleal-o primeiramente, impellindo-o de traz para diante. Rinder-Wood modificou também este processo, introduzindo no tumor uma lanceta de forma pyramidal que, em razão de sua forma, fazia uma incisão maior nas túnicas externas do que na túnica vaginal; e, depois de evacuado o liquido, puchava a túnica vaginal com uma pinça, excisando com uma tesoura a maior porção que podia. Diz elle ter empregado em três casos este methodo, e ter sido bem suc- cedido; porem Titley, que o experimentou em seis casos, nenhum resulta- do favorável pôde colher. 13scarificaçocs subeutaneas—Sedillot e Legouest (I) conside- ram este methodo de pouco valor na pratica como meio radical, e somente palliativo: consiste em pungir o tumor com um tenotomo; o liquido in- filtra-se no tecido cellular, produzindo o edema do escrôto, edema que a reabsorpção faz desapparecer depois; o que não impede, todavia, que o hydrocele se reproduza. Acuniincliira—Lewis foi quem primeiro praticou este methodo: pungia o tumor com uma agulha de maneira que o liquido sahisse no mo- mento em que elle retirava o instrumento; o tumor assim desapparecia paulatinamente. Curling (2) adoptava este processo, e praticava-o com uma agulha de (1) Traité pratique de medicine opératoire. 1871 2 vol. pag. 510. (2 Obra cit. 124. — 9 - cataracta, introduzindo-a em dous oh três pontos differentes, e fazendo com que, por meio de um movimento rotatório entre os dedos indicador e pol- legar, esta agulha produzisse aberturas iguacs, tanto na serosa como nos tegumentos. A este respeito diz elle em sua obra:— « Ainda que os apologistas d'este methodo reconhecessem que elle não curava sempre, notaram, com tudo, que o tumor se enchia mais lentamente do que após a evacua- ção extemporânea por meio do trocate, e que, em alguns casos, não reap- parecia. » « Estes resultados concordam com os de minha própria experiência; pois, em alguns casos em que pratiquei este methodo, não foi senão ao fim de muitos mezes que o tumor reappareceu. Deve ser considerado como um processo útil a ajuntar aos meios de tratamento; porém não fará es- quecer o uso do trocate, porque este ultimo é mui pouco doloroso, mui simples e innocente em mãos hábeis, e, alem disso, tem a vantagem de dar um allivio mais prompto, e mais certo. > Cauterisaçao—O emprego do eauterio actual e potencial no tra- tamento do hydrocele é hoje completamente abandonado; EIse e Cline davam-lhe, porém, um valor extraordinário, e tinham-no em conta do melhor tratamento do hydrocele, devido isto, segundo Curling, aos pro- cessos mais bárbaros que se usavam antes d'este. Humphrey,deCambridge (1), usava introduzir na cavidade vaginal o oxido rubro de mercúrio, afim d irritar a túnica, e, conseguintemente, provocar uma suppuração, e a cura do hydrocele; porem, pouco tempo depois, achou que o oxido rnbro de mercúrio produzia uma inflammação maior do que a tinctura de iode, e em dous casos de sua clinica este tratamento foi seguido de salivação, o que fez com que elle abandonasse o seu em- prego. Ha alguns annos Maisonneuve, como já antes fazia Deffer, deMetz, em- prega, no Hotel Dieu, em Paris, em logar do oxydo rubro do mercúrio, o nitrato de prata, conforme o processo seguinte (2): « primeiro tempo—Punctura—Este primeiro tempo é praticado com rim trocate, que differe dos ordinariamente usados no seguinte: o tro- cate é destituído d'estilete, o qual é substituído pela extremidade da ca- (1) Holmes. A syslem ofsurgery, by variousauthors. 5 vol. 1871 pag. 93. (2) Gazeta Med. da Bahia. 1868, pag. 161- 2 — 10 — nula, que é cortada em bico de flauta, e que preenche ambos os fins dos trocates ordinários, isto é, de canula e de instrumento perfurante. Esta modificação do instrumento é própria de Maisonneuve. A vantagem que elle attribue a este trocate é d'annunciar ao operador a sua chegada á cavidade, pela sahida instantânea do liquido. « segundo tempo—Evacuação do liquido. « terceiro tempo—N'este tempo em vez de empregar a injecção de tinctu- ra de iode, Maisonnenve serve-se da cauterisaçao ligeira da túnica vaginal pelo nitrato de prata, a qual é feita da maneira seguinte: introduz na ca- vidade vaginal pela canula um simples estilete metálico, que leva em sua extremidade uma gotta de nitrato de prata solidificado, e movendo este em diversas direcções cauterisa vários pontos da túnica vaginal, até com- pleta dissolução da gotta de nitrato de prata. Feito isto, retira o estilete e depois a canula. —Como conseqüência d'esta cauterisaçao desenvolve-se uma inflam- mação idêntica á que é produzida pela linctura d'iode.» A respeito d'este methodo de tratamento de Maisonnenve diz o Sr pro- fessor Saboia (1): « não posso, em rigor, apreciar a vantagem, porque ainda não o empreguei em caso algum; mas o Dr. Alfredo Guimarães, que foi o primeiro entre nós a introduzil-o na pratica, o julga muito profícuo, e de resultado tão certo como o do tratamento pelas injecções. Se assim for, o methodo em questão terá, como este, a vantagem de livrar os doen- tes do desvio ou infiltração do liquido no tecido cellular do escrôto; mas receio que a modificação do velho methodo inglez não caia em esquecimento pela sua inferioridade, ou resultados duvidosos. » Elcctro-nuactwra—Sedillot e Legouest relatam um caso do hy- drocele em um homem de 54 annos, curado pelo Sr. Dr. Powel por meio da faradisação. (2) Tentas, eanulas e nieelias—Foi Salicet qnem, com o fim de determinar uma inflammação necessária á adhesão das paredes da túnica vaginal, pôz em pratica deixar permanecer um corpo extranho solido na cavidade, empregando para isto a canula do trocate; Hilden, em logar da canula, usava de uma mecha de fios; Larrey, depois de evacuado o liquido, costumava fazer passar atravez da canula do trocate uma sonda de gom- (1) Obra cit. pag. 205. (2) Obra cit. pag. 514. — 11 — ma elástica, que abi era conservada até que a inflammação se produ- zisse. Baudens emprehendeu um methodo muito similhante á este, o qual consistia em praticar com uma lanceta uma pequena incisão no tumor, introduzindo depois um trocate; este trocate differia dos que se usam ordinariamente em ter a sua canula três aberturas, uma em cada uma de suas extremidades, e outra na parte media; feita a punctura, e tendo sido o tumor atravessado de lado a lado no sentido de seu maior diâmetro, de sorte que a abertura mediana da canula correspondesse á cavidade vaginal, retirado o instrumento que praticou a punctura, e evacuado o liquido, Baudens, fundado nos diversos gráos de irritação da serosa nos differentes indivíduos, fazia injecções de fluidos de natureza diversa, sendo empregados primeiramente os de acção menos irritante, a saber: ar, água fria, água quente, água de Colônia, tinctura de iodo, álcool diluído, álcool puro, dando o intervallo de dois dias de uma para outra injecção, até con- seguir a irritação. Billot, qne viu Baudens praticar em sua clinica hospitalar este trata- mento, diz que elle era sempre muito longo, ainda mesmo nos casos em que se conseguia a irritação somente pelainsuílação de ar; porém se elle se via obrigado a lançar mão dos outros fluidos, então, além de muito longo e incommodo, os doentes corriam sempre imminente risco de vida, pela grande suppuração que se desenvolvia. Sedenho—Este methodo, attribuido aos Árabes, foi preconisado por Pott por ter sido mal succedido com o emprego dos outros methodos conhecidos no seu tempo. Consiste em fazer passar atravez das paredes do tumor, por meio de um estilête-agulha, um certo numero de fios de seda; d'isto resulta uma inflammação, que se termina por suppuração; e á medida que a tumefação diminue, vão-se retirando pouco a pouco os fios; esta diminuição effectua-se no décimo ou duodecimo dia. Green adoptou este methodo, modificando-o no espaço de tempo que os fios devem permanecer, afim de produzir a inflammação, para o que elle admittia serem sufficientes 24 horas. Curling empregou também este meio de tratamento do hydrocele nos casos em que a injecção lhe tem falhado, e resumindo sua opinião sobre elle diz: (1) « Achei, em geral, este processo seguro e pouco violento; com tudo tenho-o visto produzir uma viva in» (I) Obra cit. pag. 135. - 12 — flammação, que é impossível sustar, e que marcha rapidamente para a suppuração.» Chassaignac, em logar do sedenhode fios, introduz no tumor, por dupla transfixão, um tubo crivado, feito de gomma elástica (drainage). Simpson substituiu os fios de seda por fios metallicos, com os quaes disse ter obtido excellentes resultados; entretanto Gillepsie, que experi- mentara este meio curativo, foi sempre mal succedido, e, algumas vezes, o viu seguido de accidentes graves, pela grande suppuração que produzia. Punctura simples e evacuação do liquido—Esta ope- ração pode, algumas, bem que muito raras, vezes, ser seguida de cura. Geralmente não se emprega senão como um meio palliativo em indiví- duos pusillamines, ou nos casos em que são contra-indicados os methodos de cura radical. Quanto ao modo de executar esta pequena operação fallaremos em outro logar, quando nos occuparmos das injecções. Punctura, evacuação do liquido e compressão—O Sr. Messenger Bradley, de Manchester (1), pondera que a punctura sim- ples do hydrocele é, de ordinário, feita, ou na sala do banco de um hospital, ou no consultório do cirurgião; e que d'isto resulta quasi sempre ser a marcha do doente para sua residência, causa de uma inflammação consi- derável, e até perigosa, ou de um hematocele, não por ter sido ferido o testiculo com a ponta do trocate, mas resultante de uma hemorrhagia lenta, proveniente das veias escrotaes, que ficam turgidas, em conseqüência de sua posição declive. Em vista d'estes factos, e considerando também que as membranas pyogenicas agglutinam-se quando collocadas em firme e continuada ap- posição; e, ao mesmo tempo, que a túnica serosa do testiculo é, por sua natureza physiologica, susceptível de acção adhesiva; e pelo caracter da secreção do hydrocele ser o de uma moléstia inflammatoria e não hydro- pica, foi o Sr. Bradley levado a propor, para a cura do hydrocele, a sim- ples punctura, seguida da evacuação do liquido, e da compressão por meio de tiras agglutinativas. Em quatro casos, em que elle tentou este meio,obteve sempre os melhores resultados, com grande satisfação para os doentes, por não serem obrigados a interromper as suas occupações diárias, e sem risco algum proveniente do exercício de andar, o qual, ao mesmo tempo, concorria em parte para (1) British Med. Journal, pag. 580, 1872. — 13 — a cura. Em um d'estes casos, o hydrocele tinha-se convertido em hemato- cele; neste mesmo elle empregou a punctura e compressão do testiculo affectado por meio de tiras de emplastro de sabão, durante o espaço de três semanas, com o melhor resultado. Não obstante o bom êxito d'este caso, diz elle: « não sou inclinado a pensar que este meio venha a ser geralmente efticaz no tratamento do hematocele, e não o aconselho em taes condições » « Comtudo, a respeito do hydrocele, parece que temos, n'este plano de punctura e compressão, um d'aquelles que satisfactoriamente desempe- nham o propósito de curar com segurança, rapidez, e sem dôr; e, posto que talvez nem sempre infallivel, é um meio que deverá ser ensaiado em todos os casos (especialmente, accrescentarei eu, n'aquelles que forem tratados fora da casa do paciente), antes de se ter lançado mão da injecção de iodo, ou de outro estimulante. Havendo casos em que nem o meio que eu aconselho, nem o tratamento pela iujecção de iodo sejam efficazes, então sou de opinião que uma combinação dos dous meios poderá ser de mais decidida vantagem.» Como adiante veremos, esta ultima idéia já tinha sido posta em exe- cução pelo Sr. Voillemier. Do emprego das injecções na cura radical do hydrocele Das injecções em geral—A idéa de injectar um fluido na túnica vaginal, depois de evacuada a serosidade que constitue o hydrocele é de longa data; parece ter sido Celso o primeiro que a poz em pratica, servindo-se para isso de uma solução de nitro, que elle reputava o mais apropriado remédio. Tendo cahido em desuso, depois de sua morte, as injecções foram de novo aconselhadas e praticadas em diversas epochas, e particularmente por Lambert, medico de Marselha, em 1677; o liquido que elle empregava de preferencia era a água phagedenica. Monro, sênior, no meiado do ultimo século, concorreu também muito para popularisar este methodo — 14 — curativo, assim como Astley Cooper, e, ultimamente, Sir Ranald Martin, talvez o cirurgião que em maior escala o tem empregado na Índia. As matérias das injecções teem sido por extremo variadas, desde as mais brandas até ás mais irritantes; e quasi, se pode dizer, que de todas se tem dito bem e mal; até o ar atmospherico tem sido aconselhado em injecções na túnica vaginal; e o que é ainda mais extraordinário é que a pró- pria serosidade do hydrocele foi reinjectada no sacco de onde sahira! Seria longo enumerar todos os liquidos que teem servido para as injec- ções em diversas epochas, e por diversos práticos; além dos já mencio- nados, referem os livros clássicos os seguintes: a água fria ou quente; o leite, o chloroformio, e ether, o álcool; as soluções de chlorureto de sódio, de sulphato de cobre, de nitrato de prata, de potassa cáustica, de tannino, de perchlorureto de ferro, de sulphato de zinco; essência de therebentina, vinho, tintura de iode, etc, etc. Adiante nos occuparemos em particular das injecções que mais geralmente se empregam hoje, e procuraremos indagar quaes de entre ellas teem sido, ou estam sendo agora, mais fre- qüentemente utilisadas na cura do hydrocele. Operação O processo operatorio para injectar a túnica vaginal divide-se em duas partes: a punctura e conseqüente evacuação da serosidade, e a in- jecção propriamente dieta. O instrumento que serve para a punctura do hydrocele, quer se tenha o propósito único de 'evacuar rapidamente o liquido, quer se pretenda praticar em seguida a injecção, é um trocate e canula de medianas ou de pequenas dimensões, conforme o volume do tumor. Uma vez assentado o diagnostico, e verificada, quanto ser possa, a po- sição do testiculo, o operador abrange com a mão esquerda os tegumen- tos da face posterior do tumor, como se o quizesse espremer, tornando-os assim tensos anteriormente; com a mão direita segura o trocate, previa- mente untado de óleo ou de banha, mas collocado de modo que a ex- tremidade posterior do cabo se apoie na palma da mão, e o dedo indica- dor limite a porção da haste que deve entrar no sacco; depois, por um movimento rápido, faz penetrar o instrumento na face anterior do tumor, um pouco abaixo da sua parte media, não directamente de diante para — 15 — traz. mas um tanto obliquamente para cima, afim de evitar o ferimento do testiculo; logo que o operador sinta vencida a resistência da parede do sacco, e livre a extremidade do trocate no seu interior, retira um pouco o punção, e impelle a canula, que lhe occulta a ponta, até á conveniente profundidade; retirada então inteiramente a haste do instrumento, esgo- ta-se o liquido pela canula, que se retira quando se não pretenda fazer a injecção; no caso contrario, o mesmo operador, ou um ajudante adapta o bico de uma seringa que contem o fluido a injectar, á extremidade da ca- nula, e, por uma pressão lenta e continua, fal-o penetrar no sacco até o distender, ou até haver injectado a quantidade que julga conveniente; depois de demorar o fluido na túnica vaginal por alguns minutos, deixa-o escoar-se pela canula, no todo ou em parte; ou, retirando esta, deixa-o lá ficar, conforme o plano que adoptou,e a qualidade e quantidade da matéria da injecção. Quando esta deve ficar nointerkr do sacco, recommendam al- guns operadores fazer pressão sobre o tumor em diversos sentidos, com o fim de aporem contactocom toda a superfície da vaginal. Concluidaa ope- ração recommenda-se ao doente o repouso na cama, ou o uso de um sus- pensorio qne immobilise, quanto for possível, o escrôto. Accidcntes durante a operação e depois d'ella—Succe- de algumas vezes a operadores principiantes dirigirem o trocate muito obliquamente para cima, e insinual-o entre as túnicas do escrôto, em vez de o introduzirem na cavidade da vaginal; outras vezes acontece recuar a extremidade da canula, e ficar entre as mesmas túnicas; no primeiro caso não sahe liquido algum, e no segundo interrompe-se o seu curso; e, em ambos, é necessário praticar nova punctura. Outras vezes, por maior ha- bito e cuidado que tenha o operador, é ferido o testiculo, ou a artéria spermatica; accidentes que podem ter, e teem tido, muitas vezes, serias conseqüências, como sejam a inflammação e a suppuração d'aquella glân- dula, e a conversão do hydrocele em hematocele. O Dr. Silva Lima com- municou-nos um caso de sua pratica, no qual se deu este ultimo acciden- te: era o doente um homem de 60 annos, que tinha volumosas varizes venosas nas pernas, coxas e escrôto; a punctura havia sido praticada 6 vezes em 3 annos, pelo mesmo operador, sem oceorrencia notável; na 7.a porem, depois de evacuado o liquido em quantidade superior a um lit- tro, mal tinha o doente acabado de se vestir, e ia a retirar-se para sua casa, quando notou que o escrôto parecia, debaixo da roupa, quasi tão vo- lumoso como antes da punctura, o que se verificou descobrindo-o, e — 16 — examinando-o; isto, e uma syncope immediata não deixavam duvidas so- bre a existência de uma hemorrhagia na túnica vaginal; o tumor era já mais volumoso do que fora o hydrocele; trinta e seis horas depois esta- va negra, por embebição de sangue, a pelle do escrôto, do perineu, das nádegas, da parte superior das coxas, da pelve, e do hypogastrio. Em trinta dias nada mais restava de tudo isto senão um núcleo fibrinoso na túnica. O hydrocele não se reproduziu. É muito provável que o vaso ferido fosse uma veia varicosa profunda, inaccessivel á vista. Também se tem visto, algumas vezes, seguir-se á simples punctura a hemorrhargia externa, quasi sempre de pequena importância, e a inflam- mação do escrôto que, em alguns casos raros, tem chegado á suppuração, e até á gangrena. Este ultimo accidente já succedeu, segundo nos referi- ram, em um hospital de Paris, a uin notável cirurgião contemporâneo, após uma simples punctura exploradora, que teve por fim reconhecer a natureza do liquido, o qual era o do hydrocele commum. Pelo que respeita aos accidentes da injecção, elles são tamhem de di- versas espécies; o liquido pode ser derramado entre as túnicas do escrôto, ou porque a extremidade da canula tenha escapado do interior do sacco, ou porque pela própria ferida se escoe para fora d'elle a matéria da in- jecção, produzindo assim, em qualquer dos casos, uma infiltração que pode occasionar phlegmão, gangrena do escrôto, e ameaçar a vida do pacien- te. Estes mesmos accidentes consecutivos podem resultar nos casos em que é muito intensa a inflammação que a própria injecção provoca, mesmo quando todo o processo operatorio correu com toda a regu- laridade. As precauções que convém ter em vista para evitar os accidentes du- rante a operação, quer ella seja a punctura simples, quer seguida da intro- ducyão de um fluido na túnica vaginal, essas deprehendem-se da própria natureza d'esses accidentes; o muito cuidado, a attenção e o habito fa- cilmente as poderão suggerir. Quanto aos accidentes consecutivos, esses requerem um tratamento appropriado á sua natureza: o hematocele recente pode ser vantajosamente combatido por meios que activem a reabsorpção do sangue, como sejam as compressas embebidas em líquidos resolutivos, ou loções evaporan- tes, ou adstrigentes, etc. A inflammação excessiva e o phlegmão reclamam os antiphlogisticos geraes e locaes, e, algumas vezes, incisões largas com — 17 — o fim de dar sahida ao pus ou ao liquido irritante, infiltrado no tecido cellular, conforme os casos. Indicações e contra-indicaçoes—Dever-se-ba praticar a in- jecção indistinctamente em todo e qualquer caso de hydrocele? O bom senso cirúrgico, e as lições da pratica dos mestres dizem que não. Ha cir- cumstancias que contra-indicam o emprego das injecções, ou porque certos casos individuaes se prestem melhor, e mais vantajosamente a ou- tros methodos curativos, ou porque outras razões façam receiarcom funda- mento incommodos maiores do que a próprio moléstia, ou accidentes mais graves ainda, que compromettam a vida do paciente. A injecção é indicada nos casos de hydrocele simples, não complicado de outras affecções concomitantes dos órgãos interessados no tumor, ou na sua próxima visinhança, e principalmente em indivíduos moços, ro- bustos, e em bom estado de saúde geral; é indicada n'estas circumstan- cias, bem entendido, para aquelles cirurgiões que habitualmente adoptam, como pratica geral, este methodo de tratamento; e n'este ponto ha ge- ralmente accordo de opinião. Mas ha casos em que ha divergências de pensar, julgando alguns práticos opportuna, e outros inoppurtuna a injec- ção na túnica vaginal. Quando existe hydrocele duplo não querem alguns cirurgiões que se pratique a injecção simultânea de ambos os lados, receiando que a inflam- mação, por excessiva, occasione accidentes graves, aconselhando, toda- via, que se faça a punctura simples de um lado, e a punctura com injec- ção do outro, na esperança de que a inflammação consecutiva se exlen- da á bolsa não injectada, e produza a cura em um e outro lado. Este preceito parece baseado na prudência, e mais, talvez, do que no propó- sito de obter duas curas com uma injecção única. Mas a questão de inje- ctar ou não simultaneamente os dous lados fica ainda dependente de ou- tras circumstancias, como sejam o volume do hydrocele, e o tempo de que o paciente pode dispor para soffrer duas em vez de uma operação, circum- stancias que compete ao operador conciliar, até onde o permittam a se- guridade e interesse do mesmo paciente. Ha hydroceles tão volumosos que não podem ser injectados sem risco de graves accidentes; e se um d'estes hydroceles gibbonianos é, como quasi sempre succede, muito antigo, e occorre em um indivíduo muito adiantado em annos, melhor será contentar-se o cirurgião com praticar periodicamente a punctura simples, do que sugeitar tão dilatada extensão — 18 — da túnica vaginal e do escrôto a uma inflammação que, pela pouca vita- lidade d'estas partes, pcderá terminar em gangrena, e pôr em risco a vida. Mas se o caso não é extremo, como o que figuramos; se o doente, é ainda moço, e se depois de uma primeira punctura simples se observar que o escrôto conserva sua retractibílidade, pensam muitos práticos, que antes do tumor chegar ás primitivas dimensões, se deva fazer nova punctura se- guida de injecção, por ser então menor a área da inflammação conse- cutiva. A respeito do hydrocele congênito, mais commum nas crianças do que em adultos, variam as opiniões, quanto a saber se deve ser injectado ou não. Os cirurgiões que opinam contra a injecção fundam-se em que esta espécie de hydrocele desapparece espontaneamente, ou por meio de ap- plicações externas, e também no receio de que a inflammação se propa- gue ao peritoneu; os que a adoptam baseam-se em factos de injecções bem succedidos no hydrocele congênito, observando na pratica os con- selhos ds Velpeau, Desault, Gosselin, Guérin, e outros, que recommendam que antes e durante a operação se comprima fortemente o canal inguinal, para evitar que o liquido injectado penetre no peritoneu, sem receiarem, como Curling, e outros cirurgiões, que algumas gottas que escapem pro- duzam necessariamente conseqüências funestas. Algumas vezes coincide com o hydrocele a existência de uma hérnia inguinal do mesmo lado; isto, porém, não é motivo que constitua contra- indicação absoluta para a injecção; se a hérnia é reductivel convém fazel-a entrar antes de se proceder á operação que, assim mesmo, deve ser praticada com muita prudência e cautela. Nos casos em que o testiculo esteja affectado de moléstia orgânica, maligna ou não, mas ainda com mais razão se o for, não se deve injectar o hydrocele; em caso de duvida antes praticar a incisão, que permitte reconhecer o estado da glândula, e pode ser o primeiro passo para aextir- pação d'ella, se por outras razões não for contra-indicada, ou desnecessá- ria a castração. Ha também exemplos de hydroceles antigos em pessoas idosas, em què a túnica vaginal chega a adquirir uma consistência cartilaginosa, e até a ossificar-se. Comprehende-se facilmente a impropriedade das injecções em taes casos. Das injecções em particular—Seria por demais fastidioso, e sem utilidade pratica, tratarmos aqui extensamente de todos os fluidos que teem sido, - 19 — em diversas epochas, suggeridos, e empregados em injecções na cura ra- dical do hydrocele. Limitar-nos-hemos áquelles que tiveram, ou teem ainda hoje mais voga entre os mais notáveis cirurgiões, e especialmente dos que exercem a profissão nos paizes tropicaes, onde a moléstia é mais largamente observaua, e onde é, por conseguinte, mais vasto o campo da experiência, e mais authorisadas as deducções praticas. De outros fallaremos brevemente, e de passagem. Injecção de álcool—É antigo o emprego da injecção de álcool para curar o hydrocele. Foi primeiro usada por Monro no século passado; mas este cirurgião, em conseqüência das dores violentas que oceasionava este liquido aos doentes, substituiu-o pelo vinho; Gerdy também fez uso d'esta injecção; e Velpeau, embora a não empregasse ern sua clinica ha- bitualmente, não a reprovava; porém reputava-a mais fallivel em seus resultados do que a de vinho, sem a julgar mais irritante do que a deste liquido. Quanto á efficacia d'esta injecção variam as opiniões dos authores; uns a dizem muito proveitosa (Laugier e Ricord), outros aaecusam não só de ser muito morosa em seus effeitos, mas ainda de não impedira reproducção do hydrocele, e de dar causa a accidentes consecutivos graves (Bertrandi). O que é certo é, que a injecção alcoólica, regeitada pelo seu próprio ini- ciador, e adoptada mais tarde por outros cirurgiõos, tem tido raros sectá- rios n'estes últimos annos. Agora, porém, vemos que torna o álcool a ser empregado na cura do hydrocele, e de outras hydropisías pelo Sr. Monod, emprego quea imprensa medica não duvida em chamar novo methodo. (I) A novidade, porém, não está, bem se vê, na qualidade do material applicado, e sim no modo de sua applicação. Eis aqui como procede o pratico parisiense: Em logar de evacuar completamente a serosidade contida no tumor, e substituil-a por outro tanto álcool, mais ou menos, deixando-o também sahir depois de alguns minutos, o Sr. Monod tira pela canula uma pequena quanti- dade do liquido contido no hydrocele, e com uma pequena seringa injecta immediatamente um pouco de álcool rectificado (uma gramma, ou cerca de vinte gottas). O álcool, diz elle, mistura-se com o resto do liquido, e modifica-o de forma que o torna susceptível de ser absorvido. Esta pe- quena operação é repetida de oito em oito dias até desapparecer todo o (I) Medicai Record de Abril, e Med. Times and Gazet. de Julho de 1872. — 20 — liquido. As vantagens que o author attribue ao seu methodo são: ser mais aceiado, menos perigoso, e não obrigar o doente aos incommodos que occasionam as outras injecções, podendo elle entregar-se ás suas occupa- ções usuaes, o que não é indiíTerente para os homens de trabalho. O methodo adoptado pelo Sr. Monod parece que se limitta, por ora, á sua pratica, e, assim mesmo, em mui pequeno numero de casos. Injecção de vinho—Vimos que Monro abandonou a injecção de álcool para adoptar a de vinho; achando, porém, esta pouco irritante, ajun- tava-lhe um pouco de álcool, tornando-a assim mais activa. Esta injecção veio a ser de um uso quasi universal entre os cirurgiões, principalmente entre os francezes e inglezes, e ainda goza de muita acceitação por parte de alguns notáveis práticos contemporâneos. Roux, Gerdy, Blandin, Vidal, de Cassis, e outros eminentes cirurgiões foram apologistas da injecção vinhosa: e este ultimo chegou até a escrever, que é esta a operação em que mais se possa contar, e que nos casos em que ella falha é por culpa do cirurgião; não obstante reconheceu haverem casos, nos quaes, apezar de todos os cuidados possíveis, de toda a perícia do operador, podem resultar accidentes. O editor da 5.a edicção da obra de Vidal, de Cassis, o Sr. Fano julga também que as injecções do vinho são preferíveis as de iodo, e que produzem uma cura muito mais certa, e mais duradoura (1); Earle, Curling e outros cirurgiões inglezes fizeram uso do vinho do Porto, que tem sido o geralmente empregado em Inglaterra para a cura do hydrocele. O processo operatorio para effectuar a injecção vinhosa, além de muito vagaroso, pois necessita que se aqueça o liquido até 35 ou 40 gráos cen- tígrados, e que se empregue uma quantidade d'elle que possa distender o sacco, não dispensa um ajudante; além d'isso, evacuada a primeira porção injectada, é preciso repetir ainda uma ou duas vezes a mesma operação. Seguem-se a esta injecção, no fim de 24 horas, phenomenos locaes e geraes de inflammação, que assumem, ás vezes, proporções assustadoras, e que, não raro, terminam pela suppuração e gangrena; por isso a maio- ria dos cirurgiões a teem abandonado. Não é sem razão que Skey diz a este respeito: que o hydrocele merece tratamento mais brando; pois a cura é muito mais grave do que a própria moléstia. (2) (1) Obra cit. pag. 247. (2) Operative surgery. pag. 496. — 21 - Injecção tlc cliloroformio—Entre a multiplicidade de líquidos applicados em injecções para a cura do hydrocele foi também contem- plado, n'estes últimos annos, o cliloroformio, e particularmente por Lan- genbeck, o qual reputa os seus effeitos mais benignos do que os da tin- tura de iodo, e mais rápida a cura. Outros, pelo contrario, o julgam tão irritante e violento como o álcool. Por em quanto ainda a experiência não decidiu de que lado está a razão; porque o uso do cliloroformio para a cura do hydrocele tem sido ainda muito limitado. Injecção de pcrchlorureto de ferro e snanganez—O professor Marcacci propoz uma solução d'este composto para a cura do hydrocele; diz elle que ella mo iifica promptamente a superfície interna da túnica vaginal, que se cobre de exsudação plástica, acompanhada de mais ou menos inflammação, segundo a quantidade e a força da injecção empregada; que não é necessário que a injecção distenda a túnica vagi- nal; que é bastante que o liquido se ponha em contado com toda a su- perfície da membrana; que o contacto da solução é muito pouco doloroso, mas que nem por isso é menos efficaz; que é sufficiente uma solução fraca, ficando dentro por dous minutos; acerescenta, finalmente, que em sete casos de hydrocele, nos quaes foi empregada a injecção, seguiu-se um edema duro, mas que não foi complicação seria. (1) Como se vê, tem sido por demais limitado o campo da experiência para que se possa ajuizar da efficacia absoluta, ou relativa d'esla injecção, visto que só o referido professor a tem empregado. A noticia de onde extractamos o pouco que podemos dizer sobre este novo modificador da túnica vaginal, omitte as proporções da solução empregada. Injecção de sulphato de cobre—Alguns notáveis cirurgiões brazileiros, especialmente no Rio de Janeiro, teem feito, e fazem uso de uma solução de sulphato de cobre em injecções para a cura radical do hydrocele, e particularmente a empregava, de preferencia a qualquer outra, o Dr. Christovão dos Santos; a sua formula ordinária era 4 grammas de sal para 360 de água. Empregam-n'a ainda actualmente os Srs. Drs. França, Teixeira da Rocha e Saboia. Este ultimo cirurgião, hoje professor de clinica cirúrgica na Faculdade do Rio de Janeiro, recorreu a ella, com feliz resultado, em um caso de hydrocele duplo, já anterior- mente operado sem proveito pela drenagem, e com a injecção de iodo. (1; Gazet. Med. da Bahia. 1868. n. 101. — 22 — Não consta, entretanto, que o sulphato de cobre seja de uso geral no Brazil, nem os livros que consultamos nos dão noticias do seu emprego pelos cirurgiões europeus no tratamento do hydrocele, sendo, ao contra- rio, preferidas, pela grande maioria dos práticos, as injecções de vinho ou de iodo. Injecção iodada — Sir Ranald Martin foi o primeiro cirurgião que, em 1832, fez uso da tinctura de iodo em injecção no tratamento do hydrocele. Freqüente como é esta moléstia na índia, e tendo, além d'isso, no hos- pital de Calcuttá numerosas occasiões de applicar o seu methodo, não admira que o illustre pratico reunisse a notável somma de 2:393 casos, e com tal vantagem que apenas viu falhar a operação em menos de 3 por cento dos seus doentes. Alguns annos mais tarde ensaiou tam- bém Velpeau este mesmo tratamento, posto que ainda não conhecesse os trabalhos de Sir Ranald Martin; e tão brilhantes resultados conse- guiu, que em breve foram as injecções iodadas adoptadas pela máxima parte dos cirurgiões, tanto em França como em Inglaterra. O cirurgião de Calcuttá empregava a tintura diluída em agoa na pro- porção de 8 grammas para 24, e não injectava senão uma pequena quan- tidade que deixava ficar no sacco, pratica ainda hoje seguida por quasi todos os cirurgiões inglezes, alguns dos quaes, em vez de diluírem a tin- ctura, injectam-n'a pura, na dose de 4 a 12 grammas, conforme o volume do hydrocele ou a sua antigüidade. Velpeau diluía a tinctura em agoa na pro- porção de 1 para 3, e injectava uma quantidade que não enchesse intei- ramente o sacco; depois fazia manipulações no tumor, com o fim de por o medicamento em contacto com toda a superfície da túnica vaginal, e fazia sahir uma parte d'ella, deixando o resto á absorpção. Patrocinadas pela vasta experiência d'estas duas grandes authoridades, as injecções de iodo foram quasi universalmente adoptadas no tratamento do hydrocele, e ainda hoje, com raras excepções, as preferem a quaesquer outras, e até a qualquer outra espécie de operação, a maioria dos cirur- giões contemporâneos. A tinctura de iodo, preparada segundo o Codex, não se pode misturar com agoa sem precipitar um pouco do metalloide. Guibourt, ajuntando á tinctura uma pequena quantidade de iodureto de potássio, tornou-a per- feitamente miscivel á agoa. Este inconveniente não tem adaPharmacopéa Britânica, por já conter o iodureto em proporção sufficiente para evitar o — 23 — precipitado em contacto com a agoa. É este preparado que os cirurgiões inglezes injectam sem mistura na túnica vaginal. No Brasil poucos cirurgiões deixam de servir-se da tinctura de iodo na cura do hydrocele, diluída com agoa, ou com álcool, em diversas proporções, mas ordinariamente nas estabelecidas por Velpeau; e tanto entre-nós como em outros paizes é a injecção iodada a que até hoje offerece mais avultada, e mais vantajosa estatística. Com este preparado, da mesma sorte que com os demais fluidos irritan- tes, procuram os práticos modificar a túnica vaginal, de modo que não continue a exsudação de serosidade em sua superfície. Os effeitos consecutivos da operação, como já ficou dito, revelam-se por uma inflammação da serosa; e também, na maior parte dos casos, das outras túnicas do escrôto; inflammação que, ás vezes, não está em proporção com a quantidade, ou concentração do liquido injectado; facto que parece depender de circumstancias individuaes, difficeis de prever. Com quanto algumas vezes a inflammação tenha por effeito, quando muito intensa, produzir adherencias que obliterem a cavidade da serosa vaginal, com tudo não é indispensável este resultado, como em tempo se julgou, para a cura radical e permanente do hydrocele. As injecções iodadas são justamente as que gozam da reputação de curar sem produzir taes adherencias, afiás muito freqüentes após o em- prego dos outros methodos de cura que não as injecções. Ora, anão obli- teração da serosa parece ser uma vantagem de grande alcance para as funcções do testiculo, visto que o Sr. Gosselin demonstrou que aquellas adherencias trazem comsigo a anemia do testiculo, e a falta de esperma- tozoides. Este pratico prefere a tinctura de iodo, porqne ella pode curar sem produzir taes damnos. Pensam alguns cirurgiões que a falta de resistência e de apoio das pa- redes do tumor constitua uma das causas de reprodução do hydrocele após as injecções, e por isso aconselham combinar a injecção de iodo com a compressão com tiras de emplastro adhesivo. O Sr. Voillemier diz ter tirado bom proveito d'es te expediente no caso de um velho operado por elle no Hotel Dieu, em Paris. Já vimos que ultimamente o Sr. Bradley, de Manchester, tem pratica- do com proveito a compressão com tiras agglutinativas após a punctura simples, o que vem de accordo com os bons effeitos obtidos após a in- jecção iodada pelo Sr. Voillemier, não só n'aquelle como em outros ca- — 24 — sos de sua pratica. Comprehende-se, porém, que se o methodo proposto e praticado por Bradley, for tão bem succedido nas mãos de outros ci- rurgiões, poderá ser dispensada em muitos casos a tinctura de iodo, e evitados os incommodos inherentes á sua applicação. Só a experiência diuturna poderá demonstrar a efficacia d'este methodo, tanto na cura do hydrocele, como na prevenção das recaídas. Outras injecções—Alem dos fluidos de que nos occupamos nas precedentes paginas, outros muitos teem sido aconselhados na cura do hydrocele. A máxima parte delles foram já mencionados em outro logar. O que se deverá pensar da injecção de leite, de água pura, e até da pró- pria serosidade pouco antes extrahida da túnica vaginal, quando vemos que líquidos irritantes, como o vinho, a tinctura de iodo, etc, não são infalliveis em produzir a cura? Verdade é que estes fluidos foram empre- gados por homens notáveis, a titulo de ensaio, e alguns antes de ser co- nhecida a efficacia da tinctura de iodo, á qual hoje ninguém quererá an- tepor as soluções de chlorureto de sódio, de tannino, de sulfato de zinco, de alumen, etc. Por isso nos dispensamos de occu par espaço e tempo em detidas considerações sobre estas variadas matérias de injecção, visto que n'este breve trabalho tivemos mais em vista a utilidade pratica, do que o interesse histórico da therapeutica cirúrgica do hydrocele. ÜECÇÂO 1¥ Comparação das injecções com os outros melhodos de tratamento do hydrocele, em relação á sua efficacia e seguridade Parece extraordinário que para uma affecção tão benigna, e, em ge- ral, de tão fácil cura, comparada com as outras hydropisias, se tenham multiplicado, quasi ao infinito, os meios de tratamento, desde o mais sim- ples e inoffensivo até o mais complicado, e até perigoso para a vida do paciente. Alguns cirurgiões, não contentes com os recursos já conheci- dos, e efficazes da therapeutica cirúrgica do hydrocele, teem procurado modifical-os, ou substituil-os por outros, se não melhores, ao menos dif- ferentes. — 25 — N'esta parte do nosso trabalho vamos tentar uma comparação entre as injecções e os principaes methodos já mencionados na segunda secção, e também depois faremos por comparar as diversas injecções entre si, pro- curando, d'este modo, chegar ao conhecimento do seu valor relativo, e da sua efficacia e seguridade no tratamento do hydrocele. Tratamento medico—Se a medicação tópica tem algumas ve- zes curado o hydrocele, nem por isso deixa de prevalecer a rogra geral da sua reconhecida fallibilidade na immensa maioria dos casos; e das numerosas loções, pommadas, soluções, pigmentos, fricções, vesicato- rios, só a tinctura de iodo parece ter mais vezes approveitado, sem, toda- via, dar a minima segurança contra a reprodução do liquido. Quanto á medicação indirecta ordinariamente empregada contra as hydropisias das outras serosas, taes como os purgativos drásticos, os diureticos, e os su- dorificos, ninguém hoje se lembraria de a resuscitar, não só por ineffi- caz contra o hydrocele, como porque, levada a ponto de poder (se é que pode) influir sobre elle, seria positivamente nociva ao organismo. Estes meios, por conseqüência, posto que, em geral, mais brandos, e menos arriscados do que as injecções, ficam a perder de vista pelo que respeita aos resultados curativos, e nem valeria a pena trazel-os para este parallelo, se não pertencessem á historia da therapeutica do hydrocele. Tratamento cirúrgico—Este comprehende crescido numero de methodos, como já vimos na segunda secção, os quaes teem de commum entre si penetrar no sacco do hydrocele por diversos meios, que teem por fim actuar na túnica vaginal, ou por qualquer forma impossibilital-a de reproduzir a serosidade. Estes methodos podem ser divididos, para facilidade da comparação, em três cathegorias: as operações por instrumentos cortantes, por applicação de cáusticos, e por instrumentos perfurantes. fl.;l operação por instrumentos cortantes—A incisão e a excisão, no tratamento do hydrocele, são boje raramente empregadas, e, assim mesmo, só as adopta a máxima parte dos cirurgiões em casos espe- ciaes, em que são contra-indicadas as injecções, como, por exemplo, quando ha espessidão, endurecimento ou ossificação da túnica vaginal, ou quando ha suspeitas de affecção grave do testiculo, que possa recla- mar sua extirpação; a incisão, n'este ultimo caso, serve ao mesmo tempo de meio exploratório, e de principio de outra operação, que o caso possa reclamar. 4 - 26 — Como methodo geral, a operação por instrumento cortante, além da repugancia e terror que inspira ao enfermo, tem o inconveniente de ser muito demorada, e de occasionar freqüentemente accidentes graves, e por isso não pode ser equiparada, e muito menos preferida ás injecções; e particularmente áquellas que são hoje mais commumente usadas na pratica. £.a operação por meio dos cáusticos—O cauterio actual e pontencial foram empregados com o fim de penetrar na túnica vaginal, produzindo uma mortificação limitada nas paredes do sacco, e dar sahida ao liquido. Felizmente abandonados, estes meios harbaros, dolorosos e difficeis na pratica, ainda que pudessem reviver hoje em dia, não pode- riam compelir com as injecções, nem pela efficacia, nem pela facilidade da execução, nem pela seguridade do paciente. 3.a operação por instrumentos perfurantes—Esta divi- são comprehende quasi todas as operações que constituem a therapeutica cirúrgica do hydrocele, ou como tratamento único, ou como parteinicial de outros methodos de cura. As mais simples d'estas operaçõas, que são a punctura simples seguida de evacuação do liquido, as escarificações subeutaneas, e a acupunetura são tão raras vezes efficazes, que não merecem confiança alguma; não só o hy- drocele se reproduz, como também as duas ultimas produzem um edema que não é sem inconvenientes; a túnica vaginal não é, como nos outros methodos, e particularmente nas injecções, modificada em sua vitalidade por modo que evite as recaídas. Os methodos pelos quaes se introduz e se deixa ficar por mais ou menos tempo no interior do sacco do hydrocele um corpo extranho solido, taes como: o sedenho, tentas, canulas, mechas, sonda de gomma elástica, fios metallicos, tubos de esgoto (drainage), e methodo de Baudens são todos aptos a produzir uma irritação superior á que é precisa para modificara serosa do testiculo,oceasionando, muitas vezes, sérios acciden- tes, fora de toda a proporção com a importância e gravidade da moléstia, que se quer curar. A todos estes meios são preferíveis as injecções pela grande maioria dos práticos. A electropunetura não tem obtido até hoje resultados que a possam elevar á cathegoria de methodo geral de tratamento do hydrocele. O mesmo se pode dizer do methodo empregado por Messenger Bra- dley (punctura simples, evacuação do liquido, e compressão) por não ter — 27 — ainda sido empregado senão em pequeno numero de casos, e unicamente por aquelle cirurgião. Ainda aqui sustentam as injecções a sua superio- ridade. Resta-nos mencionar a introducção de um pouco de oxido rubro de mer- cúrio na cavidade da serosa testicular, como praticara Humphrey, e como, á imitação d'elle fizeram, n'estes últimos annos, Deffer e Maisonneuve, ser- vindo-se do nitrato de prata. Pelo que respeita ao methodo de Humphrey, é elle próprio quem o desabona, dizendo: « a inflammação que elle excita é mais intensa do que a produzida pelo iodo» e accrescenta, que em dous casos houve salivação. Quanto ao uso âo nitrato de prata, para substituir o oxido rubro de mercúrio, posto que os citados authores, e o Sr. Dr. Alfre- do Guimarães, no Rio de Janeiro, e outros práticos o tenham feito com bom resultado, com tudo, na opinião do Sr. Dr. Saboia, elle não é nem menos doloroso, nem produz menor inflammação do que as injecções, so- bre tudo as de iodo. Concluindo este breve parallelo, e baseado na experiência do maior numero de práticos, julgamos poder affirmar—que no tratamento do hy- drocele são as injecções os recursos que mais vantajosos resultados teem dado na pratica. Passaremos agora á appreciação d'estes recursos, e a considerar quaes d'entre elles se recommendam mais pelos seus bons effeitos, e pela sua seguridade. Appreciação das diversas injecções no tratamento do hydrocele Deixando de parte os fluidos quasi inertes, que por vezes teem sido empregados em injecções para curar o hydrocele, taes como—a água, o leite, o ar, e o futil expediente de re-injectar a própria serosidade pouco antes extrahida do sacco, trataremos unicamente d'aquelles que se re- commendam pelos resultados obtidos, ou que estão mais em voga entre os cirurgiões contemporâneos. A respeito do álcool, já vimos que o próprio iniciador do seu emprego o substituiu pelo vinho, e que outros cirurgiões, que o ensaiaram, lhe — 28 — reconheceram propriedades demasiado irritantes, sem uma efficacia cor- respondente; pois que viam, muitas vezes, a reproducção da moléstia; por esse motivo lhe foram, e são preferidas as injecções de vinho, ou de tintura de iodo. Quanto ao methodo do Sr. Monod, julgamol-o ainda muito pouco experimentado para que se possa avaliar a sua efficacia relativa. Se elle é muito brando em seus effeitos, é também muito fallivel em seus resultados, visto que o author aconselha que se repita a operação de oito em oito dias, até que seja absorvido o liquido; de sorte que, em vez de uma, será mister fazer quatro, seis, ou mais operações, e no fim recorrer, talvez, a alguma das injecções usuaes. Este methodo é muito similhante ao que já tinha recommendado o Sr. Teissier, de Lyon, e muito mais appropria- damente, a respeito das injecções iodadas no tratamento da ascite. (1) Teem acceitação ainda para alguns práticos as injecções de vinho, e ha quem as prefira a todas as outras; além das objecções que de passagem mencionamos, quando descrevemos este methodo, taes como a necessi- dade de um ajudante, de aquecer previamente o liquido, de o injectar por mais de uma vez na mesma occasião, e em grande quantidade, lem- bra-nos outro inconveniente, e é a difficuldade de graduar as qualidades irritantes da injecção. Qual o vinho que deve ser preferido? Os inglezes empregam, ha muitos annos, o vinho do Porto; os francezes usam do vinho tincto do seu paiz, e, provavelmente, no Brazil se lançou mão do vinho commum portuguez, ou hespanhol; ora, cada um d'estes vinhos é de differente força alcoólica, e até os da mesma qualidade nem sempre se encontram de força alcoólica idêntica, e, por conseqüência, de quali- dades irritantes uniformes; e isto sem contar com os demais componentes d'estes líquidos como, por exemplo, o tannino, que devem contribuir tam- bém, no seu tanto, para a cura. Se o bom senso cirúrgico, e os preceitos dos mestres nos ensinam que graduemos as qualidades irritantes da injecção, conforme certas condições do hydrocele, como se poderá observar na pratica este preceito, lançando mão de um liquido tão variável em sua composição, como é o vinho? Talvez não seja estranha esta circumstancia ao facto de fazerem uns cirurgiões a apologia das injecções vinhosas, ao passo que outros as condemnam formalmente. Seja, como for; o certo é que, sem contar com as supra mencionadas objecções, cremos que é muito mais racional injectar no sacco do hydro- (1) Dict. encyclop. des sciences médicales, tom. 5.° pag. 500. — 29 — ceie um liquido de composição conhecida, uniforme, e cujas propriedades irritantes se possam graduar e calcular aproximadamente, do que o vinho que, como é de intuição, se acha nas condições oppostas. Relativamente ao chloroformio, a experiência clinica é ainda muito limitada, e as opiniões variam quanto á sua efficacia, applicado em injec- ções na cura radical do hydrocele; muitos práticos lhe acham os mesmos inconvenientes do álcool. O mesmo se pode dizer da tintura de perchlo- rureto de ferro, proposto pelo Sr. Marcacci. Em quanto a observação não se pronunciar sobre as vantagens attribuidas a estes dous agentes thera- peuticos, não ha razão para as equipararmos, e muito menos para as preferirmos ás injecções de uso commum, e de efficacia demonstrada em muitos milhares de casos. A solução de sulphato de cobre tem por si a experiência, e a authoridade de notáveis cirurgiões brazileiros, e entre elles alguns contemporâneos. Não ha, todavia, uma estatística em que se possa basear juizo seguro sobre as suas vantagens, quer em absoluto, quer em relação ás injecções vinhosas e iodadas; o certo é que a maioria dos práticos dão preferencia á estas ultimas, o que parece demonstrar que não tiveram ainda razão para substituil-as pelas do sal de cobre. Todavia é mais um recurso a tentar quando falhem as outras. Chegamos, finalmente, á injecção de tinctura de iodo, a mais popular, e reconhecida como a mais effieaz de todas as que até hoje se tem ap- plicado em larga escala na cura do hydrocele. As injecções de vinho, que a precederam na ordem chronologica, não lhe podem hoje disputar a primazia, tal é o credito a que a elevaram Sir Ranald Martin, e quasi to- dos os cirurgiões inglezes que a praticaram na índia e Gram-Bretanha, Velpeau, Gosselin e outros na França, e por toda parte a maioria dos con- temporâneos. A authoridade de Sir Ranald Martin é, sem duvida alguma, uma das mais decisivas pelo que respeita á superioridade das injecções de iodo sobre todas as outras; a sua vasta experiência adquirida em um paiz, onde, como entre nós, é freqüentíssimo o hydrocele, deve certamente pesar muito na balança da opinião para aquelles que, como o author d'este trabalho, não tem experiência própria. O que sabemos da pratica geralmente seguida no Brazil vae de accordo com os resultados colhidos por aquelle eminente cirurgião. Nem ha n'isso que extranhar, porquanto é natural que os cirurgiões dos paizes tropicaes sejam os mais competen- tes no que se refere a uma moléstia peculiar ás zonas quentes do globo; — 30 — e também para julgar do tratamento que mais aproveita, e com menor incommodo para os pacientes. As injecções iodadas, na opinião dos práticos inglezes, são as únicas que produzem sobre a túnica vaginal a irritação precisa para a modi- ficar; das outras umas são accusadas de pouco activas, e outras de o se- rem de mais; n'esta ultima cathegoria entram as de álcool e de vinho. O processo que elles geralmente seguem, como ja foi dito, é o estabelecido por Martin, isto é, injectam uma pequena quantidade da tinctura, ás ve- zes não diluída (a da Pharmacopeia Britânica), e deixam-n'a ficar no sacco entregue á absorpção. Entretanto os cirurgiões que seguem os preceitos de Velpeau, injectam muito maior quantidade de tinctura diluída com duas ou três partes d'agoa, e tornam a evacual-a toda, ou quasi toda. Talvez n'estes dous modos de proceder esteja a razão das maiores vanta- gens obtidas pelos cirurgiões inglezes, e o ter sido entre elles quasi uni* versalmente adoptadas as injecções de iodo no hydrocele, com exclusão de qualquer outro modo de tratamento, salvo em casos muito especiaes. Alguns dos nossos clínicos na Bahia também dão preferencia, e com van- tagem, ás pequenas quantidades de tinctura de iodo, (4 a 16 grammas, diluída ou não com igual porção de álcool ou d'agua) deixadas na serosa testicular. Baseado, portanto, no testemunho das melhores authoridades, e espe- cialmente na dilatada experiência dos cirurgiões dos paizes tropicaes, te- mos por mais vantajosas do que quaesquer outras, as injecções iodadas, especialmente sendo applicadas do modo porque as empregam os cirur- giões inglezes, tanto na índia como na Europa; e reputamol-as preferíveis, na generalidade dos casos, a qualquer dos outros methodos de tratamento até hoje conhecidos, e sufficientemente experimentados, SECÇÃO ACCESSORIA Tincturas alcoólicas PROPOSIÇÕES 1—Tincturas alcoólicas são medicamentos que resultam da solução de uma ou muitas substancias no álcool. II—As tincturas alcoólicas podem ser simples ou compostas. III—As substancias que entram na preparação das tincturas alcoólicas, devem ser seccas e divididas. IV—Quando se empregam plantas frescas, as tincturas tomam o nome de alcoolaturas. V—Não é indifferente o emprego do gráo alcoolometrico para a so- lução das substancias medicamentosas. VI—Três são os estados de concentração do álcool, marcados pelo Codex, para a preparação das tincturas medicinaes, a saber: o álcool a 60°, 80», e 90» pelo alcoolometro centesimal, ou 22 l/2,31o e 34« pelo areo- mctro de Cartier. VII—A proporção das matérias medicamentosas e do álcool, seguida geralmente para a composição do maior numero das tincturas simples é de 1:5. VIII—As tincturas alcoólicas preparam-se por solução, maceração, di- gestão, lixiviação, e decocção. Estes três últimos processos são hoje pou- co empregados. IX—Quando se tiver de submetter muitas substancias de natureza differente á acção do álcool, deve-se observara ordem de sua solubilida- — 32 — de, isto é, do menor para o maior gráo de solubilidade, sem o que as ma- térias mais solúveis saturariam logo o liquido, e tornariam sua acção mais fraca sobre outros corpos. X—Na conservação das tincturas alcoólicas devem ser empregados vasos de cor escura e bem arrolhados. XI—As tincturas alcoólicas são freqüentemente empregadas em peque- nas doses nas poções, e em doses mais fortes externamente. XII—As tincturas alcoólicas offerecem ao medico soluções promptas, bem conservadas, e em doses determinadas. SECÇÃO MEDICA Ouaes as medidas preventivas da invasão da cholera- morbus e da febre-amarella? PROPOSIÇÕES I—Atacar de frente este dous flagellos da humanidade é a missão mais nobre de um governo illustrado. II—Os cordões sanitários, os lazaretos e a purificação dos objectos são as principaes medidas, que se devem pôr em pratica para com as pessoas e navios que possam ter sido contaminados. III—O lazareto deve ser collocado em logar um pouco elevado, bem ventilado, distante do centro da população, e, se possível for, em uma pequena ilha. IV—Os desinfectantes mais recommendados são: o chloro, o ácido sulííi- roso, o ácido phenico, e o sulphato de ferro. V—Remover do centro da população todas as matérias animaes ou ve- getaes em estado de putrefação é um dos primeiros cuidados que merece toda a attenção das autoridades sanitárias. VI—A remoção d'estas matérias putrefeitas não deve ser feita quan- do a invasão está imminente, é preferível então extinguil-as no mesmo logar por meio da combustão. VII—A boa fiscalisaçâo bromatologica também exige serio cuidado da authoridade competente. VIII—A retirada, em tempo opportuno, de uma parte da população para um logar sadio, é considerada um meio muito útil, tanto para a parle que se retira, como para a que fica. — 34 — IX—A telegraphia electrica, pelos meios promptos de communicação, pode vir a facilitar o serviço sanitário. X—O estabelecimento de hospitaes, em tempo competente, e em lu- gares appropriados, é uma medida de grande utilidade. XI—Não são conhecidos medicamentos preservativos para estas duas moléstias. XII—Finalmente, a execução pontual dos preceitos de hygiene publica e privada é a mais segura barreira, que podemos oppor á invasão d'estas duas moléstias. SECÇÃO CIRÚRGICA Feridas por armas de fogo PROPOSIÇÕES I.—As feridas por armas de fogo são as produzidas pelos projectis, postos em movimento pela deflagração da pólvora. II.—Estas feridas são essencialmente contusas. III.—Convém distinguir n'estas feridas a abertura de entrada do pro- jectil da abertura de sahida. IV.—A existência de uma só.abertura faz quasi sempre suppor a per- manência do corpo vulnerante nos tecidos, ou nos órgãos offendidos. V.—Entretanto, casos ha em que a bala, penetrando somente na su- perfície do corpo, sahe, ou impellida pelo seu próprio pezo, ou pelos mo- vimentos do ferido, ou porque, tendo levado adiante de si uma porção do vestuário do ferido, é extrahida insensivelmente. VI.—A presença de duas aberturas, uma de entrada e outra de sahida, não prova que nenhum corpo extranho exista na ferida; por quanto, duas balas podem ter penetrado pela mesma abertura, e uma só ter feito aber- tura de sahida; ou então, uma só bala pode ter-se partido contra um osso, e uma porção d'ella ter praticado a abertura de sahida. VIÍ.—Uma das indicações principaes no tratamento d'estas feridas é a extracção dos corpos extranhos. YHL—Esta indicação deve ser executada o mais cedo possível. IX.—É o dedo do cirurgião o melhor instrumento para estes descobri- mentos, sempre que a exploração, com o seu auxilio, seja praticavel. — 36 — X.—O prognostico d'estas feridas é quasi sempre grave, e algumas vezes mortal. XI.—No tratamento d'estas feridas a amputação é muitas vezes indicada. XII.—Para praticar-se a amputação, convém esperar que o ferido se reanime do collapso, porem não que appareçam a febre, os symptomas inflammatorios, e, muito menos, a suppuração. ^^ftP^ê^^3 HYPPOCRATIS APHORISMI ma a — I Si in ventrem sanguis eífusus fuerit prseter naturam, necesse est sup- purari. [Sect. 6.*, Aph. 20.Q) II Non satietas, non fames, neque aliud quidquam bonum est, quod na- turse modum excedat. (Sect. 5.a, Aph. 4.o) III Spontanese lassitudines morbos denunciant. (Sect. 2.a, Aph. 5.o) IV Sanguine multo effuso convulsio, aut singultus superveniens, malum. (Sect. 5.a, Aph. 3.o) V Ubi somnus delirium sedat, bonum. (Sect. J2.a, Aph. 3.o) VI Vulneri convulsio superveniens, lethale. (Sect. 5.a, Aph. 2.o) Bahia—Typographia de J. G. Tourinho—1872. Z/vetneMttía d fêommúêão Mievtáola. ofia/ta e êracu/c/acfe c/e %sW/ecá'~ cena 4 c/e &etemvto de sêjs. i2?>. '(Stncinnafo c/ftnJo êd/á con/otme oj Sóát/uSoJ. S/acufc/ac/e c/e ^ec/tctna c/a gféafaa 5 ale ^/efeintfto de sêjs.-. ê/)*. fê/aadetnão <(êaK/a/uau<}fo