THESE 
DE 
Geraldo Francisco da Cunha. 
1870 T1IESE 
APRESENTADA E PDBLICAMENTE SUSTENTADA 
illllil 
A FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA 
EM XOYKMSm» DE 18JO 
mw. ®3 OSÍSS © ©M© 
DE 
POR 
GERALDO FRANCISCO DA CUNHA. 
VOLUNTÁRIO 1)A PATRIA, EX-PRIMEIRO CIRURGIÃO EM COMMISSÃO DO CORPO DE 
SAUDE DO EXERCITO BRASILEIRO EM OPERAÇÕES CONTRA O GOVERNO DA 
REPUBLICA DO PARAGUAY, 
Zfifilc Do ítojcAAot Jbutouio ÍFtauciôco ía Cuu(?aeS). Jlbatta Catoíuia ÍW 0autc>A Cuuêa,^ 
MTOMIL M MIM, 
On peut exiger beauconp tle ce lui, qui devient auleur, 
poor acquerir de Ia gloire, ou par un motif d’interét, rnais 
celui qni iUecrit, que pour satisfaire á un deroir dont il 
ne peut se dispcnser, à une obligation que lui est imposée, 
a sans doute des grands droits à Fiudulgence de se« 
leeteures. 
La Bbuyère. 
BAHIA 
TYPOGRÀPHIA DE J. G. TOURINHQ 
18*0. FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA. 
DXRECTOR 
O JEjc.mo Sn»'. Conselhei»'o D»'. João Baptisia tios Anjos. 
0 Ex.mo Snr. Conselheiro Dr. Vicente Ferreira de Magalhães. 
t3m 
OS SRS. DOUTORI5S 
I .* ANNO. 
MATÉRIAS QUIS I.ECCIONAM 
Cons. Vicente Ferreira de Magalhães 
Physica em gerai, eparlicularmente em suas 
appiicações á Medicina. 
Francisco Rodrigues da Silva Chimica e Mineralogia. 
Adriano Alves de Lima Gordilho . . . Anatomia descriptiva. 
Antonio de Cerqueira Pinto Chimica organica. 
Jeronymo Sodré Pereira • ... . Physiologia. 
Antonio Mariano do Bomflm Botanica e Zoologia. 
Adriano Alves de Lima Gordilho. . . . Repetição de Anatomia descriptiva. 
!2.* ANNO. 
5.* ANNO. 
Cons. Elias José Pedroza Anatomia geral e palhologica. 
José de Góes Sequeira Pathologia geral. 
JeronymoSodré Pereira Physiologia. 
Cons. Manoel Ladislâo Aranha Dantas. . Pathologia externa. 
Palhologia interna. 
4.* ANNO. 
Conselheiro Mathias Moreira Sampaio 
Partos, moléstias de mulheres pejadas e de meniros 
rcccuinascidos. 
».• ANNO. 
José Antonio de Freitas. . 
Continuação de Palhologia interna. 
Anatomia topographica, Medicina operatorla, e 
apparelhos. 
Matéria medictr, e therapeutica. 
6.* ANNO, 
Pharmacia. 
Salustiano Ferreira Souto Medicina legal. 
Domingos Rodrigues Scixas Bygiene, e Historiada Medicina. 
, Clinica externa do 3.* e 4.° anno. 
Antonio Januario de Faria Clinica interna do 5.* e 6.* anno. 
<D&&D831F<D&83» 
Rozendo Aprigio Pereira Guimarães. . 
lgnacio Josè da Cunha 
Pedro Ribeiro de Araújo 
José lgnacio de Barros Pimentel. . . 
Virgílio Clymaco Damazio 
Secção Accessoria. 
José Affonso Paraizo de Moura. 
Augusto Gonçalves Martins. . 
Domingos Carlos da Silva. . . 
Secção Cirúrgica. 
Demelrio CyriacoTourinho. 
Luiz Alvares dos Santos . . 
Secção Medica. 
O Sr. Dr. Cincinnato Pinto da Silrn. 
«DTOIKMâa IDA eiOlttimiIJl 
O Sr. Dr. Thomaz d*Aquino Gaspar. 
A Faculdade nãoapprova, nem reprova as opiniões emittidas nas theses que lhe são apresentadas. FRACTURA DO TIBIA E SEU TRATAMENTO. 
€oa§idcrarões gcracs» 
POR sem duvida escabrozo o caminho que temos á 
y trilhar para desempenharmos a difíicil tarefa que nos é 
imposta pela lei, mas, nem por isto deixaremos de lançar 
j mão dos meios ao nosso alcance, á fim de, de alguma sorte 
satisfazel-a. 
Antes porem, de entrarmos em a matéria, julgamos conveniente 
dizer, inda que ligeiramente e de passagem, alguma cousa sobre o 
, tibia, assim como sobre fraetura. 
O tibia, como sabemos, é um osso longo, vertical, que occupa a parte 
interna da perna, articula-se superiormente com o femur por meio de 
uma trochleana ou condyliana constituindo a articulação do joelho, e com 
o peroneo por meio de uma arthrodia; inferiormente com o peroneo e o 
astragalo por uma trochleana. 
Compõe-se este osso de um corpo ou diaphyse, e de duas ex- 
tremidades; o corpo é prismático triangular, descreve duas curvas, 
sendo uma, superior, côncava para fora, e outra inferior, côncava 
para dentro; apresenta trez faces e trez bordos que são: face interna larga 
em sua parte superior onde se inserem diversos musculos, os quaes 
constituem o que se chama pé de pato, estreita na porção inferior, ahi 4 
é ella apenas coberta pela pelle; face êxterna côncava superiormente, 
torna-se convexa e anterior inferiormente; a posterior apresenta em sua 
porção superior uma linha rugosa, dirigida obliquamente de cima para 
baixo, e de fora para dentro, offerece inserção á diversos musculos: os 
bordos são; um anterior ou cristã do tibia, cortante em seus dous terços 
superiores, rombo no inferior, dá inserção á aponevroze da perna e á 
alguns ligamentos, um interno e outro externo menos cortantes que o 
primeiro, prestam-se também á inserções. 
As extremidades são: uma superior, volumosa, de tecido esponjoso, 
terminada por duas superfícies articulares—cavidades glenoides, as quaes 
são separadas por uma saliência—espinha do tibia,—esta superfície é de 
forma oval com o seu grande diâmetro antero-posterior, outra inferior 
menor que a primeira, de forma quadrilatera, composta de trez facetas 
articulares, esta extremidade se termina por uma saliência de forma py- 
ramidal—malleolo interno. 
Dito o que de mais importante ha sobre o tibia, passemos á tratar de 
fractura. 
Fractura, é segundo uns a divisão brusca e violenta de um osso, se- 
gundo outros, toda e qualquer solução de continuidade de um osso pro- 
duzida bruscamente e com violência, outros emfim, como Nelaton e 
Riehet a definem da seguinte forma: a solução de continuidade de um ou 
mais ossos de ordinário causada instantaneamente por uma violência 
externa, e algumas vezes também pela eontracção forte e repentina dos 
musculos, d’esta opinião é também o distincto lente da cadeira de Patho- 
logia externa—o Exm. Sr. Conselheiro Aranha Dantas. 
Diversas são as formas que toma a fractura segundo a acção da vio- 
lência externa, o seu limite, a sua direcção, o estado das partes vizinhas, 
e segundo também as relações dos fragmentos. 
Assim pois, quando a solução de continuidade tem lugar em o ponto 
mesmo em que actuou a violência, a fractura é direeta; si porem tem 
ella lugar em um ponto mais ou menos distante é indirecta, ou por con- 
trapancada. Quando o osso é interessado em toda a sua espessura a fra- 
ctura é completa, quando em parte, incompleta: si o tecido osseo somente 
é ofíendido ella é simples, e complicada, quando além d’essa lesão ha de 
concomitância alguma outra nos demais tecidos circumvisinhos. 
Quanto á sua direcção é ella transversal, obliqua ou em bico de flauta 
e longitudinal. As relações que podem tomar os fragmentos muito variam conforme 
a parte quebrada, e também segundo a espessura do osso, o seu com- 
primento, a sua direcção e segundo a sua eircumfereneia. Si a fractura é 
no corpo do osso, um dos fragmentos as vezes se introduz no espaço in- 
terosseo, ficando o outro saliente para o lado de fora e para adiante, e 
tanto mais sensível torna-se este deslocamento quanto mais próxima 
é a fractura da articulação do joelho, e muito também cocorre para aju- 
dal-o a deducção incompleta do tibia e do peroneo; si bem que rara vez 
liaja deslocamento—graças ao peroneo que no seu importantíssimo papel 
de tala, externamente, lhe apresenta algumas difficuldades: si é na extre- 
midade superior é mui pouco sensível o deslocamento, mas, casos ha em 
que elle é bastante considerável, segundo a espessura do osso, mal que 
muita vez é impossível de remediar-se. Boyer, por exemplo, cita um des- 
tes casos produzido por um couce de animal, na extremidade inferior, 
quasi sempre o deslocamento é mais pronunciado segundo a sua circum- 
ferencia. 
♦ 
Entre as fracturas compostas de que ha pouco falíamos, temos a fractura 
comminutiva ou esquirolosa, que é aquella na qual a violência obra com 
tal energia, que o osso fica dividido em muitos pedaços, 
De tudo quanto hemos dito vè-se que o tibia já pela sua posição super- 
ficial, já pela sua conformação e fins á que foi destinado está muito sujeito 
á fracturar-se, não só em sua diaphyse, como em qualquer de suas extre- 
midades, e apresentar qualquer das formas de fractura: sendo no corpo é 
sempre dentada, obliqua, ou comminuitiva, na extremidade superior, hori- 
sontal, obliqua e também longitudinal, lesão que muitas vezes communi- 
ca-se á articulação: e na extremidade inferior de ordinário a fractura é 
obliqua ou comminutiva. 
Vejamos agora quaes as causas da fractura, quaes os seus symptomas, 
diagnostico, prognostico e tratamento. 
Etiologia. 
Innumeras são as causas que podem produzir a fractura do tibia, por 
isso as dividimos em duas ordens, pertencendo á primeira as predispo- 
nentes, á segunda as determinantes. Entre as primeiras vemos o compri- 
mento do osso, a sua posição superficial, as suas funeções, a idade do indivíduo, o seu sexo, certas affecções geraes que possa ter tido, a ma- 
grem, a atrophia do osso consecutiva á antigas paralysias, etc., com quanto 
alguns autores não admittam influencia alguma sobre a fractura, de muitas 
d’estas causas, principalmente do sexo, idade etc., d’esse numero é o Sr. 
Nelaton: entre as segundas, temos as violências externas, como a passagem 
de uma roda de carro sobre a perna, um choque violento, qualquer que 
seja a sua natureza, e a contracção muscular. 
Syiiipíoa&iatoloijia. 
Os symptomas da fractura do tibia apresentam duas ordens de signaes, 
á saber: signaes sensiveis, e signaes racionaes. 
Aos primeiros pertencem o estalo percebido pelo indivíduo na occasião 
em que é fracturado o osso, dôr na parte correspondente á lesão, cuja in- 
tensidade varia coma extensão d’ella, e augmentando logo que se imprime 
o mais ligeiro movimento á parte, impossibilidade dos movimentos, si 
bem que, occasiões ha em que os fragmentos se adaptam de maneira tal 
que, muita vez parece que o membro lesado ainda gosa de suas funcções. 
Á segunda ordem pertencem a deformação da parte, devida não só a 
inchação que se manifesta umas vezes em a occasião mesma do fracasso, 
outras, poucas horas ou dias depois, como até ao deslocamento dos frag- 
mentos, que, como já dissemos, pode ser segundo a espessura do osso, 
seu comprimento, direcção e circumferencia, devido também não somente 
á causa que produzio a solução de continuidade, como á contracção mus- 
cular, e á muitas outras; o peso do proprio corpo pode obrar com tal força 
que é por si só sufficiente para empurrar para baixo um dos fragmentos, 
como succedeo á Ambrozio Paré; o peso do membro abaixo da lesão, a 
elasticidade da pelle, a crepitação que se obtem fazendo mover um dos 
fragmentos sobre o outro, a mobilidade anormal da parte, e finalmente a 
facilidade de reducção e de deslocação. 
Diagnostico. 
Parece á primeira vista mui facil diagnosticar uma fractura do tibia 
pela rapida exposição que fizemos do seu cortejo de symptomas, mas, nem sempre assim succede, porque, tanto os signaes sensíveis como os 
racionaes, não só podem confundir-se com os de outras enfermidades, 
como também faltar, até mesmo a crepitação, unico signal talvez que 
se poderia chamar certo ou patliognomonico, e tanto é isto verdade, 
que Lisfranc aconselha que se uze de sthetoscopo, principalmente 
quando a parte fracturada se achar envolta por grande massa muscu- 
lar; e então, fica-se na incerteza e um pouco indecizo, porém logo 
que prestarmos a attenção precisa ser-nos ha facil destinguir os signaes 
proprios da fractura dos de outra qualquer enfermidade: portanto, quan- 
do se nos apresentar um indivíduo com alguns dos signaes antecedente- 
mente descriptos aecompanhados de uma dor viva correspondente á uma 
das porções do tibia, de uma larga echymose, e levando nós o dedo sobre 
a cristã do tibia não encontrarmos as suas desigualdades próprias, pode- 
mos quasi com segurança dizer que ha fractura do tibia n’esta ou n’a- 
quella parte. 
Prognostico. 
Si a fractura tiver lugar no corpo do tibia, sendo ella simples e trans- 
versa, e o paciente estiver em boas condições o seu prognostico será fa- 
vorável, porque então a formação do callo se promoverá dando lugar a sua 
consolidação, porem, si for ella complicada ou múltipla, o contrario muitas 
vezes se dará, porque, pode ella trazer graves inconvenientes como a perda 
da parte e até mesmo da própria vida. O mesmo acontecerá quando a fra- 
ctura for em uma de suas extremidades, principalmente havendo lezão da 
articulação. 
Tratamento* 
Desde © momento em que tivermos bem reconhecido que o tibia se 
acha fracturado, tres indicações temos a preencher antes de tudo. 
Primeira, reduzir a fractura na occasião mesma do accidente, sendo 
possivel, e não havendo contra-indicação alguma; segunda, mantel-a redu- 
zida; terceira, coníbater os accidentes quer locaes, quer geraes que por 
ventura se possam manifestar. À primeira indicação consiste em pôr os fragmentos em suas relações 
normaes, o que se obtem por meio da extensão, contra-extensão e coaptação. 
As duas primeiras operações, si é que assim podemos chamai-as, 
fazem-se ao mesmo tempo; antigamente para a sua execução eram pre- 
cisos apparelhos, maquinas etc., mas hoje as mãos do cirurgião são suffi- 
cientes, e de um resultado incontestável. 
Para reduzir-se uma fractura do tibia procede-se da seguinte maneira: 
um ajudante encarrega-se do fragmento superior, junto a articulação do 
joelho, afim de fixal-o, tornando-o imrnovel, executando assim a contra- 
extensão, em quanto, que um outro incumbido do fragmento inferior, livre, 
exerce a extensão por meio de ligeiras tracções, devendo ser estas feitas 
em pontos um pouco distantes e não sobre os mesmos fragmentos, afim de 
evitar maiores dores ao doente e as contracções espasmódicas dos mús- 
culos em consequência da compressão. 
Pott aconselha que antes de fazermos as tracções, devemos collocar a 
perna em uma semi-flexão com o fim de produzirmos a relaxação dos 
muscnlos, que de alguma sorte se oppõe a reducção. 
Ao cirurgião cabe atarefa da ultima, a coaptação. 
Si o deslocamente for segundo a circumferencia do osso, imprimire- 
mos ao fragmento superior, isto é, a aquelle mais distante do corpo um 
movimento de rotação sobre o seu eixo, movimento que é communicado 
á extremidade livre pela pessoa que d’ella se achar encarregada, sendo 
segundo a espessura, o movimento será em sentido inverso, de maneira 
que se adaptem os fragmentos, e sendo segundo a sua direcção e compri- 
mento trataremos apenas de pôr os fragmentos, em sua rectidão na- 
tural. 
Quando a fractura for no corpo do tibia nem sempre ser-nos-ha pos- 
sivel executar esta operação, e então nos contentaremos em restituir á 
parte a sua forma e comprimento normaes, em virtude da grande massa 
muscular que rodea o tibia, principalmente em sua porção posterior. 
Muitas vezes esta operação ajudada da immobilidade da perna e de uma 
posição conveniente basta para completar o tratamento da lezão, si os 
fragmentos não tendem a descollocar-se; quando não, é tudo isto insuf- 
ficiente, e mister é recorrermos aos meios contentivos. 
À segunda consiste em manter a fractura reduzida e para isso tem sido 
gté hoje empregado um cem numero de apparelhos. Nós apenas citare- 
mos alguns d’elles—que melhores resultados nos proporcionam—entre estes temos o de tiras separadas ou de Scultet, ou ainda crusado de Ger- 
dy, o apparelho amidonado ou dextrinado de Seutin—chamado inamovível. 
Sobre os demais tem o apparelho de Scultet a vantagem de comprimir 
igualmente a perna contendo os fragmentos, e em caso de necessidade, po- 
der ser mudada qualquer das peças que o compõe sem grande incommo- 
do para o doente, estes são de preferencia os apparelhos commumente 
empregados nas fraeturas do corpo do tibia, sendo a fractura complicada 
de alguma ferida elles abrem no apparelho em a parte correspondente, 
janellas—afim de poder-se dar sanida ao pus e proceder-se ao seu cu- 
rativo. 
Para as fraeturas da extremidade superior são mais empregados os ap- 
parelhos de extensão continua e õs de plano inclinado: os primeiros con- 
sistem em exercer uma tracção permanente e em sentido inverso sobre 
os dous fragmentos com o fim de impedir o seu encurtamento, n’estes 
apparelhos as forças extensiva e contra extensiva devem de ser feitas por 
uma larga superfície, e sobre pontos que se possam prestar á alguma 
resistência, devendo ser sempre a tracção lenta, gradual e parallela ao 
eixo do corpo: todo o cuidado é. indispensável ter-se de não comprimir 
muito os músculos bem como os troncos vasculo-nervosos. Segundo Coo- 
per o femur tem dc manter na extensão o fragmento do tibia, e as su- 
perfícies articulares em opposiçâo, e manda que se passe sobre os frag- 
mentos uma tala de papelão segura por uma atadura enrolada. Jobert 
em lugar da tala uza de um coxim longo. Para Gooper o duplo plano in- 
clinado preenche os mesmos fins, porque diz elle, a deformidade é devi- 
da á ascenção do fragmento inferior, e sendo assim, basta o só pezo da 
perna para obstal-o. Whit e James de Manchester construíram uma es- 
pecie de estante de madeira, cujo angulo formado pelos dous ramos pode 
ser augmentado ou diminuído. Depuytren uzava de coxins de diversos 
tamanhos, e dispunha-os de forma que constituía uma especie de pyra- 
mide de base inferior. 
Para as fraeturas da extremidade inferior os mesmos apparelhos são 
empregados: havendo reviramento do pé para fora, teremos que empre- 
gar o apparelho de Depuytrem, com o fim de trazermos o pé á sua posi- 
ção normal. 
Quando a fractura for complicada o seu tratamento soflfrerá algumas 
alterações conforme a iezão que a accompanha. 
G. Geralmente as complicações que se apresentão são: contracção spas- 
módica dos musculos, contuzão, feridas, hemorrhagias, luxações etc. 
Havendo contracção spasmodica, antes de reduzirmos a fractura, da- 
remos ao membro uma posição conveniente e o cobriremos de cataplas- 
mas emollientes quando for cila ligeira, porem, sendo violenta, teremos 
que recorrer aos antiphlogistieos, á dieta, e as preparações narcóticas afim 
de acalmarmos os espasmos. 
Existindo contusão e sendo cila pouco pronunciada as applicações tó- 
picas resolutivas serão sufíicientes, sendo porem seguida de tumefação 
inflammatoria lançaremos mão dos meios antiphlogistieos. 
Quando a fractura for acompanhada de alguma ferida, trataremos em 
primeiro lugar de ver si a ferida communica ou não com o foco da 
fractura: no primeiro caso, devemos, si a ferida for produsida por um dos 
fragmentos que sahio atravez das partes inolles, e a pelle ao depois con- 
servar o seu lugar, reunir a ferida exterior, tratar a fractura como sim- 
ples e applicar os antiphlogistieos para prevenirmos qualquer inflamma- 
ção que possa sobrevir, isto é, no caso de não ficar o fragmento para o lado 
de fora, si porém, isto accontece, empregaremos todos os meios de collo- 
cal-o em sua posição normal sendo sufficiente a largura da ferida, quando 
não, a desbridaremos, destruindo d’esta arte aopposição que faz á reducção 
dos fragmentos, depois, reuniremos a solução: Si a porção saliente do 
fragmento for mui longa e que de nenhuma forma possamos fazer a sua 
reducção vêr-nos-hemos obrigados a praticar a resecção d’essa parte. 
Si a acção do corpo vulnerante obra directamente e com força capaz 
de reduzir o tibia á migalhas rompendo os musculos que o rodeão, pri- 
meiramente collocaremos o membro em uma posição conveniente, redu- 
ziremos a fractura da melhor forma possível, trataremos de extrahir as 
esquiroías que estiverem soltas, c devemos esperar pelo trabalho elimina- 
tório das demais, em ultimo caso recorreremos a amputação; si bem que 
rfestes cazos alguns sejão de opinião que se ampute logo a parte, não só, 
porque se poupa muitos soffrimentos ao doente, como também, porque 
podem se apresentar algumas circu.msíancias que a tornem impraticável 
para adiante: 
No segundo caso, reunida a solução de continuidade o tratamento será 
o mesmo que o da fractura simples. 
Algumas vezes também apresentâo-se complicando a fractura hemor- 
rhagias arteriaes, n’esse caso devemos logo e logo obstal-as, praticando a ligadura dos vazos que a fornecem, sendo possível, quando não, ver-nos- 
hemos obrigados a amputar a parte, mas, só em ultimo caso 
Muitas vezes as fracturas da extremidade inferior do tíbia são compli- 
cadas de luxação, então o dever do cirurgião é em primo loco reduzir a 
luxação para depois reduzir a fractura, sendo ella simples, porem, si 
for comminutiva quasi que torna-se iindispensavel a ablação da parte. 
Seja qual for o appareiho empregado para a redução da fractura do tíbia, 
não o devemos levantar em quanto não tivermos certeza de que já se 
tem operado o trabalho da formação de callo e que por conseguinte está 
ella consolidada, salvo si, alguma complicação o exigir; n’este caso o le- 
vantaremos tantas vezes quantas julgarmos precisas. 
Será conveniente á applicação de um atadura enrolada na perna para 
prevenirmos alguma’ inflammação ou edema que se possa manifestar, 
ainda mesmo depois de termos levantado o appareiho difinitivamente, se 
conservará a atadura o tempo preciso. 
Sobrevindo alguma rigidez em alguma das articulaçõos empregaremos 
as fricções emollientes, as relaxantes, os banhos, etc., quando forem insuf- 
ficientes esses meios, executaremos movimentos ligeiros as articulações 
visinhas, mas estes movimentos exigem muitas precauções, e que acon- 
solidação já esteja bastante adiantada para que não tenhamos receio de 
destruil-a. Para a consolidação de uma fractura são pelo menos precisos 
40 dias, ou pouco mais. 
N’esta segunda indicação, está conprehendida também a terceira, 
ultima parte do nosso ponto. SECÇÃO MEDICA. 
Quaes os elementos que constituem o diagnoslioo f 
PROPOSIÇÕES. 
I. 
Diagnostico é a parte da medicina que tem por fim destinguir entre sí 
as moléstias. 
II. 
O diagnostico encerra em si duas operações mui distinctas, uma intel- 
lectual, outra racional. 
IIT. 
Duas são as variedades do diagnostico á saber: o diagnostico simples e 
o diagnostico differeneial. 
IV. 
Os principaes elementos para um diagnostico são: os phenomenos 
apresentados pelo doente e os percebidos pelo medico. 
y. 
Constituem elementos de diagnostico os signaes commemorativos e os 
signaes actuaes. 
VI. 
Certas circumstaneías relativas ao paiz, ao clima, a estação, o estado 
endemico ou epidemico muito influem como elemento de diagnostico. VII. 
Ha também circumstancias, de alguma forma independentes da mo- 
léstia, que muito concorrem para elemento de diagnostico. 
VIII. 
O habito externo do indivíduo, o estado de magrem, ou de robustez em 
que se acha, são elementos de diagnostico. 
IX. 
Muito se presta para elemento de diagnostico o estado do pulso. 
X. 
Para que um diagnostico seja bem feito são indispensáveis certos pre- 
dicados, quer da parte do medico, quer da do doente, 
XI. 
São elementos indispensáveis para o diagnostico, a observação, a com- 
paração e o racciocinio. 
XII. 
A marcha, a duração, o tratamento e a terminação das moléstias cons- 
tituem também elementos de diagnostico. 
XIII. 
Os meios pelos quaes se obtem muitos dos elementos precisos para o 
diagnostico são: a percussão, a sucção, a mensuração e a auscultação. SECCÃO CIRÚRGICA 
O 
Queimaduras. 
PROPOSIÇOES. 
I, 
Queimadura é a lesão pliysica produzida pela acção mui concentrada 
do calorico, ou então pelo contacto de alguns agentes chimicos capazes 
de( desorganisar os nossos tecidos. 
II. 
A queimadura está na razão directa da densidade e da capacidade dos 
corpos susceptiveis á acção do calorico. 
III. 
Seis são os gráos da queimadura, segundo a natureza do corpo, a 
quantidade de calorico que contém, a duração de sua applicação e se- 
gundo as partes sobre que obra. 
IV. 
De ordinário só o primeiro gráo da queimadura se apresenta isolado, 
ps demais vem sempre acompanhados de outro. 
V. 
Segundo a applicação do corpo comburente e a sua duração, e' a quei- 
madura superficial ou profunda. 
VI. 
Os phenomenos da queimadura varião conforme o seu gráo e segundo 
a parte lezada. VII. 
Quando a queimadura é pouco extensa os seus eíleitos limitam-se so- 
mente á parte. 
VIII. 
IVluitas vezes a queimadura é tão profunda que os seus limites vão até 
o systema nervoso. 
IX. 
A dor que se segue á uma queimadura é mui viva, occasiões ha em 
que é tão forte que chega a produzir convulsões e até mesmo a morte. 
X. 
O diagnostico da queimadura é subordinado aos signaes commemora- 
tivos, ao exame da parte, a natureza e gráo do calor do corpo que a pro- 
duziu, á duração de sua applieação e aos phenomenos que a acom- 
panhão. 
XI. 
O prognostico varia segundo o gráo da queimadura, a sua extensão, a 
natureza das partes offendidas, a idade e a constituição do paciente. 
XII. 
O tratamento da qneimadura consiste em meios geraes e meios topi- 
cos, conforme o gráo. 
XIIÍ, 
Quando houver grande suppuração recorreremos aos tonicos reconsti- 
tuintes, se esta for complicada de diarrhéa empregaremos o opio. SECCAO ACCESSORIA. 
O 
Existem bazes para uma classificação de ferimentos que satisfaça ou possa 
satisfazer ao exigido pelas leis criminaes brazileiras? 
PROPOSIÇÕES. 
I. 
Em medicina legal ferimento é toda lesão local com solução de con- 
tinuidade ou sem ella produzida instantaneamente por uma violência ex- 
terna. 
Os médicos legistas consideram ferimentos, as contuzões, commo- 
ções, distensões, fracturas, ferimentos por arma de fogo etc. 
II. 
III. 
Para a classificação dos ferimentos deve-se ter em vista a sua extensão, 
sede, e a intensidade das desordens que pode causar o ferimento. 
É indispensável ao medico legista saber se a gravidade dos ferimentos 
depende d’elles, ou de causas accidentaes. 
IV. 
V. 
Os ferimentos são classificados em ferimentos leves, graves e mortaes. 
VI. 
0 ferimento é leve quando não traz eomsigo incapacidade para o tra- 
balho e cujo curativo pode ser feito em menos de vinte dias. VIL 
As eontuzões que se limitão ao tecido cellular, as queimaduras do prL 
meiro grão, as feridas sem complicações que se curam por primeira in- 
tensão, são ferimentos leves. 
VIII. 
São graves os ferimentos que trazem uma enfermidade ou incapacida- 
de para o trabalho por mais de vinte dias. 
IX. 
São ainda graves os ferimentos que desorganisando as partes se ter- 
minam por uma suppuração abundante. 
X. 
Todos os ferimentos que podem produzir perda de uma funcção é 
grave, ainda mesmo que ella não seja duradoura. 
XI. 
Os ferimentos com perda de substancia, e aquelíes complicados que 
necessitarem de operações, são graves. 
XII. 
E mortal o ferimento quando são lezados orgãos indispensáveis á vida. 
XIII. 
Os ferimentos que penetram orgãos essenciaes á vida, com o o pulmão 
coração etc. são geralmente de necessidade mortaes. I1YPP0CRATIS APHORISML 
I. 
Yita brevis, ars longa, occasio proeceps, experiencia fallax, judicium 
difíicile. 
(Aph. 1.0 Sect. 1.*) 
II. 
Ad extremos morbos, extrema remedia exquesite, óptima. 
(Aph. 6.° Sect. 1.*) 
III. 
Vulneri convulsio superveniens, loetliale. 
(Aph. Sect. 5.*) 
IV. 
Ubi fames, non oportet laborare. 
(Aph. 56.° Sect. 5.*) 
V. 
Propter ardores vehementes convulsio aut tetanus, malum. 
(Aph. i3.o Sect. 7.*) 
VI. 
Qua? medicamenta non sanant, ea ferrum sanat. 
Quse ferrum non sanat, ea ignis sanat. Quí® vero ignis non sanat, ea 
insanabilia existimare oportet. 
(Aph. 6.° Sect. 8.&J 
BAHIA.—Typographia de J. G. Tourinlio—1870.