«IIMiíí GERAES SOBRE 21 influencia que tem tibo a djimka nos progressos ba ittebiciua, e os soccovros que tem ella fomecibo á fltynsiologia, anatomia e aos outros ramos bas Bciencias Jítebicas. LIGEIRAS REFLEXÕES Sobre as conseqüências pathologicas provenientes de uma forte contusão sobre a caixa thoracica, e marcar se a contusão profunda do coração será mortal. es» A'cerca do mercúrio e de suas principaes preparações empregadas em Medicina, de sua acção no tratamento das moléstias em que sua applicação è reclamada. a 16 de Dezembro do 1830. PELO C/r. ^/'^anaJco ae zraiuco Tbravctjjcó. NATURAL DA CIDADE DE S. SEBASTIÃO DO RIO DE JANEIRO, filho legitimo DE MüWilS nAVÃSSDS 3DA CASSA. FORMADO EM ME01CIXA PELA MESMA FACULDADE. Celui qui n'écrit que pour satisfaire à un devoir, dont il ne peutse dispenser, a une obligalion que lui est imposé, a sans doute de grands droits à 1'indulgence de ses lecteurs. La IlainrÈuE. TYP. BRASILIENSE DE F. M. FERREIRA, RUA DO SABÃO N. 114. FACULDADE DE HEDICIXA Dl) RIO DE JAXE1RO. »:*««:«: Os Sus. Drs. DIRECTOR. 0 EXM. SR. CONSELHEIRO JOSÉ MARTINS DA CRUZ JOBIM. I—ANNO. I rancisoo de Paula Cândido....... Physica Medica. Francisco Freire Allemão........f Botânica Medica, e princípios elementares de [ Zoologia. II—ANNO. _ . ,r. , _ „ „ .•!„„#. í Chimica Medica, e princípios elementares de Joaquim Vicente Torres Homem, Presidente. . I Mineralo"ia ^ José Maurício Xunes Garcia.......Anatomia geral e descriptiva. III-anno. José Maurício Nunes Garcia.......Anatomia geral e dcscripliva. Lourenço de A. Pereira da Cunha...... Physiologia. IV— ANNO. Luiz Francisco Ferreira.........Palhologia externa. Joaquim José da Silva, Examinador .... Palhologia interna. t -~ t • .i„ />___n „ .Pharmacia, Matéria Medica, especialmente a João José de Carvalho.........[ Brasileira, Therap., e Arte de formular. V—ANNO. Cândido Borpes Monteiro........Operações, Anatomia topogr. e apparelhos. ( P.trtos, Moléstias das mulheres pejadas e pari- .........I das, e dos meninos recem-nascidos. VI— ANNO. Thomaz Gomes" dos Santos........Hygiene, c historia da Medicina. José Martins da Cruz Jobiin.......Medicina legal. 2.° ao í.° M. F. P. de Carvalho......Clinica externa, e Anat. pathol. respectiva. S.° ao O.0 M. de Valladão Pimentel, Examinador. Clinica interna, c Anat. pathol. respectiva. LENTES SUBSTITUTOS. Francisco Gabriel da Rocha Freire, Examinador. ( c„„-„ ,„ „ . . „„ „ Antônio Maria de Miranda Castro......{ Secçao de sciencias accessonas. José Bento da Roza..........r a„„„-/. _„ ,• „ Antônio Felix Martins.........{ Secçao medica. Domingos M. de Azevedo Americano, Examinador , ^Pl.rtn r5l.11P •ii#Ã#ajiss mmmwm wmmm §§€>©}; Commendador da Ordem de Christo, medico da câmara de Sua Magestade o Impera- dor, primeiro medico do hospital militar da guarnição da corte, vereador da Illm. Câma- ra Municipal, e lente de chimica da faculdade de medicina do Rio de Janeiro, etc., etc., etc. Tributo da mais subida gratidão, expressão da mais viva sympathia, e homenagem ao saber, e ao mérito. lh®% E>Qrra©T®S IPiE®íFIiÍ©!Flii DA FACULDADE DE MEDICINA DO RIO DE JANEIRO Os Illms. Srs. Drs. MANOEL DO VALLADÃO PIMENTEL DOMINGOS MARINHO DE AZEVEDO AMERICANO FRANCISCO GABRIEL DA ROCHA FREIRE JOAQUIM JOSÉ DA SILVA ANTÔNIO FELIX MARTINS THOMAZ GOMES DOS SANTOS FRANCISCO DE PAULA CÂNDIDO Homenagem ao saber. AO ILLM. SR. Sincera prova de amizade, e sympathia. Os Illms. Srs. Drs. Gervasio Pinto Cândido Góes e Lara José Francisco Netto José Antônio Torres Carlos Pereira de Azevedo D. Nuno Eugênio de Locio Limitada prova de minha amizade, mas pura expressão do meu coração. Pr. 4Trnnrisco be Paula (ívauassas. INTRODUCÇÃO. Vamos cumprir o preceito da lei apresentando a nossa thesc, ainda que mal acabada, comtudo como as nossas forças o poderão fazer. Senão fora a obrigação que temos de preencher a nossa carreira escolar, decerto não nos abalançariamos a escrever, attendendo nossos fracos conhecimentos. Esperamos dos nossos juizes toda a deferencia possível. Nunca acostumados a pegar na penna foi-nos este passo mui difficil de executar, masque fa- zer, se era mister dar a ultima prova para obtermos o gráo de doutor em medicina ? Assim pois aproveitamos este ensejo não só para agradecermos a urba- nidade que despenderão comnosco os nossos mestres, mas também rogar- lhes toda contemplação com aquelle que fez o que estava ao alcance de suas idéias, e se mais não pôde mostrar., foi decerto pelo acanhamento de sua intelligencia. DiSDSc^íí^esesDSicjsesesesoses CONSIDERAÇÕES GERAES Sobre a influencia que tem fido a chimica nos nrogrcs- sos da medicina, e os soccorros eiuc tem ella fornecido á pliysiologia, anatomia e aos outros ramos das scien- cias medicast ALGUMAS PALAVRAS SORRE A HISTORIA DA CHIMICA. A chimica, cuja origem era nos primeiros séculos attribuida a Deoses e semi-Deoses, cuja practica envolvia-se cm myslerios e exagerações, não foi em seus princípios mais que uma reunião de factos observados, que se ião mais e mais accumulando, sem que unia explicação delles, lhes podesse dar o foro de sciencia. Ainda mesmo no século oitavo, segundo Dumas, apezar das regras que já se ião dando para a reproduceão de certos pheno- menos, esta sciencia toda confundida com a physica era uma espécie de magia com que se pretendia fazer ouro, c descobrir a pedra philosophal. Entretanto, ainda que rotineiramente os Gregos, Egypcios e Romanos, a em- pregarão vantajosamente nas artes entre elles tão aperfeiçoadas já nesses remotos tempos. Era com ella que preparavão vidros de mil cores., que extrahião substancias aromaticas das flores, e que se embalsemavão essas múmias, que atravez das eras teem chegado perfeitas até nossos dias!!! Estes povos não tinhão chimicos abalisados, assim como os Chinezes, cuja indus- tria tem subido á maior perfeição!! Apezar do que a Escriptura diz de Tu- balcain, oitavo filho de Adão (malleator et faber in cuncta genera oris et ferri), e das maravilhas do legislador Hebreu, parece certo que elles não erão chimicos e que apenas praticamente empregavão algumas operações filhas do acaso. Na Europa., pouco tinha feito a chimica apezar das maravilhas de Alberto o Grande, Villeneuve e outros, quando appareceu um homem maravilhoso — o doutor illuminado — Raimundo Lulla,— Hcspanhol de 1 origem ; elle passou sua mocidade nos prazeres como os senhores de seu tempo; um amor desgraçado fez com que renunciasse ao mundo, c repar- tisse seus bens com a pobreza, e entrasse para o claustro na idade de trinta annos: onde estudou as línguas, a theologia e as sciencias pliysicas; con- cebeu então gigantescos planos de Crusadas, e de sujeitar a África á Euro- pa ; foi de terra cm terra de infiéis pregando a fé até que emfim succumbio ao martyrio, seu corpo foi conduzido em triumpho, das praias da África para a Hespanha. Este homem maravilhoso que parecia multiplicar-se em tantos empenhos c trabalhos, ao mesmo tempo que Apóstolo Santo, procu- rava converter e civilisar os bárbaros, verdadeiro sábio, entregava-se á chi- mica, que com seus esforços muito ganhou. Elle sujeitou o chumbo á cal- cinação, e fez sahir destas operações novos compostos, debaixo de nomes allegoricos que Dumas explica cheio de admiração. Em H93 nasceo na Suissa Aureolo Filippe Tlieofrasto Bombast Paracelso, o qual depois de ler estudado sob a direcção de seu pai, medico hábil, visi- tou todas as escolas da Europa. Reunindo tudo quanto havia de bom na practica dos Árabes, colhendo aqui e ali os remédios proscriptos pelos médicos, e que empregados pelos impiricos, todavia sortião eífeitos; muito versado na sciencia que então se chamava Alchimia, poz cm uso um grande numero de preparações novas que elle descobrio. Nós empregamos hoje remédios que elle poz em voga, por exemplo, as preparações de mercúrio, que elle descubrio e foi o pri- meiro que empregou internamente, afora os compostos de zinco, de arsê- nico, &c. &c. Paracelso morreu cm 1541 em Salzburgo com 48 annos de idade, c deixou seus bens aos pobres. Bazilio Valentim descreveu em 1671, o processo para a extracção do autimonio. João Baptista Van Ilelmont (que pelas suas descobertas em chimica lhe assegurão um lugar distineto na historia desta sciencia,) creou o termo gaz que applicou ao hydrogenio, e ao ácido carbônico, que elle chamou gaz silvestre. Até aqui fazião mis- turas perigosas,porém dissipados os vapores da Alchimia, a aurora da ver- dadeira chimica resplaudeceu com todo o seu brilho. Depois dos ensaios de Beguin., Bauderon, Jacques Lemort, apparecêrão em França, Lemery, Boulduc; na Allemanha, Otto Tachenius, Kunckel, Maurício HoíTman, Schrcedrer, e Glauber que enriquecerão a chimica das melhores prepara- ções. Quasi na mesma época Frederico HoíTman illustre deão da universi- dade de Halle analysou as águas mineraes. Apezar de suas doutrinas errô- neas, George Ernesto Stahl foi um dos que deu um grande movimento á chimica, creando uma philosophia chimica, e a theoria do phlogistico. — 3 — Black, professor de Edimburgo, descobriu depois de Van Helmont o gaz ácido carbônico, ao qual deu o nome de ar fixo, dislinguindo-o do ar ath- mospherico, onde se achava como parte constituinte. Em 1766 Cavendish apresentou á sociedade real uma memória, dizendo: que existião muitas es- pécies de ar, e que o ar não era um elemento. Depois appareceu Scheele que descobrio o chloro em 1774, e alguns ácidos orgânicos e o manganez. Priestley descobrio ao mesmo tempo que Scheele em 1774 o oxigeneo, que elle chamou ar dephlogisticado, o ácido sulphuroso, o protoxido de azoto, e o gaz oxido de carbono. No fim do décimo oitavo século appareceu esse gênio maior que todo o elogio!! — Lavoisier — o qual destruio a doutrina chimica de Stahl, declarando que o phlogistico não existe, e que o ar de- phlogisticado é um corpo simples, e que este ar se combina com os metaes na calcinação, que transforma em ácido o enxofre, o phosphoro e o carvão, que entretem a combustão e a vida, que fôrma as partes essenciaes da crosta do globo, da água, das plantas e dos animaes. Elle repetio as experiências de Black sobre os gazes, demonstrou a combustibilidade do diamante e os produetos que resultão, fez conhecer a natureza do ácido carbônico, estu- dou os phenomenos da respiração e da combustão, aualysou a água e a recompoz. As descobertas em chimica mineral teem sido tão multiplicadas, que impossível se torna enumcral-as todas, entretanto mencionaremos algu- mas das mais importantes. Em 1797 descobrio Vauquelin o chromo. Fourcroy achou o meio de dis- tinguir e obter no seo estado de pureza, a baryta e a stronciana. Thompson descreveu pela primeira vez em 1804 o chlorureto de enxofre. Mr. Hisinger no curso de suas experiências com M. Berselius descobrio por meio da pilha o cerium. Em 1805 Gay-Lussace Humboldtanalysárão o ar. Em 1807 Davy obteve por meio da pilha oselementos dos alcalis e das terras, opotassium, sodium, barium, strocium e o calcium. Em 1808 Thenard isola o boro do ácido borico. Gay-Lussac descobrio o cyanogeneo. Em 1812 M. T. de Saus- sure examinou a propriedade que possue o carvão de absorver os gazes. Em 1813 Courtois descobrio o iodo. Em 1816 Berselius descobrio o selenio. Em 1817 Arfwedson descobrio a lithina, eDavy isolou o lithíum. Em 1824 MM. Liebig c Gay-Lussac obtiverão o ácido fulminico. Em 1826 Balard desco- brio o bromo. Em 1827 Wahler descobrio o alumínio. Em 1829 Mr. Bussy o magnesio. Em 1830 Sefstron descobrio o vanadio. Em 1845 Heuri Rose descobrio o niobio. Em 1847 Mosander descobrio o erbium. Emfim, merecem especial menção na historia desta sciencia, por terem muito concorrido para o progresso e adiantamento da mesma, os illustres — A — nomes de MM. Berthier, Regnault, Faraday, Laurent, Person, Berselius, Thenard, Orfila, cLassaigne etc. etc. etc. A chimica orgânica que ha poucos annos não era mais do que uni ramo pouco importante da chimica geral, tem feito recentemente rápidos pro- gressos, devidos aos trabalhos de MM. Rasphail, Liebig, Dumas, Baudri- mont, Millon, Pellouze c Freiny, etc. etc, cujos nomes tão conhecidos e contemporâneos são maiores que todo o elogio!! Já desde esses longínquos tempos era a chimica grande auxiliar da me- dicina, e cada vez de anno em anno, mais e mais obrigação lhe vai deven- do a arte de curar, c mais estreitos laços ligão estas duas sciencias. Que influencia tem tido a chimica nos progressos da medicina, quesoc- corros tem ella fornecido á phijsiologia, anatomia e aos outros ra- mos das sciencias médicas? He hoje reconhecido que a chimica tão mil ás artes, ao commercio, e á industria das nações é um luminoso brandão, que levado pela mão dos gê- nios, tem esclarecido muitos pontos das Sciencias Médicas, e que a propor- ção que estas se adiantarem, ha de ir resolvendo muitas questões e fixando o juizo dos sábios, que não carecerão mais de certas hypotheses das quaes as mais velhas de ordinário vão cedendo ás mais novas. Qual a influencia que tem tido a chimica no progresso da medicina? Muita, Era indispensável que o medico conhecesse a composição do organismo, que soubesse todos os corpos que concorrem para formal-o, ora no estado de princípios immediatos, ora livres, mais ou menos combinados, ou sim- ples ; era necessário que conhecesse a cada um desses princípios immedia- tos com suas propriedades no estado de saúde, para que elle podesse ava- liar qualquer alteração nas qualidades, e nas quantidades d'esses corpos no estado de moléstia: c este conhecimento lhe é fornecido pela chimica orgâ- nica. É por meio delia que elle sabe a composição de cada órgão, de cada fiuido da economia animal, que por exemplo, nos ossos predomina as sub* stancias calcareas, e nos músculos a fibrina, é por ella que elle descobre a composição do chylo, da limpha e do sangue; c que elle distingue no san- gue, adiífercnça entre o sangue arterial e o venoso ; que se lhe revela os princípios da biiis e do sueco pancreatico, e é por ella ainda que elle de- compõe aourina, e mostra cada uma de suas partes., cada um do seus prin- cípios componentes. Sem a chimica a physiologia andaria talvez ainda cambaleando com o fraco alicerce das hypotheses, e estarião os diversos fluidos da economia desconhe- cidos. Mas já se tem avançado muito no estudo das funcções dos órgãos, já se tem explicado phenomenos, que ainda ha pouco erão mysteriosos como as mudanças dos fluidos debaixo de certas causas, já se tem mesmo achado importantes dados para o diagnostico de certas enfermidades, e tudo com o auxilio da chimica,, que progride, fazendo marchar comsigo as sciencias médicas. Sabemos que em algumas enfermidades os fluidos da economia soffrem certas modificações, que o sangue por exemplo torna-se mais ou menos fluido, mais abundante deste ou d'aquelle principio immediato, e que na chlorose elle é desprovido de matéria corante, que tem falta de ferro, já não é um grande soccorro para o diagnostico, e para o tratamento desta enfermidade ? O modo de obrar do ferro, curando esta alteração, não será conforme boas opiniões, todo chiinico ? É o que a experiência parece con- firmar. Na hypoemia é a chimica que nos mostra o estado do sangue, e a falta de fibrina n'elle. Nas moléstias inílammatorias em geral também a chi- mica nos guia no exame dos fluidos nutritivos. Nas moléstias do apparelho ourinario, qual é o ramo das sciencias que mais soccorros fornece para o conhecimento da composição das ourinas ? Na moléstia de Brigth, no dia- betis, não é ella o mais seguro auxiliar, não só para diagnosticar, como pa- ra curar estas enfermidades ? É indubitavel que a chimica pôde muito nos ajudar no diagnostico das moléstias, e que á maneira que ella fôr progre- dindo, sua applicação ámedecina,, será cada vez mais util, e que mesmo na actualidade sem ella, o medico seria na sciencia, o mesmo que um piloto sem bússola em mar immcnso. Como é que o medico podia com segurança e raciocínio lançar mão de um medicamento, sem conhecer-lhe a composição e as propriedades, sem saber quaes erão os seus componentes, e as propriedades de cada um d'el- les, sem prever as modificações que poderião chimicamente produzir mis- turados entre si; a que novos compostos podião dar lugar, e que acção te- rião sobre o organismo ? Em vez de um medicamento salutar talvez applicasse um terrível veneno. Em vez de um resultado benigno obteria cffeitos que não saberia explicar !! Pois que sabemos que dois corpos que tem a mesma acção A, misturados, produzem um composto que tem uma acção B, muito diversa da que cada um delles tinha. Sabemos também que certos corpos podem ganhar acção, e que outros perdem com a mistura. É inuegavel que a chimica tem apu> rado muito o modo de preparar os medicamentos, que é com ella que o pharmacologista distingue, e extrahe dos vastos reinos da natureza, essas substancias inestimáveis, que o Creador deixou para allivio dos males da humanidade; é com ella que elle torna mais úteis, mais simples, mais agradáveis essas substancias: é com ella que elle as decompõe, e toma a recompor, dando-lhe novas qualidades, nova energia, e mais larga appli- cação !! Do mais indigesto c bruto terreno tira mineraes sublimes!! das mattas impenetráveis traz a flor, a folha, o frueto, a casca e a raiz dos vegetaes os mais preciosos, de que extrahe princípios, tanto mais activos, quanto mais simples; e emfim do corpo de certos animaes elle aproveita partes que pre- paradas vão ainda ser utilissimas ao homem soífredor. É com ella ainda que o illustrado pharmacologista transforma o mais rápido e terrível veneno, no mais propicio e sublime medicamento!! A therapeutica, e a medicina toda para serem rasoaveis, para tocarem o fim a que se dirigem, precisão indispensavelmente da chimica, sem a qual nenhum passo dão na estrada do progresso!! A anatomia tem recebido muito soecorro da chimica, descobrindo e ana- Jysandoa composição de cada apparelho, de cada systema de órgãos, e mes- mo de cada órgão. É com esla sciencia que a anatomia tem-se tornado mais transcendente, que tem mostrado os princípios immediatos e os corpos que entrão na composição dos diflerentes tecidos orgânicos, desde o que fôrma o mais delicado nervo, até o mais simples osso. Com certas preparações chi- micas, como por exemplo, injecções, fazem-se apparecer melhor e conser- vão-se órgãos, tornando-se mais fácil o seu estudo. Em physiologia muitas c importantes funeções não terião dado um passo si não fosse a chimica, que bem applicada, tem dirigido os sábios em suas experiências, em que a evidencia mesmo já tem vindo coroar seus esforços na descoberta de importantes verdades. Na respiração, por exemplo, de- pois de analysados e conhecidos o sangue venoso e o arterial, conhecida a mudança que o primeiro soíTre para ter as qualidades e as propriedades do segundo, analysado e conhecido o ar athmospherico, é a chimica quem nos fornece os principaes auxílios, para ser bem estudada como ha sido, a funeção da hematose. E ella quem nos levanta o véo que cobria a funeção das nutricões, mos- trando-nos as qualidades que deve ter o sangue para nutrir, as queWperde depois de haver reparado as perdas dos órgãos. É ella que nos explica a ea- lonficação e as outras funeções tão sublimes!! Sim, a chimica é a alavanca é o braço de que se serve essa potência chamada vitalidade na execução das mais elevadas acções do organismo!! A hygiene tem progredido muito, e ha de progredir com as luzes da chi- mica orgânica. Pois que esta é quem tem analysado o ar que se respira, os líquidos que saciãoa sede, e aquelles que mais ou menos excitantes, devem ou não convir a certos estados de nossa saúde; é ella que nos mostra as qua- lidades das substancias alhncntans, que nos orienta no estudo destas sub- stancias, mostrando a composição de cada um dos princípios immediatos, de cada um dos corpos que cntrão na formação delles, e as acções que podem ter e soíTrer fora ou dentro do organismo, cujas perdas os alimentos são destinados a reparar. E como é que conhecemos certos miasmas, devidos a emanações de tecidos orgânicos em decomposição? Como é que desinfecta- mos o ar e todos os corpos impregnados de principios deletérios? Sem esta sciencia a hygiene não seria tão previdente, não estaria tão adiantada. A medicina legal sem a chimica o que seria n'um caso de envenenamento ? E quando é que esta sciencia torna o medico mais elevado, mais sublime, mais real? É quando a sociedade quer punir um crime que ficaria desco- nhecido sem o auxilio que a chimica presta. No envenenado cila nos mostra a substancia tóxica, em algumas circuns- tancias ella verifica se uma nodoa avermelhada que se encontra é devida a sangue, ou a qualquer tinta. Muitos factos demonstrão quanto esta sciencia tem concorrido para o adiantamento dos conhecimentos medico-legaes, e seria inútil procurarmos demonstrar agora o que é para nós evidente. Terminaremos emfim com a seguinte proposição. — Que não só a chi- mica muito tem concorrido para o progresso da medicina toda, e de cada uma das sciencias que fazem parte delia; como também que é uma parte muito interessante e indispensável da sciencia de curar, e que não pôde ser delia separada, como senão pôde separar uma funeção das outras em um vivenle, sem çomprometter-lhe a vida. LIGEIRAS REFLEXÕES Sobre as conseqüências pathologicas provenientes de uma forte contusão solire a caixa tlioracica. E mar- car se: a contusão profunda do coração será mortal* Dá-se o nome de contusão a toda solução de continuidade dos tecidos vivos, acompanhada da extravasação de líquidos orgânicos, e produzida pela pressão directa ou indirecta de certos agentes exteriores, mas sem divisão da camada tegumentaria. Todas as espécies de corpos contundentes, obrando com certa intensida- de, podem dar lugar ás contusões fortes, tacs são as balas, os couces de cavallos, a acção das rodas de carros, a compressão entre dous planos mais ou menos resistentes, a acção dos corpos movidos com grande velocidade, ou muito pesados, as quedas de lugares elevados, etc, etc, são as causas que ordinariamente as produzem. O volume do peito, sua situação entre o pescoço e o abdômen, a flexibi- lidade dos ossos que o compõe, os órgãos importantes que encerra, são motivos mais que suflicientes para as contusões fortes serem seguidas de conseqüências mais ou menos graves, circumstancias que podem variar quanto á fôrma do instrumento vulnerante, seu volume, direcção, rapidez, estado, elasticidade das partes, e constituição dos indivíduos, etc etc. etc As contusões dirigidas sobre a parte anterior do peito podem ser acom- panhadas de dòr de intensidade variável, a qual não tem duração fixa, augmentando-se com os esforços da expiração, com a tosse, etc etc A carie c a necrose do sterno tem apparecido em conseqüência dessas fortes violências, a eslruclura esponjosa e muito vascular do osso, expli- cão satisfatoriamente similhantes conseqüências; também podem ser se- guidas da fractura desse osso: quando isto observamos, o peito sofíre uma rápida e considerável mudança em suas dimensões, mudança dependente 2 — 10 — da elasticidade que gozão as partes que unem as costellas ao osso sterno, as vísceras contidas dentro da caixa thoracica/experimenlão uma compres- são proporcionada, as esquirolas dirigindo-se para a parte interna, desen- volvem inflammações mais ou menos intensas por causa das rupturas ou hemorrhagias que produzem. La-Marlinièrc cita o íacto de um indivíduo que tendo dado uma queda so- bre o sterno sobreveio-lhe um tumor, que tendo sido aberto encontrou-se o osso cariado. Sanson vio o coração largamente roto n'um caso de fractura do sterno, com aprofundamento dos fragmentos, produzida pela lança de um carro. As contusões que obrarem sobre as partes lateraes podem lezar as partes molles, então apparece dôr, ecchymoses mais ou menos extensas variando de còr, depósitos sangüíneos, inflammações, abcessos, e a gangrena resul- tante ou da morlificaçào immediata dos tecidos desorganisados pela contu- são, ou da inflammação consecutiva. A posição que occupãoas mamas, nas mulheres, as saliências que apre- sentão, as tonião muito expostas ás contusões; a densidade de seo tecido, as rugas, os septos ccllulo-fibrosos que observamos em seos lobulos tornão a contusão destes órgãos, mais ou menos graves, e é por isso que fre- qüentemente ncllas se desenvolve essa moléstia terrível que tantas victi- mas leva ao túmulo ; entretanto no homem a conseqüência não é tão gra- ve, fallando deste modo não queremos dizer que não sejão também sujei- tos a cilas : não ; muitas vezes um simples engorgitamento doloroso acaba por tomar o caracter canceroso. As costellas podem ser fracturadas, seos fragmentos dirigirem-se para aparte interna do peito, e ferirem a artéria intercostal, e darem lugar á inflammação da plcura, do pulmão, e a emphysemas mais ou menos ex- tensos. Phenomenos idênticos aos apresentados nas partes molles lateraes, po- der-se-hão também observar nas posteriores, e aqui em maior escala por causa da espessura dos tecidos. Podem também determinar a fractura das vertebras dorsaes: estas frac- turas são algumas vezes acompanhadas da compressão, e da commoção mais ou menos violenta da medulla espinhal; e desordems graves são as conseqüências, taes são, a ruptura, a inflammação deste órgão, paralysias, syncopes, e uma morte instantânea; podem além d'isto dar lugar, (posto que raras vezes) á fractura do sterno. Morgagni cila o facto de um indivíduo que levou uma pancada sobre o dorso, do que lhe resultou a morte ins- — 11 — tantanea; a aorta tinha sido rota. Paillard refere também o caso de um militar, que ferido por um projectil, entre as cspaduas, ficou paralytico. Ravaton menciona o caso de um sargento que recebeo um estilhaço de bomba sobre as vertebras dorsaes : foi levado ao hospital, sem pulso, com as extremidades frias, sem poder ourinar, c nem mover os pés c as mãos. David fallando das contra-pancadas, conta que um pedreiro, tendo cahi- do do alto de um edifício que estava em construcção, sobre uma barra do andaime, contundira o meio do dorso, contrahira fortemente os músculos do pescoço e baixo ventre, e partira o sterno transversalmente. Depois de termos referido as conseqüências das contusões fortes dirigi- das sobre as paredes da caixa thoracica, com lezão das partes molles, e fractura dos ossos ; passaremos agora a mencionar as que podem dar lugar a contusão dos órgãos contidos na mesma, embora não haja lezão das par- tes molles c fractura dos ossos, que formão o madeiramento desta caixa. Os pulmões, órgãos de uma estruetura complexa, essencialmente espon- josos e expansivos, formados como são de tubos prolongados, folliculos lymphaticos, nervos, e grande quantidade de vasos sangüíneos, acompa- nhando todos os movimentos do peito, que o enchem exactamente, explicão a razão por que são sujeitos ás contusões, de uma gravidade maior ou me- nor, sem destruição da continuidade de suas paredes. Elias podem aflectar um só lobulo, ou ambos ao mesmo tempo, podem mesmo oecupar todo o lobulo, ou uma só parte. No gráo o mais fraco, ha dôr na parte, tosse, maior ou menor difficul- dade de respirar, a percussão nos fornece um som obscuro, e a auscultação mostra que ha impermeabilidade do ar em toda a porção lezada. Esta aífecção termina ordinariamente pela resolução ; mas em alguns casos no fim de alguns dias se desenvolve uma pneumonia, c n'outros uma iiiflammação chronica do órgão. Em gráo mais forte o tecido do pulmão pôde se romper, e notar-se uma dôr mais profunda c viva, oppressão forte, escarros de sangue mais ou menos abundantes. Os indivíduos n'cste gráo são mais expostos aos acci- dentes da pneumonia, do que no outro. Em gráo muito forte, o tecido do pulmão se desorganisa em maior ou me- nor escala, além do sangue cxpellido pela bocca, derrama-se uma certa quantidade na cavidade da pleura, aos symplomas dos gráos que referimos, reunem-se a pallidez, o estupor, e todos os symplomas que nos revelão uma hemorrhagia interna, e um derramamento na cavidade pleuritica ; na plu- ralidade dos casos os doentes morrem no fim de algumas horas, outras ve- — 12 — zes no fim de dias, por se haver desenvolvido violenta inflammação, podem também succumbirmais tarde, então a morte é causada pelo derramamento. Morgagni diz que um homem de 70 annos de idade fallecéra no fim do 7.° dia tendo cahido de um lugar elevado. Pela autópsia verificou-se a cxis. tencia de um abcesso, e ecchymose no pulmão. Vclpeau apresenta-nos o exemplo de um menino de 10 annos de idade, que só vivera meia hora depois que a roda de um carro lhe passara por cima do peito, pela autópsia encon- trou-se as costellas fracturadas c o pulmão direito contuso ; este mesmo autor apresenta ainda outro exemplo de um pedreiro que fracturára cin- co costellas, e tinha o pulmão reduzido a uma massa ou papa, e só durou quatro dias. Paillard diz ter visto um soldado ferido por uma baila atraz do omoplala, com este osso fracturado e o pulmão contuso. Jobert cita outro facto, de um homem que recebera sobre o peito uma forte panca- da da lança de um carro, tinha as costellas fracturadas e o pulmão bas- tante contuso, não havendo entretanto nenhuma lezão na pleura pulmu- nar, morreo em conseqüência da hemorrhagia. Em conseqüência de contusões fortes sobre o thorax, os grossos vasos nelle contidos, podem ser rotos, o que produz derramamentos contra os quaes a arte é inteiramente impotente. Estas graves lezões não nos forne- cem symptomas appreciaveis em razão da morte ser prompta, como no facto citado por Morgagni, em que a artéria aorta tendo sido rota o indi- víduo morreo immediatamente, e como também no observado por M. Lo- vadina, em que ambas as veias cavas forão rotas, e tiverão o mesmo resul- tado. Não temos meios de reconhecer uma contusão com ou sem ruptura do canal lhoracico, mas poderemos suspeitar que o oesophago foi contundido quando apparecer diíficuldade de deglutição, e dôr n'um ponto fixo, todas as vezes que os alimentos ou as bebidas descerem para o estômago. Trataremos agora da contusão do coração; c procurando resolver o im- portante problema que nos foi proposto, se a contusão profunda deste im- portante órgão é mortal, diremos tudo quanto pudemos colher a simi- lhante respeito. Se atlendermos que o coração é ura órgão essencial para a vida, e que elle se acha ligado aos outros órgãos de uma maneira muito intima, por ser a sede do systema circulatório, por certo deveremos esperar phenomenos mais ou menos graves, quando por uma causa qualquer essa funeção tão importante, deixar de obedecer ás leis da physiologia. A posição que oecupa o coração na cavidade do peito, posição que lhe — 13 — facilita muita mobilidade, faz com que os corpos contundentes nem sempre possão obrar sobre elle, e tornem assim sua contusão muito rara. Porém dada a hypothese de poderem obrar, e sendo ligeira a contusão, uma syncope de pouca duração é a conseqüência; entretanto não será tam- bém raro ficar o indivíduo muito sujeito aos accideutes da cardite. Em gráo forte, a contusão pôde não peneirar a textura do coração, porém a vio- lenta commoção que experimenta o órgão, suspende suas contracções, en- tão uma syncope prolongada, as mais das vezes mortal, se manifesta. O mais elevado gráo em que o coração pôde ser contundido, é aquelle que pôde produzir a ruptura do seu tecido. A morte será então instantâ- nea por syncope, que se explica pela ausência das pulsações do coração, em conseqüência da compressão rápida que produz o sangue derramado no pericardio. Esta ruptura pôde ter lugar, ora nos ventriculos, ora nas auri- culas, ora nos tecidos, ou nos cordões carnosos. Porém as mais freqüentes são as dos ventriculos e auriculas. Vejamos por que mecanismo se operão estas rupturas: o ventriculo e a auricula direita rompe-se do mesmo modo que se rompe um sacco distendido por um corpo pouco elástico, ou sem elas- ticidade, encontrando um agente exterior que aclúa sobre elle fortemente. As partes as mais fracas do coração, são justamente as que apontamos, por isso não nos admira que cilas sejão quasi sempre a sede das rupturas. A das auriculas dependem da pressão exercida sobre a aorta, ou sobre a artéria pulmonar por um corpo pezado, como por exemplo, as rodas de um carro, o couce de um cavallo, etc, etc, pressão que obsta a passagem do sangue para os vasos: augmentão-se as contracções para por este meio ven- cerem a resistência da compressão ao fluxo do liquido. É pois dependente da lueta entre as contracções e a compressão que apparece a ruptura das paredes do coração. Este modo de explicar as rupturas tem o apoio das experiências feitas por Chaussier em animaes vivos. Vamos agora corroborar mais as nossas asserções com os seguintes factos. Mr. Worbe foi chamado em 23 de outubro de 1813 para verificar a morte de um moço de 13 para 14 annos bastante maltratado pela roda de um carro. Pela autópsia encontrou as costellas, cartilagens, e o sterno no estado natural, derramamento abundante no pericardio, ruptura do ventriculo esquerdo do coração, desde a base até o ápice ao longo do bordo que se reúne ao ventriculo correspondente. Morgagni menciona o caso de uma mulher que tendo-lhe passado um carro sobre o peito, morreo immediata- mente ; a autópsia mostrou o pericardio intacto e o coração roto perto do ápice. Bouillaud diz ter observado a ruptura da auricula direita, em um - 14 - homem que cahira da janella de um sobrado. Verbrugges cita dous factos de ruptura da auricula direita ; no primeiro, a ruptura teve lugar em conseqüência de um couce de cavallo sobre o sterno ; no segundo, a rup- tura foi produzida por uma queda de cavallo em que o cavalleiro foi arras- tado pelo mesmo ; não se encontrou lezão alguma exteriormente em am- bos estes indivíduos. Mr. Bergeon apresenta a observação de uma mulher chamada Maria Magdalena Deluzenne, com 78 annos de idade, que cahira da janella de um terceiro andar. Feita a autópsia achou o pericardio bas- tante distendido, contendo grande quantidade de sangue : fracturadas as costellas do Fido direito ; ruptura de uma das artérias iuter-costaes, resul- tado este da esquirolade uma costella; a aorta separada do coração no lugar de sua inserção com esle órgão : esta ruptura era na parte posterior da aorta ; ao derredor havia uma ecchymose do tamanho da moeda de um soldo: aberto o vaso, em sua parte anterior, via-se a ruptura muito re- gular, transversal, exteudendo-se ao terço de sua circumfcrencia, uma das válvulas sigmoides separada em duas porções. A morte desta mulher foi prompta. Bertin diz também haver observado a ruptura da auricula direita cm um homem que cahira de uma janella. Berard cita outro facto, porém de ruptura da auricula esquerda. Depois de havermos apresentado alguns factos em que a morte instan- tânea foi sempre o termo da contusão, c além disto, apoiados na valiosa opinião do barão Dupuytren que diz: —quando a contusão produzir a ruptu- ra do coração a morte seráiustantanea(l) ;—suppômos que nos julgamos habilitados para poder responder afíirmativãmente ao importante proble- ma que nos foi proposto, será a contusão profunda do coração mortal? Ver- dade é que um facto apparece como refere Rostan, de ruptura pouca ex- tensa das paredes do coração que não foi seguida da morte, porém é um único facto que se apresenta, e a pluralidade dclles é cm abono da mor- talidade instantânea, quando ha considerável derramamento no pericardio, resultando esse derramamento de uma ruptura do coração, da origem da aorta, ou da artéria pulmonar. (1) Leçons orales. Tom. VI. pag. 310. BREVES CONSIDERAÇÕES A? cerca do mercúrio e de suas principaes preparações empregadas em medicina, de sua acção no tratamen- to das moléstias, em que sua applicação é reclamada* 0 mercúrio é um metal cujo conhecimento data da mais remota anti- güidade, c parece ter recebido este nome do planeta com o qual havia sido comparado pelos Persas, por causa das idéas que tinhão sobre sua approxi- mação com o ouro, approximação análoga áquella deste astro, e do sol; ou então recebco seo nome de Mercúrio mensageiro dos deoses, por causa de sua extrema volatilidade. De todos os metaes antigamente conhecidos foi sobre elle que os alchi- mistas gastarão mais sua paciência e assiduidade. O seo brilho e a sua liquidez na temperatura ordinária fizerão com que elles lhe dessem o no- me de azougue, pela crença que tinhão de que este metal era prata der- retida c com o fim ditado pela ambição, elles o submettêrão a numero- sas e vãs experiências para o obterem solido, c trasformal-o em prata. A busca deste pretendido segredo formava uma das bazes desta grande obra, ao complemento da qual elles gastarão inutilmente todas os precio- sos instantes de sua vida. Se os trabalhos que emprendêrão com o fim de converter todos os metaes em prata ou ouro, não lhes derão os resul- tados que esperavão, não poucos productos obtiverão com suas experiên- cias, os quaes ainda hoje serião ignorados, se porventura não enriqueces- sem a matéria medica. O mercúrio existe na natureza debaixo de quatro estados; 1.°, no estado nativo ou amalgamado com a prata cm todas as minas de mercúrio, prin- cipalmente nas de sulfureto; 2.% combinado com o enxofre ; 3.°, com o chloro; 4.°, com o selenio. — 16 — O mercúrio é um metal que se distingue dos outros pela sua extre- ma fluidez na temperatura ordinária. É muito brilhante, de um branco argentino um pouco azulado, sua densidade c de 13,568 ; sendo expos- to a um frio de quarenta gráos abaixo de zero se solidifica, e é susceptível de o obter-se cristalisado regularmente em octaedros no momento de sua congclação. Assim reduzido ao estado solido, sua densidade é segundo Schulze de 14,391, e então torna-se malleavel á acção do martello, mas pouco tempo depois derrete-se, absorvendo promptamenle calorico aos cor- pos que ocercão; í^esteestado,tocando-se com o dedo, experimenta-se uma sensação viva e repentina no ponto em contado, sensação análoga á pro- duzida pela queimadura, e a parte torna-se esbranquiçada e perde por al- gum tempo a sensibilidade. O oxigeneo e o ar secco ou Imundo não tem acção sobre elle na tempera- tura ordinária, mas na temperatura visinha de seo ponto de ebullição, elles o oxidão pouco a pouco, e"o convertem em deutoxido ou bi-oxido. A água não tem acção sobre elle nem a frio e nem a quente. O chloro gazoso combina-se com elle cm duas proporções, e dá lugar á formação do proto-chlorureto, ou calomelanos, e do bi-chlorureto, ou sublimado corrosivo. O iodo pôde também por sua combinação formar trez compostos, que são o proto, sesqui e bi-iodureto. O enxofre dá lugar também a dous com- postos, o proto e deuto-sulfureto. Combinado com o selenio fôrma o sele- niureto. Com o cyanogneo temos o cyanurelo. Este metal pôde ainda combinar-se com outros e formar amálgamas. É pela distillação que se separa o mercúrio dos metaes com quem pô- de estar amalgamado e póde-se obtel-opuro. Consegue-se isto, pondo o me- tal n'uma retorta de barro lutada, que vai depois ao forno de reverbero, adaptando-se ao collo da retorta uma alonga de ferro, tapada por um pa- no de liuho que em parte mergulha n'agua. Desta maneira se opera a condensação dos vapores mercuriaes, sem cor- rer o risco de se espalhar nos laboratórios. As principaes preparações empregadas em medicina são as seguintes. O mercúrio metallico que se applica algumas vezes internamente debai- xo de diversas fôrmas, externamente entra na composição de muitas pre- parações taes como a pomada mercurial, etc, etc. O proto-chlorureto de mercúrio que se distingue ainda pelos nomes de mercúrio doce, calomelanos, panacea mercurial, precipitado branco, etc, etc, é solido, branco, em contacto com a luz ennegrece, sem cheiro, — 17 — sem gosto, insoluvel n'agua e no álcool, volátil, cristalisavel em agulhas prismáticas e entre-cruzadas, o pezo especifico é de 7,17. Empregado quasi sempre internamente como purgativo e vermifugo, etc, etc.; exter- namente algumas vezes como anti-syphilitico. O deuto-chlorurcto ou sublimado corrosivo, é branco, de sabor acre e metallico, mais volátil do que o proto-chlorureto, solúvel n'agua, no álcool e no ether, dissolve-se no ácido sulfurico c nitrico, sem decompôr-se. Administrado na doze de dois a cinco grãos, é um veneno violento. É empregado internamente em pequenas dozes, de um décimo a um quarto de grão, para combater as moléstias syphiliticas, seo emprego exige sempre muita cautela; entra na composição de muitas preparações, externamente também é applicado debaixo de diversas fôrmas. O proto-iodureto de mercúrio é pulverulento, de cor amarella esverdiuha- da, sem cheiro, sabor metallico, insoluvel n'agua, no álcool, volátil, ex- posto ao calorico envermelhece, e ao resfriamento torna-se amarello. O deuto-iodureto é de uma bella cor vermelha, amarella sendo aquecida, volatilisa-se e condensa-se dando bellos crislaes amarcllos, que pelo attrito ou resfriamento tornão-se vermelhos. Estes dois compostos, o proto, c o deuto-iodureto, sobre-sahem pelas suas propriedades enérgicas. É a M. Biett que se deve sua introducção na matéria medica. É principalmente nas affecções escrofulosas complicadas de syphilis que tem lugar sua ap- plicação, que pela muita energia, principalmente a do deuto-iodureto exige a maior circumspecção c cautela. Applica-se externa e internamente, de- baixo de diversas fôrmas. O oxido rubro de mercúrio ou pós de Joanes, é em pedaços formados de pequenas escamas brilhantes, de côr vermelha, ou amarella alaranjada, de sabor cáustico e metallico, sem cheiro. Applica-se externamente para com- bater as ulceras syphiliticas, e escrofulosas, etc, etc. O nitrato ácido de mercúrio é um liquido transparente, sem côr, e que se torna verde pela acção da luz, sem cheiro, de sabor metallico e cáustico. O nitrato ácido de mercúrio, que obra de uma maneira particular sobre os tecidos com quem está em contacto, só é empregado externamente no trata- mento das ulceras syphiliticas e cancerosas, etc. EFFEITOS PHYSIOLOGICOS DOS MERCURIAES. Estas preparações, devendo ao metal que as constitue suas principaes propriedades, apresentão uma grande analogia, debaixo dos diversos pontos 3 — 18 — de vista médicos; mas, comquanto ellasse approximem quasi todas por ef- feitos geracs que são communs, entretanto estão longe de gozar todas de propriedades símilhantes. Em geral são medicamentos dotados de uma actividade considerável, algumas vezes mesmo venenos perigosos. Os eíTeilos primitivos ou immediatos dos mercuriaesvarião, segundo os diversos estados deste metal, as vias de sua introducção, e muitas outras circumstancias. O mercúrio metallico administrado internamente tem pouca acção sobre a economia, e isto porque pouco se demora, sendo logo expcllido. Porém demorando-se nos órgãos e nos tecidos, e podendo peneirar por intermé- dio da absorpção, cousa muito fácil, em conseqüência de sua volatilidade extrema, accidenles iguaes, aos que se observão nos indivíduos que fazem uso das preparações mercuriacs, podem apparecer. O facto acontecido cm 1810, a bordo do navio inglez Triumpho, nos offe- rece um exemplo notável a similhante respeito : este navio, estando carre- gado com 130 tonneis de mercúrio, teve em três semanas mais de 200 pes- soas aíTectadas de plyalismo, ulcerações na bocca, dyarrheas, paralysias parciacs; uma parte do mesmo, tendo-se entornado dentro do navio, im- pregnou o pão e outros alimentos, convertendo-os em um pó denegrido, os animaes forão também altacados. * Além disto sabemos que os indiví- duos que frequentão as sallas dos hospitaes dos syphiliticos, que são tratados pelos mercuriaes, experimentão também seos effeitos. Colson refere que elle c mais cinco discípulos, que se empregavão no serviço dos venereos, forão afiectados de inchação das gengivas, comquanto nenhum houvesse tocado cm preparações mercuriaes, isto pelo simples facto de se terem de- morado nas sallas. Estes eíTeitos são muito sensíveis nos indivíduos que trabalhão nas minas deste melai, nas fabricas de espelhos, de barometros, de thermometros, e nos douradores que eslão diariamente com o mercúrio, n'uma temperatura mais ou menos elevada, etc, etc. A maior parte ex- perimentão vertigens, tremor dos membros, ptyalismo, convulções, symp- tomas de entorpecimento, paralysias, insensibilidade, surdez, amaurosc, etc, etc. A physionomia torna-se cadaverica, morrem prematuramente^ maxime os que trabalhão nas minas, raras vezes chegão a idade de 30 annos.' Muito dividido ou combinado a acção immediata varia segundo a espécie de preparação que se emprega, o gráo desolubilidade, a doze em que se dá, a superfície sobre que é applicado, a maior ou menor duração de seo usoi as circumstancias individuaes, as estações, os climas, etc, etc. * Bibl. brit. XLVII 393, Arcli. gener. de Med. IV 282. — 19 — Applicados no exterior, sobretudo nas superfícies ulceradas, podem as estimular, augmentar a suppuração, reprimir a turgcucia do tecido ceU lular, obrar como cáusticos; segundo sua natureza, algumas vezes são ab- sorvidos, e então todos os symplomas de um envenenamente lento ou agudo se desenvolvem. Sendo dados internamente cm dozes pequenas c variáveis, muitas vezes estas preparações limitão-se a excitar ligeiramente o appetite, ou então a manifestar a acção por phenomenos em relação com os eífeitos therapeuti- cos que queremos obter. Em dozes um pouco mais elevadas sobre-carre- gão o estômago, e todos os symptomas do primeiro gráo de uma irritação gastro-intestinal podem-se desenvolver ; symptomas que nem sempre são fáceis de evital-os. Além disto sobrevoem algumas vezes cephalalgias, e em muitas outras algum ptyalismo. Em dozes fortes produzem subitamente todos os accidentes de envene- namentos agudos. EFFEITOS SECUNDÁRIOS OU MEDIATOS. Absorvidos ou levados á torrente circulatória, os mercuriaes em doze moderada, determinão na economia as seguintes modificações : Primeira. A dissolução do sangue. Pela influencia das preparações mer- curiaes, os indivíduos começão a tornar-se pallidos, o sangue que no prin- cipio tinha a côr e a consistência normal, perde um pouco de sua côr, e sobretudo a densidade, é diííluente, e reduz-se a um coagulo molle. Se a medicação continua, esta dissolução torna-se muito evidente, as palpe- bras seinfiltrão, a face incha um pouco, o mesmo suecede ás pernas, e a anasarca é a conseqüência. Então apparccem todos os symptomas que ac- companhão ordinariamente a liquefação do sangue, as palpitações do cora- ção e diversas perturbações funecionaes, dependendo tudo do estado parti- cular deste liquido. Segunda. Hemorrhagias. A mudança experimentada pelo sangue não é somente evidente quanto á sua inspecção physica, cila é ainda mais mani- festa, por certos phenomenos mórbidos, o mais saliente dos quaes é a ten- dência para as hemorrhagias passivas. A dissolução deste fluido reduz as mulheres ao estado de chlorose, e dá lugar a todos os accidentes que for- mão o cortejo desta moléstia, taes são nas donzcllas: a amenorrhea, nas adultas, ou nas que chegão á idade critica, metrorrhagias e amenorrheas, isto nem sempre porém suecede. — 20 — Terceira. A salivação. Depois do uso mais ou menos prolongado do mer- cúrio, e sobretudo de certas preparações, as gengivas inchão, tornão-se um pouco dolorosas, e cobrem-se d'uma pequena pellicula branca extre- mamente delgada, ao mesmo tempo que os indivíduos experimentão um gosto metallico muito desagradável, e o hálito é acompanhado de máo chei- ro, a lingua cobre-se de uma camada mucosa espessa. A membrana mucosa que forra o pharynge e o véo do paladar apresenta-se mais vermelha e um pouco dolorosa. A inchação começa pelas gengivas dos incisivos inferiores e no intcrvallo dos dentes, existindo um dente cariado c pela gengiva des- te que a inchação se manifesta. Das gengivas dos incisivos inferiores a incha- ção passa para os superiores, depois esta inchação estende-se a toda muco- sa boccal. A inflammação propaga-se então ás glândulas salivares que in- chão, c segregão mais abundantemente uma saliva viscosa e fétida. Este accideute pôde ser seguido de conseqüências graves, taes como, ulcerações dolorosas das gengivas, inchação considerável, e algumas vezes monstruosa da lingua, da garganta, da face, da cabeça, o fluxo excessivo de uma sali- va espessa (cujo cheiro assim como o hálito tem sido comparado ao do gaz hydrogenco phosphoretado); queda dos dentes, algumas vezes carie, necrose, a queda dos ossos palatinos e maxillares, perda da voz, paralysia, marasmo, e emfim a morte depois de grandes solfrimentos. Quarto. Desarranjo das funeções digestivas. Desde que as gengivas co- moção a inchar o fastio se manifesta, ao mesmo tempo que as evacuações tornão-se mais fáceis, ordinariamente sobreveem dyarrheas. Esta é quasi sempre moderada, pôde entretanto ser algumas vezes muito viva e acom- panhada de eólicas e tenesmos. As matérias fecaes tomão, segundo alguns, uma côr esverdinhada si- milhante á das ervas cozidas, esta côr apparece em conseqüência da inges- tão dos calomelanos. Quinto. Desarranjo da circulação e da calorificação. A infecção mercurial é quasi sempre acompanhada de um máo estar notável, de uma acceleração do pulso facilmente appreciavel, ao mesmo tempo que a pelle torna-se um pouco mais quente. Estes phenomenos apparecem com particularidade existindo dyarrhea,e inchação da membrana mucosa que forra a bocca e o pharynge ; elles tem isto de particular, que em lugar de se acompanhar da exaltação das forças, são pelo contrario assignalados por diminuição do pulso, e uma debilidade extraordinária. Moleslias cutâneas *. o uso dos mercuriaes em geral, e em particular o un- guento napolitano cm fricções quando seo uso é levado até o ponto da sa- — 21 — livação, occasiona muitas vezes suores excessivos, em conseqüência dos quaes a pelle cobre-se de pequenas vesiculas acuminadas, verdadeiro eczma mercurial. Outras vezes é uma vermelhidão similhante á da escarlatina. Estas lezões, notadas pela primeira vez por Pearson em 1783, e particu- larmente estudadas por Alley, se estendem algumas vezes dos artelhos que elles attacão, a todo o corpo, c podem ser acompanhadas de agitação, de angina e terminar pela morte. EFFEITOS DO MERCÚRIO NAS MOLÉSTIAS. As preparações mercuriaes são a baze do tratamento das moléstias ve- nereas, sua utilidade na.syphilis é reconhecida por quasi todos os práticos, e são os medicamentos mais preconisados para estas moléstias, quer an- tigas, quer recentes. O uso dos mercuriaes como auti-syphiliticos é bem an- tigo. Suppõe-se BerengariusdeCarpi ter sido o primeiro que os empregara para curar a syphilis que destruio os exércitos de Carlos VIII, a qual se ma- nifestava no systema cuíaneo. Os Árabes já as tinhão applicado contra certas aífecções cutaucas rebeldes taes como a lepra, e diversas espécies de tinhas, aplica poloneza, etc. etc. Mais tarde forão preconisados con- tra as rugosidades do mamelon nas amas, contra os endurecimentos mór- bidos, os engorgitamentos arthriticos, as hydropesias das cavidades ósseas (hydrocephalo hydrorachis); as moléstias nervosas, a hydrophobia, os teta- nos, a epilpesia, a amaurose, a paralysia, a apoplexia, as nevralgias, as fe- bres intermittentes continuas, nervosas, etc ; a escarlatina, como meio curativo eprophylactico, para fazer abortar as pústulas da bexiga. Na maior parte das moléstias que acabamos de enumerar, o mercúrio era applicado sob a fôrma de fricções, de pomada só, ou associado ao extracto de bella- dona, ao ópio, ao laudano de Sydenham, etc. etc O mercúrio tem sido também vantajoso contra o typho, a febre amarella e a peste. Grande numero de inflammações podem ser combatidas com successo pelo mercúrio associado á banha, e applicado em fricções sobre a pelle co- berta com seo epiderme ou privada do mesmo. Tem-se visto hepatites, enterites, menengites, metrites, phlebites, cou- juntivite palpebral, periostoses, o rheumatismo articular, peritonites, e sobretudo peritonites puerperaes, no estado agudo, ceder ao tratamento mercurial, precedendo-lhe uma ou duas sangrias, conforme a indicação. De não menor vantagem é também nas encephalites, no croup, na coque- luche, na tosse convulsiva, nas peripneumonias e pleurisias agudas, an- — 22 — gio-leucite aguda, ou endurecimento do tecido cellular dos recem-uasci- dos, nophlegmon, anthrax, panaricio, etc. etc etc Emfim nos engorgita- mentos chronicos e não inflammatorios das vísceras, os tumores brancos, grande numero de aflecções herpeticas, escrofulosas, e verminosas cedem também aos mercuriaes. Taes são as circumstancias pathologicas numerosas c variadas, nas quaes se pôde fazer uso das preparações mercuriaes principalmente dos calomelanos e do unguento napolitano. APPRECIAÇÃO DO MODO POR QUE OBRÂO. As opiniões dos médicos sobre a maneira porque, os mercuriaes obrão na economia, teem sido muitas e variadas. Os médicos mecânicos fazião de- pender a acção de seo pezo especifico c de sua mobilidade, próprias se- gundo elles, a precipitar, dividir, resolver os humores, e a desobstruir os vasos. Os humoristas attribuião a uma virtude dissolvente, fuudente e evacuante, provada, dizião, pelo máo cheiro da excressão salivar e a alte- ração dos humores. Os chimicos, ao oxigeneo que suppunhão sempre existir unido ao mer- cúrio. Astruc acreditava-o dotado da propriedade de neutralisar o virus venereo que suppunha acido. L. C. Althof á affinidadc pretendida deste virus para o mercúrio. Os vitalistas acreditarão que obrava como excitante geral ou parcial, c que em conseqüência da magreza, e da acção resolvente de que é dotado, obrava sobre os vasos absorventes com especialidade. Os partidários da doutrina physiologica, julgarão-no dotado de uma acção revulsiva, e que esta era devida a irritação produzida sobre o canal intes- tinal. Os médicos italianos, os rasoristas em particular, o considerão como um contra-stimulante, um anti-phlogistico, um anti-plaslico por excellencia. Ultimamente G. A. Giacomini, no seo tratado experimental de matéria medica e therapeutica, colloca-o no numero dos hyposlhenisantes lymphatico- glandulares. Segundo estes médicos, um dos primeiros efíeitos do mercúrio, é não só oppor-se á coagulação do sangue, como também augmentar sua fluidez, facilitar a circulação, e determinar um estado anêmico que predis- põe os indivíduos para as hemorrhagias passivas e amenorrheas. Outros o considerão gosando de uma propriedade especifica, indeterminada e inex- plicável. Em resumo pois, temos apresentado as opiniões até hoje admittidas para — 23 — explicar o modo de obrar do mercúrio na economia. Pela exposição que fizemos, facilmente se conhece a incerteza que ainda reina na sciencia á res- peito ; nenhuma opinião pôde ainda approximar-se da verdade: apenas seos autores as publicão, surgem as objeções, c depois de poríiada lide vão aug- mentaro numero das litigiosas. O modo por que elles obrão ainda hoje é mo- tivo para longos debates; é bem provável que M. Giacomini, com a sua nova theoria, acabe por mudar a face da questão e trazel-a mesmo a seos verda- deiros eixos. Com isto não queremos dizer que estamos propensos a abraçal-a, não; ella além de muito recente não está mui admittida e nem recebeo ainda o beneplácito da experiência. É mais consentaneo pois, com a razão e com a verdade, confessar que no estado actual da sciencia, nada podemos dizer de positivo a respeito de tão intrincado ponto da therapeutica. Temos de tratar ainda das indicações e contra-indicações, dos adjuvantes e correctivos, que em algumas circumstancias podemos ajuntar para tornar os mercuriaes mais activos, seguros e menos perigosos; emfim temos tam- bém de tratar sob que fôrmas são elles empregados e suas dozes. Os mercuriaes são contra-indicados e administrados com muita reserva nos indivíduos fracos, nervosos, predispostos para as hemorrhagias, nos que forem dotados de muita susceptibilidade de estômago, ou que tiverem este órgão já irritado bastante, nos que tiverem constituição cachetica, nas mulheres pejadas ou amas, nos recém-nascidos, nos velhos, durante as es- tações frias e humidas, etc. etc. etc Os agentes pharmaceuticos recommendados como adjuvantes e correti- vos são o ópio, a belladona, o meimendro e a camphora, etc etc. etc. Outros produetos chimicos teem sido ainda citados como bons e úteis ad- juvantes ou correctivos. Onitro, segundo Burdach, augmenta a propriedade purgativa dos calomelanos. Poterius encara o enxofre sublimado como um excellente prophylatico da salivação mercurial. Hanhemman julga dotado da mesma propriedade o sulfureto de cálcio e de maguezio. Cullerier as partilhas de enxofre, outros, as águas mineraes hydro-sulfu- retadas. Lister aconselha o guaiaco. Plenk a associação da gomma arábica ao mercúrio. As fôrmas pharmaceuticas que se prescrevem aos mercuriaes são extrema- mente variáveis, sabemos que o habito é um poderoso correctivo dos mer- curiaes, elle neutralisa-lhe a acção, e as preparações as mais perigosas pô- de tornal-as innocentes. Desbois de Rochefort, refere, que era moda na Rús- sia, pôr a dissolução de sublimado na primeira colher de sopa, - 24 - Lemeri falia de um alchimista que comia calomelanos como pão, e que vira engulir quatro onças de uma só vez, para purgar-se e purificar o san- gue. * O sexo, o temperamento, o gosto dos doentes, devem ter-se em mui- ta consideração, e o mesmo ler-se-ha com os lugares, estações e cli- mas, etc, etc Recorremos aos banhos, fomentações, unguentos, emplaslros, fricções, furaigações, quando o estômago fôr muito susceptível ou já achar-se irri- tado ; aos bolos, pílulas, xaropes, soluções aquosas, ou alcoólicas, nos ca- sos contrários. O que acabamos de estabelecer de uma maneira geral, respeito á varia- bilidade das fôrmas pharmaceuticas, debaixo das quaes se applicão os mer- curiaes, deve-se também entender com as dozes destes mesmos medica- mentos. Depois das observações de M. C. Otto sobre o modo de obrar destes medicamentos, só serão perseriptos em dozes pequenas e repetidas, quan- do se quizer reprimir ou corrigir a exaltação, ou perversão da sensibilidade; em dozes mais fortes nas moléstias que dependem das forças de reproducção; cm dozes ainda mais elevadas e repetidas, havendo plasticidade dos hu- mores e tendência para os engorgitamentos; e em dozes ainda mais fortes, e repetidas, querendo-se debilitar promptamenle a economia. Eis as suecintas considerações que tínhamos a fazer sobre os três pontos que nos forão dados pela sorte. Aproveitamos a opportunidade para dar um publico testemunho do nosso reconhecimento ao Exm. Sr. Conselheiro Dr. Joaquim Vicente Torres Homem, pela maneira obsequiosa com que se prestou a aceitar a presidência de nossa these, cujo mérito só consiste em ser apadrinhada pelo seo nome. * Mem. d'el Acad. roy. des se. année (1699.) HIPP0CRAT1S APHORISMI. =t»at«c I. Vita brevis, ars longa, occasio proeceps, experiência fallax, judicium difficile. Oportet autem non modo se ipsum exhibere quae oportet facien- tem, sed etiam aegrum, et pra3sentes, et externa. (Sect 1.% aph. j.°) II. In morbis acutis, extremarum partium frigus, malum. (Sect. 7.% aph. l.°) III. Vulneri convulsio supuveniens, lelhale. (Sect. 5.% aph, 2.°) IV. Morburum aculorum non omninò tutae sunt praedictiones, neque mor- tis, neque sanitatis. (Sect. 2.% aph. 19.°) V. Ad extremos morbos, extrema remedia exquisitè optima. (Sect. l.a, aph. 6.°J VI. Impura corpora quo magis nutriveris,eò magis laedes, (Sect. 2.% aph. 10.°) Esta Thesc está conforme os estatutos. Rio de Janeiro, 16 de novembro de 1850. Dr. Joaquim Vicente Torres Homem.